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Além da infraestrutura tradicional: o potencial transformador das PPPs sociais no Brasil

É um novo modelo mental e de execução para a infraestrutura social que pode, tipicamente, resultar em uma relação de “ganha-ganha-ganha” entre iniciativa privada, setor público e população em geral

Escolas: autores defendem que PPPs para infraestrutura social podem transformar capacidades do Estado (Agência SP)

Escolas: autores defendem que PPPs para infraestrutura social podem transformar capacidades do Estado (Agência SP)

Da Redação
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Redação Exame

Publicado em 3 de agosto de 2025 às 08h01.

Por Fábio Tieppo* e Thiago Xavier** - O Brasil está vivendo um verdadeiro boom de licitações de concessões e parcerias público-privadas (PPPs), o que deve impulsionar significativamente o volume de investimentos e transformar o cenário econômico nos próximos anos.

Além dos tradicionais projetos concentrados nas áreas de logística e transportes – como rodovias, portos e aeroportos –, têm aumentado os projetos de PPPs sociais, que incluem concessões nas áreas de habitação, educação, saúde e segurança.

Recentemente, tanto o Estado quanto a Prefeitura de São Paulo anunciaram projetos de concessão de escolas, tendo tais propostas reacendido o debate político e social envolvendo tal modalidade de contrato.

O modelo de concessão foge da dicotomia tradicional entre Estado ou iniciativa privada na medida em que reconhece as capacidades, habilidades e responsabilidades de diferentes agentes, os quais tipicamente colaboram e partilham riscos em iniciativas de maior impacto. Ainda que tal tipo de arranjo colaborativo tenha sido motivado historicamente pela restrição orçamentária de governos, a literatura internacional mostra que ele representa uma alternativa economicamente viável e eficiente para a viabilização dos projetos.

Tipicamente, a lista de potenciais vantagens de uma PPP social inclui ganhos de eficiência, tendo em vista a colaboração de agentes com diferentes competências e expertises na operação, que podem ser complementares para a execução de um projeto, impactando inclusive na atração de capital privado, com menor nível de incerteza.

Segundo dados do Censo Escolar de 2024, há uma clara disparidade de infraestrutura entre as escolas das redes municipal e privada. As diferenças são observadas em todos os indicadores reportados, com gaps que variam de 9,4 a 40,5 pontos percentuais. É exatamente para lidar com essa diferença que as PPPs sociais podem gerar impacto.

Apesar das vantagens, porém, há desafios significativos na implementação de contratos de PPPs sociais. Destaca-se a resistência social e política, que frequentemente confunde um modelo de governança com privatização.

É importante esclarecer: em uma concessão, o contrato continua sendo rigorosamente desenhado, monitorado e fiscalizado pelo poder público. O parceiro privado deve seguir estritamente os parâmetros estabelecidos pelo governo.

No caso de uma escola, por exemplo, a grade curricular e as diretrizes pedagógicas continuarão sendo definidas pelo setor público, os alunos seguirão tendo ensino gratuito, e a diferença estará apenas em algumas das atividades realizadas dentro dessa escola, como a gestão da estrutura ou mesmo a execução de serviços operacionais.

Exemplos recentes do município de São Paulo, como o do Liceu Coração de Jesus, mostram que esse modelo pode permitir uma melhora na qualidade da educação, fato refletido nas estatísticas de pontuação monitoradas pelo município.

Para além dos resultados em testes padrão de ensino, a melhora na infraestrutura escolar afeta positivamente indicadores de saúde, segurança e qualidade de vida na região, gerando benefícios que vão além do ensino e se estendem a toda a comunidade.

Nesse contexto, é essencial que os governos mantenham um diálogo contínuo com toda a rede de stakeholders, incluindo as partes interessadas e a sociedade civil, desde a fase de mapeamento das demandas e concepção dos projetos.

Também é desejável que os contratos possuam uma avaliação prévia de impactos, cujo objetivo seja mensurar os custos e benefícios dos empreendimentos a fim de que tais evidências sirvam como base não apenas para o aprimoramento do projeto, mas também para as discussões públicas.

A modelagem contratual e econômico-financeira adequada é importante para o sucesso dessas iniciativas. Como muitos desses contratos são de longo prazo, é necessário criar mecanismos que garantam contraprestações compatíveis com o orçamento municipal e, ao mesmo tempo, atraentes para os investidores tecnicamente capacitados.

Por outro lado, é preciso estabelecer garantias que proporcionem segurança jurídica aos investidores, evitando que mudanças de governo interfiram no andamento do contrato ou no pagamento da remuneração acordada.

Trata-se, portanto, de um novo modelo mental e de execução para a infraestrutura social que pode, tipicamente, resultar em uma relação de “ganha-ganha-ganha” entre iniciativa privada, setor público e população em geral.


* Fábio Tieppo é consultor da Tendências Consultoria. Mestre em Teoria Econômica pela FEA/USP. Bacharel em Engenharia de Produção pela POLI/ USP e em Direito pelo Mackenzie, com pós-graduação em Administração de Empresas pela FGV-SP.

** Thiago Xavier é consultor da Tendências Consultoria. Mestre em Políticas Públicas pelo Insper. Bacharel em Ciências Econômicas pela PUC-SP e em Filosofia pela FFLCH/USP. Pesquisador pelo Insper.

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