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Escalada de tom de Tarcísio fortalece candidatura, mas pode afastar moderados, dizem analistas

Analistas políticos avaliam que críticas ao Supremo e a defesa da anistia são um cálculo político arriscado de Tarcísio

André Martins
André Martins

Repórter de Brasil e Economia

Publicado em 9 de setembro de 2025 às 09h39.

Última atualização em 9 de setembro de 2025 às 11h25.

A articulação do governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), pela aprovação do projeto de lei (PL) da Anistia em Brasília e suas críticas contundentes ao Supremo Tribunal Federal (STF) e ao ministro Alexandre de Moraes durante as manifestações da direita no 7 de setembro reforçam sua posição como um nome forte da direita para a disputa presidencial em 2026. Mas podem afastar o voto do eleitor moderado, avaliam analistas políticos ouvidos pela EXAME.

Para Silvio Calcione, mestre em ciência política pela UNB e diretor da consultoria Eurasia Group, Tarcísio demonstrou claramente sua intenção de ser candidato à presidência em 2026.

"Mais do que isso, ele quer ser o candidato de uma frente única de oposição. Já recebeu apoio de diversos partidos, mas ainda depende do aval de Bolsonaro", afirma.

Com a inelegibilidade de Bolsonaro, Tarcísio é apontado como o favorito de uma parte do centro e do mercado para ser o nome da direita na disputa presidencial.

O governador nega sua intenção, afirma que buscará a reeleição em São Paulo e insiste que o único candidato da direita para 2026 é Bolsonaro.

Na última semana, Tarcísio passou dois dias em Brasília em reuniões com partidos de centro e direita e com o presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos).

O objetivo era fazer avançar o projeto que concede anistia aos envolvidos nos atos de 8 de janeiro na Casa.

Após essas movimentações, o líder do PL, Sóstenes Cavalcante, anunciou que a matéria já contava com o apoio de PSD, PP, PL, Republicanos, União Brasil e Novo. Juntas, essas legendas somam 292 votos  mais do que o suficiente para aprovar a anistia.

Motta, no entanto, afirmou que, apesar do interesse de Tarcísio, ainda não há consenso sobre a anistia.

O presidente do Senado, Davi Alcolumbre, também indicou que não pautará uma anistia geral e irrestrita, mas apenas um texto alternativo que pode excluir os supostos articuladores do golpe.

No domingo, 7, Tarcísio endureceu o tom e acenou ao bolsonarismo ao dizer que “ninguém aguenta mais a tirania de um ministro como [Alexandre de] Moraes” e questionou as provas do processo contra Bolsonaro e a delação, que chamou de mentirosa, de Mauro Cid, que foi ajudante de ordens do ex-presidente.

Tarcísio discursa durante a manifestação de 7 de setembro na Av. Paulista (NELSON ALMEIDA/AFP)

Além disso, o governador afirmou que, caso fosse eleito presidente da República, seu primeiro ato seria conceder indulto a Bolsonaro e também declarou que “não confia na Justiça”.

Mudança de conduta

A visão dos analistas é que o tom mais agressivo adotado por Tarcísio, que até então fazia críticas indiretas ao Supremo e a Moraes, é uma sinalização clara de lealdade exigida pelos apoiadores de Bolsonaro aos postulantes a uma candidatura à direita.

“Sem o apoio do ex-presidente, qualquer candidato de oposição corre o sério risco de perder no primeiro turno. Para obter esse apoio, ele precisa se posicionar de maneira contundente contra o Supremo”, diz Calcione, da Eurasia.

Antes dessa postura mais enfática, Tarcísio era criticado por parte dos bolsonaristas e, especialmente, pelos filhos de Bolsonaro, o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP) e o vereador Carlos Bolsonaro (PL-RJ).

Fábio Zambeli, analista político e diretor de Public Affairs do Grupo In Press, avalia que a decisão de intensificar as críticas ao Judiciário reflete a convicção de que o Supremo também estará sob escrutínio público nas eleições de 2026, especialmente no campo da direita.

“É um cálculo político. Ele certamente desagrada seus interlocutores na cúpula do Judiciário, parte da mídia e do empresariado. Mas cria vínculos sólidos com o eleitor bolsonarista raiz, que não aceita atitudes moderadas e o alinhamento automático com o Centrão”, afirma Zambeli.

Para o diretor do Grupo In Press, o risco dessa estratégia está na imprevisibilidade de Bolsonaro, que, nos últimos anos, não cumpriu acordos de longo prazo e tem mostrado dificuldade em lidar com uma sucessão natural.

“Portanto, é um movimento arriscado, embora seja provavelmente o único caminho possível se o governador realmente quiser liderar o bloco bolsonarista em 2026”, diz.

Risco de afastar o eleitor de centro

Os analistas também alertam que a estratégia de Tarcísio de aderir ao discurso bolsonarista pode resultar no distanciamento do eleitor de centro em uma eventual disputa em 2026.

“Ele corre o risco de assustar o eleitor moderado - aquele que não gosta de Lula, mas acha a prisão de Bolsonaro justa”, afirma Calcione.

Em relatório, a Arko Consultoria também aponta que o envolvimento direto na defesa da anistia pode aumentar a rejeição a Tarcísio entre os eleitores moderados, citando pesquisas de opinião recentes que embasam essa análise.

Uma pesquisa da AtlasIntel, divulgada em meados de agosto, mostrou que 51,2% dos entrevistados são contrários à anistia, 46,9% são favoráveis e 1,9% estão indecisos.

Outro levantamento, divulgado pelo Datafolha em 1º de agosto, mostra números semelhantes: 55% contra, 35% a favor e 11% indecisos.

De maneira geral, segundo o levantamento do Datafolha mais recente, o eleitorado está dividido em 39% dos eleitores são petistas e 37%, bolsonaristas. Considerando a margem de erro, os percentuais dos dois grupos estão tecnicamente empatados.

Esses dados mostram que qualquer candidato do campo da direita precisará da transferência de votos de Bolsonaro (que está inelegível até 2030).

No entanto, 23% dos eleitores são neutros ou não se identificam com nenhum lado, mais de 30 milhões de eleitores, número relevante para qualquer candidato que pretende vencer uma eleição presidencial.

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