As vendas de novos veículos, por outro lado, subiram 5,7% em março ante fevereiro e 4,2% frente ao mesmo mês do ano passado, somando 195,5 mil unidades (Governo do Rio / Divulgação)
Repórter
Publicado em 8 de abril de 2025 às 14h25.
A produção de veículos no Brasil caiu 12,6% em março deste ano na comparação com fevereiro, totalizando 190.008 unidades, segundo dados divulgados nesta terça-feira, 8, pela Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea). Apesar do resultado negativo no mês, houve um avanço de 8,3% no acumulado do primeiro trimestre. Mas o o setor acendeu um sinal de alerta diante dos impactos potenciais das tarifas anunciadas pelos Estados Unidos, que podem provocar uma reorganização produtiva na América Latina, afetando diretamente o Brasil.
De acordo com a entidade, embora o governo brasileiro tenha atuado para mitigar os efeitos das medidas e o país tenha recebido a tarifa mínima, de 10%, a preocupação maior está na realocação de investimentos dentro da região.
Um dos principais pontos de atenção é o México, que tende a se beneficiar com a necessidade das montadoras de investir mais nos EUA. Isso pode gerar capacidade ociosa nas fábricas mexicanas — atualmente são 37 plantas automotivas e mais de mil fabricantes de autopeças —, que poderá ser usada para abastecer outros mercados, incluindo o Mercosul, com quem o México mantém acordo de livre comércio.
"Estamos falando de empresas globais, que têm fábricas no Brasil, no México, nos Estados Unidos e na China. Qualquer mudança de rota nos investimentos pode afetar o volume e o destino da produção", afirmou Márcio de Lima Leite, presidente da Anfavea que deixa o cargo após três anos de gestão.
O mercado interno de consumo do México é inferior a 2 milhões de unidade, apontam dados da associação sobre a fabricação de 2024. O país exporta para os EUA 3,2 milhões de unidades, o que equivale a 76% da produção total.
Leite avalia que esse total de carros deixarão de ser exportados, mas a Anfavea ainda não tem o número de quanto será a queda. A avaliação é que essa produção seja deslocada para países que o México tenha acordo de bitributação e tarifas zero, como é o Brasil.
"A política do Trump é principalmente para a produção no mercado americano, então os investimentos serão feitos no mercado americano. Com isso você gera uma capacidade ociosa no México e para utilizar-la, investimentos que seriam feitos na América Latina, deixarão de ser feitos porque você usa a capacidade ociosa do México. Em outras palavras, o bolso é um só, o fabricante de veículo, pegando uma empresa B com produção no México, nos EUA e no Brasil, se ela tiver que investir nos EUA, ela vai tirar investimento de onde? Ela vai usar a capacidade ociosa do México e deixar de fazer investimentos em outros países, e o Brasil pode ser um dos impactados", diz o presidente.
"Nessa nova ordem global o impacto não pode ser visto apenas de forma direta, dos países que exportam para os países indiretos, porque é esse efeito que acaba prejudicando países como Brasil, que tem grande mercado, mas tem acordo de livre comércio com o México e um custo de produção mais baixo do que o Brasil".
Na comparação com março de 2023, a produção de veículos também caiu 2,9%. De acordo com Anfavea, as quedas na área estão relacionadas ao recuo no número de estoques, que perdeu 8 mil unidades, assim como a quantidades de dias úteis, reduzidos pelos feriados.
As vendas de novos veículos, por outro lado, subiram 5,7% em março ante fevereiro e 4,2% frente ao mesmo mês do ano passado, somando 195,5 mil unidades.
No trimestre, os emplacamentos chegaram a 551,7 mil veículos, alta de 7,2%. As exportações cresceram 19% em março sobre o mesmo mês de 2023, para 38,9 mil veículos, e dispararam 40,6% no trimestre, somando 115,6 mil unidades.
Segundo a Anfavea, o mercado argentino é o principal fator que contribuiu para a alta expressiva nas exportações de carros fabricados no Brasil.
"A Argentina registrou crescimento de 120% e isso acaba impactando as exportações brasileiras, mesmo com uma queda de 19% em março. Junto dela, Colômbia e Chile crescendo também ajudaram nas exportações", diz Igor Calvet, que assume a presidência da associação representante das montadoras neste mês.
A Anfavea também manifestou preocupação com o atraso na implementação do programa Mover, voltado à descarbonização e inovação no setor automotivo. "Anunciamos mais de R$ 180 bilhões em investimentos, com expectativa de aumento desse volume. Mas a imprevisibilidade tem afetado diretamente a execução desses projetos. Já observamos atrasos na implementação e algumas associadas anunciaram revisão em seus planos", Leite.
O setor também critica a instabilidade em torno de medidas como o IPI Verde, cuja regulamentação sofreu sucessivos adiamentos ao longo de 2023. "A indústria precisa de previsibilidade. O que temos hoje é incerteza, inclusive quanto ao volume de recursos. Os R$ 3,8 bilhões do programa têm se mostrado insuficientes frente à demanda dos fabricantes de veículos e autopeças", destacou o presidente da Anfavea.
A associação disse que segue em diálogo com o governo federal sobre critérios e prazos para liberação dos incentivos.
Mas outro ponto sensível é o crescimento acelerado das importações de veículos eletrificados, especialmente da China. Segundo a entidade, em junho do ano passado, no período que antecedeu a elevação das alíquotas de importação, os importadores chegaram a acumular um estoque de 87 mil veículos. A expectativa é que esse número possa atingir 100 mil unidades até junho deste ano, impactando de forma "violenta" a produção nacional, alerta a associação.
A Anfavea também criticou pedidos recentes — principalmente de montadoras chinesas — para extensão da redução tarifária na importação de veículos em SKD e CKD, de 10% a 5% respectivamente, modalidades que envolvem veículos desmontados parcialmente ou em kits.
"É um ataque direto à produção local, aos investimentos e aos empregos no Brasil. Se esses pleitos avançarem, o impacto será grande sobre a nossa indústria", afirmou Leite.
Segundo a associação, o Brasil é hoje um dos países com menor tarifa de importação sobre veículos do mundo, e a demora na recomposição das alíquotas para o patamar de 35% coloca em risco o ciclo de crescimento do emprego e dos investimentos na cadeia automotiva.
"Precisamos conter esse avanço dos importados. O setor está contratando, mas a continuidade dessa retomada depende de previsibilidade e de um ambiente de concorrência equilibrado", finalizou a Anfavea.