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Opinião: para empresas e mercado de trabalho, o custo do silêncio sobre a menopausa é incalculável

O mercado de trabalho brasileiro não pode continuar permitindo que mulheres altamente capacitadas sejam levadas ao limite ou à saída forçada por pura negligência institucional

A falta de suporte para mulheres no climatério tem efeitos diretos no mercado de trabalho (Fiordaliso/Getty Images)

A falta de suporte para mulheres no climatério tem efeitos diretos no mercado de trabalho (Fiordaliso/Getty Images)

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Publicado em 23 de outubro de 2025 às 13h00.

Por Fabiane Berta*

No auge da experiência e da maturidade profissional, milhares de mulheres brasileiras estão misteriosamente deixando seus cargos, abrindo mão de promoções ou simplesmente aceitando a perda de produtividade como uma fatalidade. 

Não é por falta de competência, mas por uma conjunção de sintomas físicos e psicológicos relacionados à menopausa que seguem negligenciados pelas empresas, pelas políticas públicas e, muitas vezes, até por elas mesmas.

Ondas de calor intensas no meio de uma reunião estratégica, noites mal dormidas antes de uma apresentação, lapsos de memória constrangedores diante da equipe, irritabilidade em dias de decisão, dores articulares que atrapalham a performance, queda de libido, ansiedade, depressão, alterações cognitivas. 

A lista é longa, complexa e, para 47% das mulheres brasileiras em idade de climatério, tudo isso afeta diretamente a rotina de trabalho. Mas ao invés de serem ouvidas, elas são ignoradas, desacreditadas ou, pior, tratadas como “instáveis” no momento em que mais poderiam liderar.

E o impacto é direto

De acordo com a pesquisa global “Experiência e Atitudes na Menopausa”:

  • 26% das mulheres relataram queda de produtividade
  • 17% têm medo de contar aos colegas sobre o que estão vivendo, 
  • 9% enfrentam discriminação explícita,
  • 13% já pediram demissão. 

Esses números são apenas a superfície de um fenômeno ainda mais preocupante: o abandono invisível de mulheres maduras do mercado de trabalho, uma perda irreparável de talento, liderança e inteligência institucional.

No Brasil, a sub-representação feminina entre 50 e 64 anos é evidente: apenas 38% das mulheres dessa faixa etária estão empregadas. Muitas saem porque não encontram suporte, não se reconhecem nos ambientes de trabalho e não têm respaldo médico adequado. 

A nova NR-1, que passou a exigir das empresas a avaliação de riscos psicossociais no ambiente laboral, poderia ser uma porta de entrada para enfrentar o problema. Porém, sua obrigatoriedade foi prorrogada para 2026, e o risco de que essa pauta seja empurrada com a barriga é real.

Enquanto isso, o impacto cresce 

Em 2022, mais de 209 mil pessoas foram afastadas do trabalho no Brasil por transtornos mentais, um salto que exige atenção redobrada. 

A intersecção entre saúde mental e menopausa é clara, especialmente considerando sintomas como insônia (61%), cansaço (60%), ansiedade (50%) e irritabilidade (54%). Os dados são alarmantes, mas ainda assim a saúde ocupacional segue tratando a menopausa como um “não-assunto”.

Em nível global, estima-se que as perdas de produtividade associadas à menopausa ultrapassem US$ 150 bilhões por ano, segundo a consultoria Frost & Sullivan. Mas não se trata apenas de números. 

Trata-se de reconhecer a singularidade das vivências femininas no mercado e criar um ambiente onde todas as mulheridades, com suas histórias, corpos e ciclos, possam permanecer, crescer e liderar.

Algumas empresas já começam a se movimentar

Programas de acolhimento, atualização médica sobre climatério, flexibilização de horários e revisão das políticas de saúde corporativa são passos fundamentais. Mas é preciso mais.

O Brasil precisa de diretrizes claras para garantir que profissionais de saúde estejam preparados para diagnosticar corretamente os sintomas da menopausa, orientar com base em evidências e prescrever tratamentos eficazes. Não se trata de modismo, se trata de dignidade.

A criação de uma política nacional para a saúde da mulher madura, com protocolos clínicos atualizados, campanhas de informação e integração com a saúde mental, não é mais uma demanda futura, é uma urgência presente. 

O mercado de trabalho brasileiro não pode continuar permitindo que mulheres altamente capacitadas sejam levadas ao limite ou à saída forçada por pura negligência institucional.

A longevidade feminina é um dos maiores trunfos demográficos do país. Transformá-la em potência produtiva, criativa e econômica exige um único gesto coletivo: romper o silêncio. Porque hoje, 40 milhões de mulheres brasileiras estão atravessando a transição menopáusica e a maioria ainda faz isso sozinha.

O custo do silêncio sobre a menopausa é incalculável 

Incalculável para a economia, que perde mão de obra qualificada no auge da sua capacidade.

Para as empresas, que desperdiçam inteligência emocional e liderança madura, para o país, que assiste à evasão invisível de mulheres experientes do mercado de trabalho.

Para o sistema de saúde, que segue tratando sintomas reais como secundários ou “normais”, para a sociedade, que reforça o etarismo e o apagamento feminino. 

Para as famílias, que convivem com o sofrimento silenciado de mães, esposas, filhas e avós. 

E para o mundo, que ainda insiste em marginalizar uma experiência feminina universal. 

Todo mundo tem uma mulher em casa! Mas a boa notícia é que ainda dá tempo de virar esse jogo e a hora é agora!

* Fabiane Berta, é médica, pesquisadora e fundadora do MyPausa, movimento de iniciativa do estudo RENEW, primeiro registro nacional da menopausa, mapeando os 27 estados brasileiros para entender de fato a realidade das mulheres nesta fase da vida.

 

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