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Análise: pressionado pela oposição, pelos governistas e pelo Centrão, Motta vive um dilema

Presidente da Câmara precisa conciliar os interesses de todos os grupos que o elegeram, em meio a uma crise política e internacional que afeta o país

Plenário da Câmara dos Deputados: Os dois dias de obstrução física à mesa diretora da Câmara, sem qualquer previsão legal no regimento interno da Casa, fragilizaram o poder de Motta no comando dos trabalhos parlamentares. (Marina Ramos/Câmara dos Deputados/Agência Câmara)

Plenário da Câmara dos Deputados: Os dois dias de obstrução física à mesa diretora da Câmara, sem qualquer previsão legal no regimento interno da Casa, fragilizaram o poder de Motta no comando dos trabalhos parlamentares. (Marina Ramos/Câmara dos Deputados/Agência Câmara)

Antonio Temóteo
Antonio Temóteo

Repórter especial de Macroeconomia

Publicado em 7 de agosto de 2025 às 11h43.

O tom ameno e conciliatório do discurso do presidente da Câmara dos Deputados, Hugo Motta (Republicanos-PB), na noite da última quarta-feira, 7, após ser submetido ao constrangimento de entrar no plenário da Casa sem a certeza de que sentaria na cadeira da Presidência para reabrir os trabalhos legislativos após o recesso, mostrou o tamanho do dilema com o que ele conviverá nas próximas semanas.

De um lado, a oposição bolsonarista que o apoiou faz uma pressão estridente para que ele paute os projetos que acabam com o foro privilegiado de parlamentares e o que concede anistia definida como ampla e irrestrita para os presos do 8 de janeiro e aos políticos envolvidos no processo que tramita no Supremo Tribunal Federal (STF).

Os dois dias de obstrução física à mesa diretora da Câmara, sem qualquer previsão legal no regimento interno da Casa, fragilizaram o poder de Motta no comando dos trabalhos parlamentares, afirmaram à EXAME técnicos do governo, da Câmara, além de parlamentares governistas e da oposição.

"O que aconteceu nesses últimos dois dias na Câmara seria inimaginável na gestão de Arthur Lira ou de Rodrigo Maia", resumiu um técnico governista.

Motta ameaçou suspender os parlamentares, marcou o horário das 20h30 para se sentar na cadeira da Presidência e reabrir os trabalhos, entrou no plenário depois das 22h e, ao chegar no local, recuou para evitar um constrangimento público. Após pressão dos aliados para retirar do local os últimos dois deputados insurgentes, conseguiu se sentar para presidir os trabalhos.

"A política é feita de gestos e tudo o que aconteceu ontem foi simbólico", resumiu um experiente parlamentar.

Após a obstrução, o que importa para Motta?

Após encerrar o discurso de reabertura dos trabalhos legislativos e a sessão cercado por parlamentares da oposição bolsonarista —, Motta não marcou nova sessão. Com o clima de tensão instalado na Câmara, não há previsão de retomada das votações na Casa.

Além da pressão bolsonarista, o presidente da Câmara foi alvo dos governistas, que cobravam dele uma atitude para reestabelecer o funcionamento da Casa. Parte dos governistas também apoiou a eleição de Motta.

O dilema de Motta fica ainda mais evidente diante do apoio explícito de partidos do centrão, como Progressistas e União Brasil, ao processo de obstrução, afirmaram técnicos do governo e do Legislativo. O presidente da Câmara é um expoente desse grupo e pode ver seu poder ruir caso não agrade os aliados mais próximos.

Nessa balança de poder, Motta iniciou seu mandato como presidente da Câmara sem o controle do orçamento secreto que garantiu governabilidade ao antecessor, Arthur Lira (PP-AL).

Agora, convive com pressões de bolsonaristas que querem anistiar o ex-presidente Jair Bolsonaro, dos governistas contrários a essa proposta e do centrão, que ora se aproxima do governo e ora flerta com a oposição.

Não há clareza se a oposição teria votos suficientes para aprovar as duas propostas, mas pautar os projetos em plenário seria uma sinalização de força bolsonarista e enfraquecimento do governo.

Além disso, a sombra do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, que ameaça sancionar Motta e o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União Brasil- AP), é outro ingrediente com potencial explosivo.

No fim das contas, a incerteza que fica é quando a Câmara voltará a votar as pautas de interesse do governo ou da oposição.

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) aposta na isenção de Imposto de Renda para quem ganha até R$ 5 mil para se reeleger em 2026 e na tributação de aplicações financeiras para aumentar a arrecadação e diminuir o rombo crescente nas contas públicas. A dúvida é quando haverá clima para retomar as votações.

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