Carne bovina na Argentina: país produz 3 milhões de toneladas por ano (Freepik/Divulgação)
Repórter de agro e macroeconomia
Publicado em 22 de outubro de 2025 às 16h21.
Última atualização em 22 de outubro de 2025 às 16h54.
Embora os Estados Unidos tenham anunciado a intenção de aumentar as compras de carne da Argentina para 2 milhões de toneladas, o país sul-americano não dispõe de carne bovina suficiente para atender a essa demanda, afirmaram analistas ouvidos pela EXAME.
Segundo eles, a produção anual de carne na Argentina é atualmente de 3 milhões de toneladas, mas os altos custos de produção e o consumo interno per capita de carne, um dos maiores do mundo, são barreiras para que o país aumente em dez vezes a quantidade exportada para os EUA.
Como comparação, o Brasil produz 10,4 milhões de toneladas de carne bovina anualmente.
"A Argentina exporta entre 700 e 800 mil toneladas de carne por ano. Ela teria de aumentar significativamente sua produção. Para os EUA, a Argentina envia cerca de 25 mil toneladas. Não há como passar de 25 mil para 2 milhões", afirma a Datagro, consultoria agrícola.
Na terça-feira, 21, Brooke Rollins, secretária do Departamento de Agricultura dos EUA (USDA), disse que os Estados Unidos comprariam 2 milhões de toneladas de carne bovina da Argentina, em uma tentativa de reduzir os preços da proteína no país.
De janeiro a agosto deste ano, a Argentina exportou 25 mil toneladas de carne bovina para os EUA. Em 2024, o país vizinho desembarcou 23 mil toneladas.
Desde domingo, a administração de Donald Trump tem sinalizado que um acordo com a Argentina está prestes a ser anunciado. Trump acredita que, com o aumento das importações de carne, os preços possam cair por lá.
"Isso é uma medida para acalmar o consumidor no mercado interno, que está sentindo os altos preços da proteína", diz a Datagro.
Cerca de 70% da carne exportada pela Argentina vai para a China. Caso haja um aumento nas exportações para os EUA, o país precisaria direcionar toda a sua produção exclusivamente aos americanos.
Há também a questão do consumo interno de carne bovina, que vem crescendo desde novembro de 2024 na Argentina.
Naquele mês, o indicador apontava para 46,9 quilos de carne por pessoa. Em julho deste ano, o índice alcançou 50 quilos por pessoa, número não observado desde 2022, segundo dados do Ministério da Agricultura e Pecuária da Argentina (Magyp), compilados pela Datagro.
O aumento dos preços da carne bovina nos EUA é resultado de fatores como o clima e a redução do rebanho e a tarifa de 50% imposta por Trump sobre produtos brasileiros, principal fornecedor de carne para os EUA.
Desde 2019, o total de unidades de gado de corte nos EUA caiu para 27,9 milhões, redução de 13% — o nível mais baixo desde 1952, segundo o Departamento de Agricultura (USDA).
A menor oferta de gado, aliada à seca que afetou o oeste do país, elevou os custos para os pecuaristas, que precisaram adquirir mais ração e reduziram seus efetivos. Em maio, os EUA também suspenderam as importações de gado mexicano para evitar a disseminação da praga New World Screwworm (NWS), conhecida como "bicheira do Novo Mundo".
Historicamente, o Brasil era o principal fornecedor de carne bovina para os EUA. Mas a sobretaxa de 50% sobre produtos brasileiros, incluindo carne bovina, fez com que os EUA caíssem para o quarto lugar como importador da carne brasileira em setembro, com 9,9 mil toneladas.
No acumulado de janeiro a setembro, porém, os EUA seguem como o segundo principal destino das exportações brasileiras, com 219 mil toneladas — 65% acima do registrado no mesmo período de 2024.
Na avaliação da Datagro, caso o aumento das exportações de carne da Argentina para os EUA se concretize, o Brasil pode se beneficiar, pois, sem a concorrência da Argentina fornecendo carne para a China, o Brasil teria o potencial de aumentar ainda mais seus embarques para o país asiático. Até setembro, o Brasil enviou 1,15 milhão de toneladas de carne para a China.
Fernando Iglesias, analista da Safras & Mercado, diz que o Brasil é o único país com capacidade para vender mais carne para os EUA, tanto por causa de sua produção, de 10,4 milhões de toneladas, quanto pelos preços mais competitivos.
"Não há produtor rural mais competitivo do que o Brasil. Nosso custo de produção é menor e os preços são relativamente baixos", afirma Iglesias.
O preço do arroba do boi no Brasil está, em média, em US$ 55, enquanto na Argentina e no Uruguai varia entre US$ 70 e US$ 80. Na União Europeia, o valor chega a US$ 130.
Para Iglesias, mesmo que Trump não aumente as importações de carne bovina brasileira, o Brasil está bem preparado para atender outros mercados.
"Esperávamos que o tarifaço causasse impacto, mas o Brasil conseguiu navegar e diversificar seus mercados. Para os Estados Unidos, seria muito mais interessante importar carne do Brasil do que da Argentina, pois seria menos custoso e mais barato", afirma.
Desde segunda-feira, 20, pecuaristas americanos têm criticado Trump, após o presidente sinalizar que compraria mais carne da Argentina para reduzir os preços da proteína nos EUA.
Os produtores argumentam que Trump deveria anunciar medidas para apoiar o setor pecuário, que vem enfrentando altos custos desde a pandemia.
"Este plano só cria caos em um momento crítico do ano para os produtores de gado americanos, sem fazer nada para reduzir os preços nos supermercados”, disse Colin Woodall, CEO da National Cattleman's Beef Association (NCBA), entidade que representa os produtores de gado dos EUA desde 1898.
Na terça-feira, 21, Brooke Rollins, secretária de Agricultura dos EUA, afirmou que em breve será anunciado um pacote de apoio aos produtores de carne do país.
"Acho que em breve vocês ouvirão mais detalhes sobre como isso será", disse Rollins em entrevista à CNBC. "Temos um pacote bastante robusto saindo", acrescentou.
Segundo a secretária, o objetivo é incentivar ainda mais a produção de carne bovina nos EUA, visando a redução dos preços nos supermercados.
"É hora de trazer de volta a produção de carne bovina para os EUA", declarou Rollins.