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Brasil tem a oportunidade virar líder na produção de ônibus elétricos, diz CEO da Eletra

Segundo Milena Romano, as montadoras já tem capacidade de produzir mais de 9.000 unidades por ano, com projeção de aumentar esse número para 25.000 até 2028

Milena Romano: O custo inicial dos ônibus elétricos é mais alto, sim, mas isso tende a cair com o aumento da produção e da demanda (Eletra/Divulgação)

Milena Romano: O custo inicial dos ônibus elétricos é mais alto, sim, mas isso tende a cair com o aumento da produção e da demanda (Eletra/Divulgação)

André Martins
André Martins

Repórter de Brasil e Economia

Publicado em 6 de maio de 2025 às 06h01.

O Brasil ultrapassou neste início de 2025 a marca de 1.017 ônibus elétricos, segundo dados da plataforma E-Bus Radar. A visão das montadoras é otimista. Milena Romano, CEO da Eletra, avalia que o Brasil tem a oportunidade de se tornar líder na produção de ônibus elétricos na América Latina.

"Vejo como uma grande oportunidade essa questão da China e dos Estados Unidos. É uma grande chance para a indústria brasileira se posicionar ainda mais em relação à América Latina e aos Estados Unidos, no que diz respeito à venda de ônibus elétricos", diz Milena. 

A empresa, que também opera linhas no ABC Paulista, tem mais de 600 veículos elétricos em circulação no Brasil. Segundo a Romano, o setor já tem capacidade de produzir mais de 9.000 unidades por ano, com projeção de aumentar esse número para 25.000 até 2028.

"Temos uma cadeia produtiva quase completa no Brasil, com parceiros nacionais para baterias, motores e carrocerias", afirma.

Romano diz ainda que apesar do custo inicial mais alto, as próprias empresas que atuam no setor preferem os elétricos

"Os operadores, como os de São Paulo, já têm plena confiança no produto, e muitos não querem voltar para os ônibus a diesel", afirma.

Em uma reportagem da edição de abril, a EXAME detalhou o avanço dos veículos elétricos no país, que bateu recorde nos últimos anos. Desde 2020, o país quase quintuplicou o número deles em circulação, mas o processo é marcado por entraves, como a falta de energia nas garagens.

Leia abaixo mais trechos da conversa com Milena Romano

A Eletra tem uma dupla experiência, como montadora e operadora. Como você vê o mercado de ônibus elétricos no Brasil, especialmente no transporte público? Já estamos no ponto de maturação ou ainda existem desafios que precisam ser superados?

Estamos num momento decisivo. A indústria brasileira de ônibus elétricos está se consolidando como uma das mais importantes do país. Ela ganhou um espaço e uma visibilidade muito grande, e hoje concorre com grandes players internacionais, especialmente os europeus e chineses. Temos uma cadeia produtiva quase completa no Brasil, com parceiros nacionais para baterias, motores e carrocerias, como a Caio. De plataformas, temos parcerias com a Scania e a Mercedes. Hoje, a produção de nossos ônibus é 100% nacional, com apenas 7% de componentes importados para a fabricação das baterias. Então, o ônibus da Eletra é praticamente 100% brasileiro. Isso nos coloca como líderes no mercado nacional, com 85% dos ônibus elétricos em operação no Brasil sendo produzidos pela Eletra.

E sobre o papel das cidades e do governo, como você vê a mobilidade elétrica no Brasil, principalmente após as iniciativas de cidades como São Paulo, que proibiu a entrada de ônibus a diesel em 2017?

A proibição [da compra de ônibus a diesel] em São Paulo foi um marco para a transformação da mobilidade urbana no Brasil. Isso fez com que outros prefeitos e operadores de ônibus ficassem mais curiosos sobre os ônibus elétricos. Hoje, já temos mais de 15 cidades no Brasil com ônibus Eletra em operação. Em relação à segurança, manutenção e confiabilidade, já está bem consolidado. A nossa frota tem 98% de disponibilidade, o que é um número excelente, especialmente quando comparado à frota a diesel, que fica em torno de 92%, 93%. Os operadores, como os de São Paulo, já têm plena confiança no produto, e muitos não querem voltar para os ônibus a diesel, mesmo com o governo incentivando a compra de veículos novos.

E qual é o principal desafio que ainda enfrentamos, principalmente em relação à infraestrutura?

A grande dificuldade ainda é a infraestrutura de carregamento e a conexão com a rede elétrica. A indústria está pronta para produzir, com capacidade para mais de 9.000 ônibus [por ano], sendo 3.000 da Eletra, mas a infraestrutura de energia não está acompanhando esse ritmo. Em São Paulo, por exemplo, não conseguimos ter mais de 2.000 ônibus elétricos em operação ainda devido a esses desafios. Mas, em outras cidades, como Salvador, o planejamento da infraestrutura foi feito de forma eficiente, e as recargas estão funcionando muito bem desde o início.

E em relação à tecnologia de baterias, como a Eletra está lidando com o avanço das tecnologias de recarga e autonomia dos veículos?

Em termos de recarga, já temos um avanço considerável. Hoje, a média de recarga é de 3 horas por veículo durante a noite, mas já estamos desenvolvendo soluções para recargas rápidas durante o dia. A ideia é aproveitar momentos ociosos do veículo, como as pausas para almoço, para realizar pequenas recargas e aumentar a autonomia dos ônibus. Além disso, estamos trabalhando no carregamento em movimento, que será lançado em breve, com a Eletra oferecendo uma solução onde o ônibus será carregado enquanto anda, usando uma catenária, semelhante ao sistema dos trólebus, mas de forma mais moderna e eficiente. Esse sistema permitirá que o ônibus carregue enquanto percorre o trajeto, diminuindo a necessidade de infraestrutura em garagens.

Em relação aos custos, sabemos que o ônibus elétrico tem um custo mais alto, especialmente se comparado aos ônibus a diesel e ao Euro 6. Como você vê a questão do financiamento para que as prefeituras possam adquirir esses veículos?

O custo inicial dos ônibus elétricos é mais alto, sim, mas isso tende a cair com o aumento da produção e da demanda. Para viabilizar esse custo, é necessário apoio do governo, seja municipal ou federal, para viabilizar o financiamento. Um bom exemplo disso é a experiência de São Paulo, que subsidiou 75% do valor dos ônibus para os operadores. Esse apoio ajuda a reduzir o custo do financiamento, que hoje é muito alto, devido à inflação e aos juros elevados. Acredito que, com o tempo, o preço dos ônibus elétricos se tornará mais acessível e o retorno do investimento se dará pela economia em combustível e manutenção.

Como a Eletra tem atuado no pós-venda? Quais são os serviços oferecidos aos operadores após a compra dos ônibus?

A Eletra tem um pós-venda muito robusto, um dos maiores do mercado. Criamos uma equipe de mais de 20 colaboradores, especializados em pré e pós-venda. Oferecemos treinamento para as equipes operacionais, motoristas, mecânicos e eletricistas, antes mesmo dos ônibus chegarem às garagens. Além disso, temos uma equipe de acompanhamento que fica por 15 dias após a entrega do ônibus para garantir que tudo esteja funcionando perfeitamente. Usamos um sistema de telemetria para monitorar os veículos remotamente, identificando possíveis problemas, como falhas nas baterias ou no sistema de carregamento. Se necessário, nossa equipe técnica resolve o problema pessoalmente, e sempre que possível, fazemos isso de forma remota.

Você acredita que a indústria brasileira tem uma oportunidade de se posicionar mais fortemente no mercado internacional?

Vejo como uma grande oportunidade essa questão da China e dos Estados Unidos. Vejo isso como uma grande chance para a indústria brasileira se posicionar ainda mais em relação à América Latina e aos Estados Unidos, no que diz respeito à venda de ônibus elétricos. Então, acredito que é um momento em que precisamos fazer do limão uma limonada. Claro, essa briga é muito ruim e prejudicial, mas algumas oportunidades vão surgir disso, e a gente hoje está pronto para aproveitar.

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