Trem da CPTM: em entrevista à EXAME, presidente da estatal Michael Sotelo garante que nunca existiu plano para o fim da empresa (Nacho Doce/Reuters)
Repórter de Brasil e Economia
Publicado em 21 de setembro de 2025 às 08h01.
A Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM) segue de olho no futuro.
Perto de concluir o processo de transição da Linha 7-Rubi, que será operada pela concessionária TIC Trens a partir de novembro, e ver todas as linhas leiloadas à iniciativa privada, o presidente da estatal Michael Sotelo garante que nunca existiu plano para o fim da empresa e o foco é na potencialização da arrecadação de receitas não tarifárias.
"É importante deixar claro que o governo do estado nunca teve a intenção de acabar com a CPTM". Esse tipo de angústia fica surgindo de vez em quando, mas nunca foi colocado de forma oficial. A lógica das concessões sempre foi voltada para a melhoria da qualidade, avançar nos investimentos, e destravar o desenvolvimento", afirma em entrevista exclusiva à EXAME.
A estatal chegou na última sexta-feira, 19, ao marco de um ano do CPTM Serviços, vertente que oferece consultoria, manutenção e aluguel de ativos relacionados a trilhos para concessionárias privadas e públicas.
Já foram dois contratos assinados nesse período, dentro da meta definido pela empresa de um contrato por ano.
"Esses contratos somam quase R$ 5 milhões. Embora ainda não representem um valor expressivo no nosso orçamento, é um passo importante. A CPTM está se posicionando no mercado de prestação de serviços de consultoria, algo inédito para uma empresa pública de transporte no Brasil", diz Sotelo.
O primeiro foi com a Central Logística, órgão vinculado à Secretaria de Transporte e Mobilidade Urbana do Estado do Rio de Janeiro (SETRAM), no fim de 2024.
O segundo foi com a empresa pública de Urbanismo da Prefeitura de São Paulo para estruturação do projeto de Veículo Leve sobre Trilhos (VLT).
Para o próximo ano, a meta é de três contratos. O executivo diz que até três empresas estão em negociação para contratos de serviços continuados de manutenção e consultoria.
"O valor financeiro não é o principal agora, mas sim o posicionamento e a criação de um portfólio sólido de contratos", diz.
CPTM: Sotelo assumiu o comando da empresa em agosto de 2024 (CPTM/Divulgação)
Hoje, as receitas não tarifarias representam apenas 16% do faturamento da estatal. Sotelo afirma que esse número tem crescido, enquanto o prejuízo da empresa também caiu nos últimos anos.
O carro chefe da empresa é a receita tarifária, que vem da operação dos 196 quilômetros das linhas 7, 10, 11, 12 e 13. Dessas linhas, apenas a 10-Turquesa ainda não foi a leilão, mas o certame deve ocorrer ainda esse ano.
Sotelo afirma que nesse cenário a CPTM tem três papéis diferentes para assumir. O primeiro seria continuar como um braço do governo estadual, focado no desenvolvimento de projetos e implantação de obras.
O segundo seria atuar como operador em linhas regionais de média capacidade. O terceiro cenário seria a CPTM se tornar um agente mais generalista, que cuida de toda a infraestrutura do país.
O executivo valoriza o quadro técnico da companhia como essencial para a existência dessas possibilidades.
"Todos esses cenários são viáveis, e o mais provável é que eles coexistam. O papel da CPTM no futuro ainda está sendo desenhado. O governo do estado tem se mostrado muito focado em manter a expertise e capacidade técnica da CPTM", afirma.
Qual será o papel da CPTM nesse cenário sem a operação das linhas?
Primeiramente, é importante deixar claro que o governo do estado nunca teve a intenção de acabar com a CPTM. Esse tipo de angústia fica surgindo de vez em quando, mas nunca foi colocado de forma oficial. A lógica das concessões sempre foi voltada para a melhoria da qualidade, avançar nos investimentos, e destravar o desenvolvimento. A CPTM tem uma grande expertise interna e o governador tem deixado claro que não se trata de um movimento pela qualidade do serviço, mas para acelerar investimentos.
E como a CPTM serviços entra nessa lógica?
O que aconteceu é que, há um ano, lançamos o serviço da CPTM Serviços, para gerar novos negócios. O primeiro contrato assinado foi com o Rio de Janeiro, e logo após, assinamos com a empresa pública de Urbanismo da Prefeitura de São Paulo. Esses contratos somam quase R$ 5 milhões. Embora ainda não representem um valor expressivo no nosso orçamento, é um passo importante. A CPTM está se posicionando no mercado de prestação de serviços de consultoria, algo inédito para uma empresa pública de transporte no Brasil.
No primeiro ano da CPTM Serviços, o que vocês esperavam alcançar? E o que já foi feito até agora?
A meta inicial era um contrato em 2024 e outro em 2025. Para 2026, a meta é assinar de três contratos. Essa é uma projeção, mas, como estamos em um mercado novo, o valor financeiro e o volume de contratos devem crescer gradualmente à medida que o mercado reconheça a nossa competência.
E como tem sido esse processo de negociação com o setor privado? Quantos contratos ainda estão em negociação?
Estamos em negociações com mais dois ou três contratos, principalmente na área de serviços continuados. São serviços de manutenção e consultoria que vão além de um estudo específico. São contratos de longo prazo, em que a CPTM está se posicionando como um player estratégico no mercado. Temos sido procurados por várias entidades privadas, mas há um tempo de amadurecimento e negociação até que esses contratos se concretizem.
Além dos contratos, quais outras estratégias a CPTM Serviços está adotando para se posicionar como uma empresa de prestação de serviços no setor de infraestrutura?
Uma das estratégias é aumentar nossa presença em eventos setoriais e outros não tão relacionados ao setor ferroviário, mas que se conectem com a nossa experiência, como tecnologia de transporte e comunicação. Estamos muito bem posicionados nas redes sociais e temos expertise em logística de grandes públicos, o que nos permite participar de eventos que exigem grandes volumes de pessoas, como em eventos turísticos ou de segurança.
Você espera que a CPTM Serviços seja o principal negócio? Ou existem outros planos para o faturamento da empresa?
Se a CPTM deixar de ser o operador das linhas, ela pode assumir três papéis diferentes. O primeiro seria continuar como um braço do governo do estado, focado no desenvolvimento de projetos e implantação de obras. O segundo seria atuar como operador em linhas regionais de média capacidade, por exemplo, entre Santos e Cajati, onde poderíamos implantar e operar a linha até que uma concessão privada assuma. O terceiro cenário seria a CPTM se tornar um agente mais generalista, no estilo da Infra, que cuida de toda a infraestrutura do país. O papel de planejador, desenvolvedor e operador de linhas de média capacidade, como estamos fazendo atualmente, é uma possibilidade real. Podemos também assumir um papel híbrido, como no caso da concessão da Linha 4, onde o Estado fez a obra e o privado assume a operação e a manutenção. Estamos estudando todas essas opções e tudo vai depender do governo e das demandas do mercado.
E, dentro desse cenário, qual é o plano estratégico do governo estadual para a CPTM após o período de transição das linhas? Quais cenários são mais concretos nesse momento?
Todos esses cenários são viáveis, e o mais provável é que eles coexistam. O papel da CPTM no futuro ainda está sendo desenhado. O Governo do Estado tem se mostrado muito focado em manter a expertise e capacidade técnica da CPTM, o que nos dá uma grande confiança de que a CPTM continuará tendo um papel importante, seja como prestadora de serviços, planejadora de projetos ou até como operadora de linhas de transporte regional. Essa construção ainda está em andamento.
Como está sendo a gestão de custos e eficiência na CPTM, considerando que a empresa tem registrado prejuízos?
A CPTM está buscando constantemente melhorar sua eficiência. Temos trabalhado na redução de custos, simplificação de processos e em uma gestão mais eficiente de insumos. Um exemplo é a redução de 20% no custo de manutenção de trens, após uma nova licitação, e a redução de custos com energia elétrica, que conseguimos por um leilão antecipado. Embora a CPTM tenha registrado prejuízos, estamos buscando ativamente aumentar a receita não tarifária, que hoje já representa 16% da nossa receita total. A eficiência tem sido uma prioridade, e os resultados já estão aparecendo, com um nível de cobertura melhorando a cada ano.
E quanto ao futuro do quadro de funcionários da CPTM, considerando que a empresa vai passar por mudanças operacionais?
Estamos acompanhando a evolução da CPTM e, no curto prazo, já implementamos um Programa de Demissão Voluntária (PDV). Esse processo é para garantir que a CPTM se ajuste à nova realidade, mas com muita transparência e planejamento. Também estamos buscando integrar nossa mão de obra com outras concessionárias, já que o setor ferroviário é altamente técnico e a escassez de profissionais qualificados é um desafio. Estamos oferecendo capacitação interna para que os funcionários possam se adaptar às novas demandas, seja em gestão, empreendorismo ou em outras áreas. O processo de transição está sendo feito com muito cuidado, respeitando os colaboradores e suas necessidades.