( Images By Tang Tag Ming Tung/Getty Images)
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Publicado em 1 de julho de 2025 às 10h00.
Por Renato Carvalho e Eleonora Stocchero Fonseca*
Os suplementos alimentares se tornaram protagonistas silenciosos de uma era que exalta o bem-estar e a alta performance. Seja para fortalecer músculos, melhorar a imunidade ou compensar uma dieta desequilibrada, esses produtos conquistaram espaço nas prateleiras e na rotina de milhões de pessoas.
Recentemente, uma reportagem em uma renomada revista brasileira apresentou críticas severas à indústria de suplementos alimentares e ao mercado de wellness (bem-estar), chamando atenção para exageros, promessas infundadas e estratégias de marketing pseudocientífico que, de fato, permeiam parte do setor. Essa leitura motivou a reflexão que originou este artigo: é fundamental reconhecer os problemas apontados, mas também é necessário trazer uma visão mais equilibrada sobre o tema.
Pintar toda a indústria de suplementos como se não tivesse valor algum é uma generalização injusta e imprecisa. Existe, sim, um mercado sério, baseado em ciência, qualidade e responsabilidade, tanto por parte de empresas quanto de consumidores. Uma suplementação bem orientada e responsável vem a ser um aliado importante da saúde, desde que baseada em evidências e boas práticas. Ou seja, é possível – e necessário – adotar uma visão mais equilibrada, reconhecendo problemas reais sem ignorar os benefícios comprovados e o papel legítimo que muitos suplementos desempenham na saúde.
Em um cenário em que a rotina das pessoas raramente permite uma alimentação saudável e equilibrada, manter o consumo ideal de frutas, legumes e um prato variado todos os dias é um desafio concreto. A pressa, a falta de tempo e o acesso limitado a alimentos frescos tornam difícil manter padrões nutricionais ideais. Além disso, quando se trata da ingestão adequada de proteínas, fundamental para prevenir a perda muscular que ocorre com o avanço da idade, atingir as metas diárias apenas com a dieta natural se torna, para muitos, uma tarefa quase impossível. Nesses casos, a suplementação surge como um recurso viável e eficaz para complementar lacunas nutricionais e preservar a saúde.
É inegável que no mercado de suplementos e bem-estar há exageros e produtos de eficácia duvidosa. Propagandas usando jargões científicos de forma indevida (o que já foi chamado de science ploitation) e promessas de resultados milagrosos aparecem com frequência. Esses casos merecem crítica e maior fiscalização. Entretanto, generalizar a crítica como se todo suplemento fosse inútil ou enganoso distorce a realidade. Assim como, em qualquer setor, de um lado existem empresas sérias e produtos com qualidade e embasamento e do outro lado oportunistas.
Por exemplo, sucos detox que alegam eliminar toxinas do corpo são simplificações enganosas – afinal, quem faz a verdadeira detoxificação do organismo são o fígado e os rins, que naturalmente removem toxinas e não uma bebida específica. Em contrapartida, há suplementos nutricionais desenvolvidos com base em pesquisas sólidas, indicados para suprir carências ou auxiliar em funções fisiológicas, que demonstram benefícios claros. Colocar todos no mesmo balaio seria injusto com os profissionais e cientistas sérios envolvidos no desenvolvimento de suplementos eficazes. A crítica cega pode levar o público a desacreditar inclusive em intervenções úteis e comprovadas, o que não é o desejável do ponto de vista da saúde pública.
Diversos suplementos possuem benefícios comprovados quando utilizados de forma correta e respaldados pela ciência. E alguns exemplos incluem a eficácia da creatina monohidratada para o ganho de força e massa muscular em atletas e praticantes de musculação. Além disso, estudos recentes sugerem benefícios cognitivos e de preservação muscular em idosos. Os ácidos graxos EPA e DHA (ômega-3 - óleo de peixe) têm efeitos anti-inflamatórios e cardiovasculares documentados, com redução do risco de infartos e AVCs em populações específicas. A vitamina D é comprovadamente essencial para a saúde óssea, muscular e imunológica. Deficiências são comuns, especialmente em ambientes urbanos, e sua suplementação, sob orientação médica, pode prevenir diversas doenças. E o colágeno tipo II mostrou benefícios em estudos clínicos no alívio de dores e na melhora da mobilidade em casos de osteoartrite de joelho. Esses exemplos ilustram que nem todos os suplementos são placebo ou enganação.
Pelo contrário, muitos contam com amplo suporte científico e fazem parte de estratégias de saúde baseadas em evidências, desde que utilizados nas situações corretas. Ignorar esses fatos comprovados seria tão equivocado quanto acreditar cegamente em qualquer produto milagroso. Quando produzidos e utilizados dentro de padrões de qualidade e segurança, os suplementos alimentares podem ser grandes aliados da saúde. Eles fornecem um “algo a mais” nutricional, ajudando a atingir metas que a dieta sozinha não alcança. Mas é crucial ter claro que eles não substituem os bons hábitos. O próprio nome já indica: suplemento existe para suplementar, para completar.
Neste sentido, a necessidade de regulamentação rígida para suplementos é indiscutível. Sendo produtos de consumo amplo, é preciso garantir que contenham o que prometem e que não ofereçam riscos à saúde. O Brasil deu passos importantes nesse sentido: em 2018, a Anvisa criou a categoria específica de suplementos alimentares com critérios de composição, limites de dosagem e exigência de comprovação científica para alegações de saúde. Ainda assim, os desafios permanecem – muitos fabricantes inescrupulosos tentam burlar as normas. Em 2023, quase metade das infrações registradas pela Anvisa no setor de alimentos envolveram suplementos alimentares, geralmente por propaganda sem comprovação, uso de ingredientes proibidos ou venda de produtos não autorizados. Dados como esse deixam claro que a fiscalização deve ser constante e rigorosa para coibir abusos.
Por outro lado, é importante não confundir a parte com o todo. Desacreditar em bloco todos os suplementos, por conta das falhas de alguns, pode ser prejudicial. O excesso de ceticismo, quando vira negação indiscriminada, acaba desinformando tanto quanto o marketing exagerado. Se as pessoas forem levadas a crer que “nenhum suplemento serve para nada”, corre-se o risco de afastá-las de soluções legítimas e úteis. Por exemplo, alguém que precise repor vitamina D pode negligenciar o tratamento por achar que todo suplemento é bobagem, o que traria prejuízo à sua saúde. Portanto, o caminho ideal está no meio termo. É preciso regulamentar e fiscalizar com rigor, punindo os charlatões, mas ao mesmo tempo comunicar de forma equilibrada e coerente os benefícios dos suplementos de qualidade, para que a população confie nas orientações embasadas e não em modismos.
Por fim, investir em educação do consumidor é essencial. Quanto mais informada a pessoa estiver, melhores serão suas escolhas frente à avalanche de produtos no mercado. Isso significa incentivar uma visão crítica: desconfiar de promessas milagrosas (“cura-tudo” ou “resultados instantâneos”), ler os rótulos com atenção, entender para que servem os componentes do suplemento e em que casos seu uso é indicado. Consultar profissionais de saúde (médicos, nutricionistas) também é recomendável para avaliar a real necessidade de um suplemento e ajustar as doses de forma segura. Vale lembrar que mesmo nutrientes benéficos podem fazer mal em excesso, portanto, seguir as orientações de uso é tão importante quanto optar por um produto de qualidade.
Do lado da indústria, as marcas têm grande responsabilidade em promover um mercado ético. As empresas sérias devem assegurar que seus suplementos sejam fabricados dentro de boas práticas (com pureza, dose correta e sem contaminantes) e respeitem as regulações vigentes. O Código de Defesa do Consumidor exige, por exemplo, que produtos como suplementos tenham sua segurança garantida e informações claras e verdadeiras sobre ingredientes, benefícios e possíveis riscos.
Cumprir essas normas não é apenas uma obrigação legal, mas demonstra respeito ao público. Marcas comprometidas investem em pesquisa científica, testam seus produtos clinicamente quando possível e comunicam resultados de forma transparente, sem exageros de marketing. Essa postura responsável constrói credibilidade e beneficia o consumidor, que pode identificar empresas confiáveis e fazer escolhas com embasamento. Em suma, quando o mercado de suplementos opera com honestidade e foco na saúde do usuário, todos ganham: o consumidor colhe resultados reais com segurança, e as empresas conquistam confiança e longevidade no setor.
*Renato Carvalho é CEO da Relaxmedic.
*Dra. Eleonora Stocchero Fonseca é médica no Centro Médico Viver Melhor.
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