O Brasil precisa se preparar para aproveitar o pujante manancial da economia prateada, pois possui uma grande população envelhecida e em rápido crescimento (Reprodução)
Publicado em 29 de março de 2025 às 08h15.
Por José Eustáquio Diniz Alves*
O envelhecimento populacional é a principal característica demográfica do século XXI. O Brasil e o mundo estão passando por uma mudança da estrutura etária e, inexoravelmente, a proporção de idosos na população vai aumentar ao longo das próximas décadas.
No Brasil, o envelhecimento populacional ocorrerá de forma mais acelerada e intensa do que a média global, embora de maneira um pouco mais moderada do que em países como Japão, Coreia do Sul e China. A inversão da pirâmide etária é um fenômeno inevitável, resultado da transição demográfica, variando apenas em ritmo e grau entre os diferentes países. No entanto, embora irremediável, o envelhecimento populacional não representa um impasse, mas sim um desafio que pode ser transformado em oportunidades.
A mudança da estrutura etária é simplesmente uma nova realidade demográfica que não é intrinsecamente negativa nem positiva. A forma como as nações respondem a essa mudança, por meio de suas instituições sociais e políticas e a maneira de implementação das diversas ações é que determinará se elas prosperarão ou não.
Na verdade, os estágios iniciais do envelhecimento populacional ajudaram a impulsionar o crescimento econômico do Brasil, desde 1970, à medida que o país pode contar com uma grande população em idade ativa, transformada em uma crescente força de trabalho produtiva — o que é chamado de "primeiro bônus demográfico".
Esta janela de oportunidade se abriu no início da década de 1970 e atingiu o auge no quinquênio 2015-2019, quando a população brasileira de 0-49 anos atingiu 154 milhões de habitantes. Neste período, a expectativa de vida ao nascer era de 57 anos em 1970 e saltou para 76 anos em 2019. O número médio de anos de estudo estava em 2,4 anos em 1970 e passou para quase 10 anos atualmente. O Brasil se beneficiou de uma força de trabalho quantitativamente maior e qualitativamente melhor, em termos de saúde e educação.
Porém, a população brasileira com menos de 50 anos, em termos absolutos, já começou a decrescer e encolherá bastante ao longo do século XXI. A população de 0-49 anos, em termos relativos, representava 90% do total populacional do país entre 1950 e 1970, caiu para 72% em 2025 e deve atingir 48% em 2100.
Embora a janela do primeiro bônus demográfico esteja se fechando devido à redução da proporção de jovens na população e à previsão de declínio populacional na segunda metade deste século, surgem duas novas oportunidades que podem ser aproveitadas para impulsionar a prosperidade do Brasil.
A literatura acadêmica da demografia econômica aponta para a existência de um 2º bônus demográfico – ou bônus da produtividade – que ocorre quando uma força de trabalho numericamente menor consegue produzir um volume cada vez maior de bens e serviços em função de avanços educacionais e científicos e de avanços tecnológicos que permitem produzir mais utilidades de bem-estar, com menos insumos de mão de obra.
Uma população ativa menor tende a levar a uma maior valorização da educação e da qualificação profissional, elevando a produtividade individual. As empresas e governos tendem a investir mais em capacitação e inovação, pois a escassez de mão de obra qualificada torna a eficiência ainda mais crucial. Além disto setores menos produtivos podem perder relevância, enquanto setores de alta produtividade ganham espaço. A alocação do trabalho tende a ser mais eficiente, com um foco maior em tarefas de alto valor agregado.
Estudos recentes da demografia e da economia têm chamado a atenção para a existência de um 3º bônus demográfico – ou bônus prateado ou da longevidade – que surge em decorrência do crescimento da população da terceira idade e da criação de um mercado de trabalho e de consumo que se multiplica com a expansão do topo da pirâmide populacional. A maior longevidade é uma conquista inestimável e é um fator essencial do desenvolvimento humano e do progresso das civilizações.
A combinação de baixa fecundidade e alta expectativa de vida tem engendrado o alargamento do topo da pirâmide etária no Brasil. A população de 50 anos e mais que representava apenas 10% da população total do país, aumentou para 28% em 2025 e deve se tornar a maioria da população brasileira nas duas últimas décadas do atual século, alcançando 52% em 2100 (25% de homens e 27% de mulheres), como mostra o gráfico abaixo, com projeções da Divisão de População da ONU.
O primeiro bônus demográfico é temporário, mas os outros dois são permanentes. A maior produtividade das gerações grisalhas é que irá possibilitar que o Brasil supere a “armadilha da renda média”. Para tanto, o país precisa mudar a cultura etarista que vê o idoso como um fardo para a sociedade e criar uma sinergia entre a sociedade civil, a iniciativa privada e as políticas públicas para garantir o pleno aproveitamento do potencial criativo e produtivo da economia prateada. Os setores mais impactados serão:
O Brasil precisa se preparar para aproveitar o pujante manancial da economia prateada, pois possui uma grande população envelhecida e em rápido crescimento e, por meio do fenômeno de "substituição de coortes", os idosos brasileiros se tornarão mais qualificados, mais longevos e mais integrados na dinâmica econômica e tecnológica do século XXI.
A economia prateada deve ser desenvolvida com um propósito maior do que simplesmente impulsionar o crescimento quantitativo da produção de mercadorias. Seu foco deve estar em capacitar e empoderar os cidadãos idosos, não apenas como consumidores, mas como membros ativos e valorizados da sociedade. Além disso, é fundamental ampliar as oportunidades disponíveis para toda a população brasileira, promovendo um futuro mais sustentável e inclusivo, pautado pela harmonia, pela valorização da diversidade etária e pela integração das pessoas de todas as regiões do país.
* José Eustáquio Diniz Alves é doutor em demografia e diretor da Decifra consultoria em Demografia