Mesmo sendo da terceira geração da família, Pipponzi não assumiu nenhum posto de comando ao entrar na empresa, em 1977. E isso ele compartilha como lição para a nova geração (Antônio Pipponzi/Divulgação)
Repórter
Publicado em 4 de maio de 2025 às 08h01.
“Não é um livro sobre mim. É um legado familiar e empresarial.” É assim que Antônio Carlos Pipponzi define Transitando entre Gerações, obra lançada no final de abril, mês em que ele anuncia sua saída da presidência do conselho da RD Saúde — após quase cinco décadas à frente da empresa.
Neto do fundador da Droga Raia, criada em 1905 no interior paulista, Pipponzi foi o principal responsável pela transformação da rede familiar em uma gigante do varejo farmacêutico nacional, com mais de 3.200 lojas e receita bruta de R$ 41,8 bilhões em 2024.
Hoje, um dos seus maiores desafios está em formar sucessores - sem perder a cultura, a unidade e o propósito da companhia.
Mesmo sendo da terceira geração da família, Pipponzi não assumiu nenhum posto de comando ao entrar na empresa, em 1977. Começou do zero: visitava unidades, treinava equipes, informatizava estoques e até escrevia manualmente livros fiscais. “Eu fazia de tudo”, lembra.
Nos anos 1980, liderou uma revolução silenciosa ao digitalizar os processos e automatizar os pontos de venda — inovações inéditas no varejo da época. Depois, promoveu uma virada cultural: substituiu balconistas comissionados por jovens de primeiro emprego, com foco no atendimento ao cliente. “Nosso diferencial é a cultura. Cultura não se impõe, cultura se vive.”
Ao contrário dele próprio, que entrou por acaso no negócio, os membros da quarta geração da família seguiram um roteiro rigoroso criado por Pipponzi. A trilha de sucessão levava até oito anos e incluía:
A meta não era apenas formar herdeiros, mas garantir vocação. “Não bastava ter o sobrenome. Eles precisavam provar que estavam preparados — e que queriam estar ali.”
Durante a fase de crescimento acelerado e da entrada de fundos como o Gávea e o family office da Natura, Pipponzi admite ter cometido um erro: “Escutamos demais a nova geração e esquecemos um pouco da nossa história. A tentativa de modernizar foi legítima, mas cultura, quando se afasta da essência, cobra seu preço.”
O aprendizado o ajudou a equilibrar a chamada ambidestria organizacional — a capacidade de preservar o legado e inovar ao mesmo tempo. “Tive humildade para continuar aprendendo, inclusive com os mais jovens.”
Após a fusão entre Raia e Drogasil, em 2011, ele assumiu a presidência do conselho e seguiu sua missão de manter o negócio unido — cultural e estrategicamente. “Conselho não é só compliance. É cultura, é futuro.”
Durante a pandemia, a RD reforçou o caixa, acelerou o teleatendimento e doou R$ 25 milhões a hospitais. No mesmo período, o Instituto MOL, liderado por seu filho Rodrigo, também ganhou destaque ao fortalecer a governança no terceiro setor.
Ao ser questionado sobre o principal conselho para quem lidera empresas familiares, Pipponzi não fala sobre finanças, sucessão ou expansão. “O maior desafio é manter o sonho coletivo vivo”, afirma.
A liderança, para ele, deve conciliar gerações, proteger a cultura e construir pontes — mesmo em momentos difíceis, como a própria saída do cargo de CEO. “Foi duro. Mas era o melhor para a empresa. E eu continuo aprendendo, mentorando e viajando. Em 10 anos, quero ter ainda mais repertório do que tenho neste livro.”
A RD Saúde, holding que reúne as marcas Droga Raia e Drogasil, lidera o mercado brasileiro de varejo farmacêutico, com uma participação de mercado de aproximadamente 17% e mais de 3.000 lojas em operação em todos os estados do país. As principais concorrentes são Grupo DPSP (Drogarias Pacheco e Drogaria São Paulo) com mais de 1.500 lojas e Pague Menos com sede no Ceará com 1.600 lojas. A receita bruta da RD Saúde em 2024 foi de R$ 41,8 bilhões, crescimento de 15,1%.