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O que é o PL Antifacção e o que muda? Entenda

Relatório de Derrite propõe mudanças que equiparam facções a grupos terroristas

Publicado em 11 de novembro de 2025 às 08h14.

O relatório do deputado Guilherme Derrite (PP-SP) ao Projeto de Lei Antifacção do governo Lula amplia o escopo da proposta original e inclui dispositivos que, na prática, podem equiparar milicianos e traficantes a terroristas.

A mudança gerou reação entre especialistas, que alertam para impactos jurídicos e econômicos do texto, além de brechas que podem atingir outros grupos não criminosos.

O principal ponto de atenção é a alteração na Lei Antiterrorismo, que passa a prever penas semelhantes para crimes cometidos por facções e milícias, mesmo que sem motivação política — critério que historicamente diferencia o terrorismo de outras formas de violência.

O que muda na Lei Antiterrorismo?

Originalmente, o projeto do Executivo visava mudanças na Lei de Organizações Criminosas (2013). O parecer de Derrite, no entanto, incluiu novos artigos na Lei Antiterrorismo (2016), prevendo que membros de facções, milícias ou grupos paramilitares possam receber as mesmas penas aplicadas a atos terroristas.

A lista de condutas inclui o controle social sobre atividades econômicas mediante ameaça ou violência, e danos a meios de transporte, como ônibus e carros.

Embora o relator afirme que não classifica as facções como terroristas, especialistas afirmam que a equiparação legal produz esse efeito.

Há risco de impacto econômico?

Sim. A preocupação de analistas é que o novo texto possa levar o Brasil a ser interpretado como país com presença de grupos terroristas, ao menos do ponto de vista jurídico.

Segundo o professor Renato Galeno, do Ibmec-RJ, o projeto elimina a necessidade de motivação ideológica para classificar ações como terrorismo, o que pode levar a sanções econômicas por parte de países ou organismos internacionais.

Empresas estrangeiras podem evitar investir em regiões sob domínio de facções, como áreas urbanas do Rio de Janeiro e São Paulo, por receio de vínculos indiretos com grupos enquadrados como terroristas.

Outros grupos podem ser afetados?

Sim. O relatório também cita entre os atos puníveis a depredação de meios de transporte ou uso de explosivos contra instituições financeiras. Ainda que a Lei Antiterrorismo exclua expressamente movimentos sociais, o alcance vago das condutas descritas pode ser usado contra manifestações públicas, segundo especialistas.

Renato Sérgio de Lima, do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, alertou que o projeto, ao buscar maior rigor contra facções, pode restringir o espaço cívico e ampliar o risco de criminalização de protestos.

O projeto interfere na competência de investigações?

O relatório prevê que crimes de facções continuem sob responsabilidade das forças estaduais, mesmo que sejam agora enquadrados na Lei Antiterrorismo — o que tradicionalmente atrai a competência da Polícia Federal.

Segundo o procurador Vladimir Aras, isso pode gerar disputas entre esferas de investigação e resultar em nulidades processuais, além de atrasar julgamentos.

Há efeito sobre o bloqueio de bens?

O texto atual prevê formas de acelerar o congelamento de patrimônio de facções. No entanto, especialistas apontam que o projeto original previa medidas mais abrangentes, como o perdimento de bens mesmo após a morte do réu ou a prescrição do processo — itens que ficaram de fora do parecer.

Para Jorge Lasmar, da PUC Minas, uma alternativa mais eficaz seria adotar os mecanismos já usados em sanções internacionais, como a possibilidade de bloqueio sem decisão judicial prévia, aplicada a casos de financiamento ao terrorismo.

Veja os principais pontos do projeto antifacção:

  • Novo crime: Cria a “organização criminosa qualificada”, com pena de 8 a 15 anos de prisão para grupos que tentem controlar territórios e atividades econômicas, via “violência e ameaça”. O objetivo é enquadrar facções e milícias.
  • Servidor público: A Justiça pode afastar cautelarmente o servidor que “promove, constitui, financia ou integra” a organização criminosa. Condenados ficam impedidos de vínculo com o Poder Público por até 14 anos.
  • Penas mais duras: A pena sobe para até 30 anos se houver homicídio em favor da “organização criminosa qualificada”. Também foi endurecida a punição para organização criminosa simples, que pode chegar a 10 anos.
  • Intervenção judicial: A Justiça pode ordenar “intervenção judicial” em empresa ligada à organização criminosa, com nomeação de gestor externo. A medida prevê “imediato bloqueio” de operação financeira, societária e afins.
  • Sequestro de bens: A Justiça pode decretar a apreensão de bens e valores do investigado no curso do inquérito ou ação penal, ainda antes do trânsito em julgado, se houver suspeita de que são fruto do crime.
  • Banco de dados nacional: Estabelece um “Banco Nacional das Organizações Criminosas”, com o objetivo de reunir informações sobre os faccionados. Ele poderia ser consultado por qualquer órgão de segurança pública.
  • Monitoramento de preso: O texto prevê o monitoramento, com autorização judicial, de conversas e reuniões de presos provisórios e condenados por integrar organização criminosa, podendo ocorrer no parlatório ou por meio virtual.
  • Transferência de cadeia: A administração penitenciária ganha o direito de transferir presos para outras cadeias, comunicando imediatamente o juiz. Isso, no entanto, só poderá ser feito no caso de risco iminente nos casos de motim, rebelião ou outras situações de grave perturbação da ordem no estabelecimento prisional.

*Com informações do O Globo

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