Publicado em 23 de abril de 2025 às 08h00.
Última atualização em 23 de abril de 2025 às 11h19.
Educar é um ato que pressupõe a interlocução entre pelo menos dois agentes, o/a educador/a e o/a educando/a. Será assim tão simples? De certo que não. O que ensina também aprende. Educamo-nos uns aos outros, como já dizia Paulo Freire. E quem também educa é a Natureza. Ela ensina o tempo todo. Mas e nós, nos preocupamos em verdadeiramente aprender?
E o que estamos ensinando através das ações humanas? Infelizmente, muitas decisões equivocadas têm infligido profundas feridas no corpo-mãe Terra. Apesar disso, sabemos também oferecer o amor, a empatia, o cuidado! Podemos criar tecnologia e fazer música. Somos seres criativos, moldamos nosso estar no mundo. Questionemos: que mundo estamos construindo e qual queremos, de fato, construir?
As mudanças climáticas são resultado direto de uma lógica produtivista capitalista, em que o ideal é sempre produzir mais, acumular mais. Desde a revolução industrial entramos em uma curva acelerada e perigosa. Como aquela velha analogia da locomotiva que corre para o penhasco. Não basta puxar o freio, é preciso criar outras rotas!
Precisamos da educação para nos ajudar a solucionar os problemas na sociedade. E a educação ambiental é fundamental para melhorarmos o presente e garantirmos o futuro. Adiar o fim do mundo, como propõe Ailton Krenak, é tarefa coletiva. E só conseguiremos dar conta dela se tivermos a humildade de reaprender a estar neste planeta.
Quando pensamos em educação, geralmente imaginamos uma sala de aula com um professor ou professora ensinando conteúdos como português, matemática, história, ciências…da natureza! É nesse lugar onde, muitas vezes, se imagina que está a educação ambiental. É evidente que ela está presente nas escolas, nas universidades, nos espaços formais de ensino, mas, ao se falar em educação ambiental, precisamos pensar em uma abordagem interdisciplinar e, por que não, transdisciplinar.
Diferentemente de uma visão cartesiana, em que cada coisa está numa caixinha, a educação ambiental nos ensina a ver o todo — nada está separado. Lembremos que somos irmãos de tudo que tem asas, patas, guelras e raízes. Estamos vivos em uma teia de interconexões. Interdependentes em uma mesma casa comum. No caminho que aponta a Campanha da Fraternidade deste ano, a ecologia integral, que pede atenção à casa comum, às relações humanas e à justiça social.
Está em tramitação na Câmara dos Deputados o Projeto de Lei 2614/24, que estabelece o Plano Nacional da Educação (PNE) para a próxima década (2024 a 2034). Dentre suas diretrizes estão a promoção dos direitos humanos, do respeito à diversidade e da sustentabilidade socioambiental. Traz a perspectiva da abordagem transversal da questão ambiental.
Ações previstas para a educação ambiental, no PNE, como a produção de conteúdos sobre mudanças climáticas estão alinhadas à importância da educação climática para o mundo atual. Entretanto, não chegaremos aonde queremos sem elementos básicos para uma educação de qualidade: valorização dos professores e profissionais da educação, com garantia de piso salarial adequado; atenção à saúde mental e emocional de docentes e discentes; climatização das escolas, entre outros. Afinal, como se aprende alguma coisa em uma sala de aula que ultrapassa os 40 graus celsius?
A educação ambiental precisa educar os pequenos, nossas crianças e jovens, que são a chance de construir o futuro, mas também precisa disputar a sociedade: os adultos, os tomadores de decisão. Não dá tempo de só esperar as novas gerações crescerem, há risco de chegarmos a um estado irretornável de degradação. É preciso disputar a política, denunciar os modelos de desenvolvimento que capturam a vida. Para isso, a educação ambiental não pode ser ingênua, tem que ser crítica, saber ler o mundo e atuar para sua transformação. Para ser efetiva, precisa combinar as ações individuais com as coletivas. Agir localmente, para incidir globalmente. Ensinar a reciclagem, mas também combater o consumo indiscriminado, responsabilizar as empresas que lucram com a poluição e exploração dos países periféricos.
Para isso é preciso que a educação ambiental também seja desenvolvida e valorizada nos ambientes não-formais e informais de educação. Inserida na cultura, na comunicação do governo e, claro, nos territórios, nos espaços comunitários. Como foi dito no início deste texto: a natureza ensina! As Unidades de Conservação (UCs) são espaços fundamentais para a preservação da biodiversidade, mas são também locais de promoção da educação ambiental. Estar na natureza é fundamental, para nosso aprendizado e também para nosso bem-estar.
Ensinam também os povos que vivem a natureza de perto, de dentro, os povos das florestas, das águas, indígenas, caiçaras, ribeirinhos, quilombolas… Povos e comunidades tradicionais (PCTs) que têm muito a ensinar à nossa sociedade ocidental, capitalista e globalizada. Ensinam a ouvir com ouvidos atentos os ensinamentos da Terra. A viver com menos impacto, a entender os ciclos da natureza e respeitar seus limites. Antes de existirem os agrotóxicos e os transgênicos, a agricultura orgânica era simplesmente agricultura. Hoje a agroecologia resgata esses saberes e práticas que vão sendo transformados em monocultura.
Precisamos de educação ambiental integral, crítica, decolonial. Que nosso norte seja o Sul. Para termos futuro, ele precisa ser ancestral, resgatar nossas raízes. Que aprendamos com as epistemologias existentes e insurgentes do Sul a pisar mais suave na terra. Eduquemo-nos, em comunhão com o Todo.
*Chico Alencar é deputado federal pelo Rio de Janeiro e membro da Frente Parlamentar Mista da Educação