Estados Unidos, um país de imigrantes desde a colonização (Nico De Pasquale Photography/Getty Images)
Repórter
Publicado em 25 de junho de 2025 às 18h07.
Última atualização em 25 de junho de 2025 às 21h46.
Um dos maiores medos de um imigrante é como se manter em um novo país, afinal, muitos vão sem vistos ou sem condições de se manterem por muito tempo ou arcar com um curso profissional. São nessas ‘dores’ que duas brasileiras imigrantes nos Estados Unidos estão trabalhando. Por meio de projetos sociais, elas estão "levando luz" para aqueles que decidiram traçar o mesmo caminho: o da imigração.
Uma das brasileiras é Emmanuela Palmares, que busca ajudar novos imigrantes por meio de uma ONG que criou com a mãe em Connecticut, estado que fica entre Nova York e Boston. Nascida em Belo Horizonte, Palmares chegou aos Estados Unidos aos 10 anos de idade, junto com sua família, sem documentos legais, em 1994.
“Cresci indocumentada por 12 anos. No total, foi uma jornada de 17 anos para chegar à cidadania americana com a minha família”, conta Palmares.
Durante anos, enfrentaram a dura realidade de viver como imigrantes indocumentados. Ela limpou casa, pai trabalhou na construção e com 4 anos no país, ela, junto com a mãe Célia Palmares e sua irmã, continuaram o trabalho com a limpeza de casas, e de noite a mãe, que tinha experiência com jornalismo em Minas Gerais como fotógrafa, decidiu criar em 2000 um jornal nos Estados Unidos chamado "Jornal Tribuna", o primeiro jornal bilíngue de Connecticut, com o objetivo de combater a desinformação na comunidade imigrante e proporcionar um espaço de expressão para aqueles que, muitas vezes, se sentem invisíveis.
Além do jornal, Palmares e sua mãe fundaram há 10 anos uma organização sem fins lucrativos, dedicada a apoiar imigrantes de diversas origens.
A ONG ‘New American Dream Foundation’ (Fundação Novo Sonho Americano) oferece serviços essenciais, como orientação para regularização de status, auxílio na inscrição de filhos na escola, acesso a seguros de saúde e até apoio psicológico. O trabalho desenvolvido pela fundação é baseado em um modelo de inclusão e conexão, com o objetivo de integrar os imigrantes à cultura americana, sem perder a identidade de suas raízes.
“A instituição foi inspirada nas dificuldades que eu e minha irmã passamos quando imigramos na fase da infância e adolescência de forma ilegal”, diz Palmares.
Palmares e sua irmã tiveram dificuldade, como exemplo, para acessar o ensino superior, devido à falta de programas voltados para filhos de imigrantes indocumentados. A bolsa de estudos criada pela ONG visa facilitar o acesso à educação superior para jovens imigrantes, uma das formas mais eficazes de romper o ciclo de dificuldades e ampliar as oportunidades para a próxima geração.
"A educação é a ponte entre o que eles são e o que podem se tornar. Criar bolsas de estudo para filhos de imigrantes não é apenas uma oportunidade para eles, mas uma forma de retribuir o apoio que nossa família recebeu. Eles são a geração que pode quebrar barreiras e levar seus pais e avós a um futuro mais promissor.", diz Palmares.
Emmanuela Palmares, empresária social: “A instituição foi inspirada nas dificuldades que eu e minha irmã passamos quando imigramos de forma ilegal para os Estados Unidos" (Emmanuela Palmares/Divulgação)
Com um fundo de emergência, a ONG também proporciona apoio em situações extremas, como quando famílias de imigrantes enfrentam perdas graves, como incêndios.
"Empatia é a base de tudo o que fazemos. Quando ajudamos um imigrante, estamos ajudando um ser humano que, assim como todos nós, está buscando uma chance de fazer uma vida melhor, vai muito além de simplesmente resolver um problema imediato."
A fundação de Palmares se sustenta por meio de doações privadas, permitindo que o trabalho seja realizado de forma independente e sem as limitações de recursos federais ou estaduais.
"Quando penso no futuro dos imigrantes, vejo um país ainda mais forte, mais diversificado e mais unido. Os imigrantes são uma parte fundamental da economia e da cultura americana, e nosso trabalho é garantir que eles possam alcançar seus sonhos e dar o seu melhor para a sociedade."
O trabalho das ONGs em prol do imigrante, como a de Palmares, se tornou ainda mais importante durante o novo mandato do presidente Donald Trump, que foi eleito com a promessa de realizar a maior deportação em massa da história dos EUA, visando os mais de 10 milhões de migrantes não autorizados que vivem no país. Até junho de 2025, mais de 55.764 migrantes foram detidos pelo ICE (Serviço de Imigração e Alfândega).
Após uma bem-sucedida carreira como corretora de imóveis no Brasil, a paulistana Patrícia Oliveira decidiu mudar sua trajetória e recomeçar nos Estados Unidos aos 46 anos, com o objetivo de proporcionar um futuro melhor para seus filhos.
Oliveira chegou em Nova York em 2018 com seus dois filhos gêmeos de 14 anos. "Queria oferecer uma vida cheia de oportunidades, diferente daquela que eu tive na Zona Leste de São Paulo, onde enfrentei grandes dificuldades". Hoje, um dos filhos segue a carreira no direito e o outro no setor de negócios, ambos com 100% de bolsa em universidades americanas.
Mas para conseguir esse sonho para os filhos, Oliveira não trilhou um caminho fácil. Como mãe solo e em busca de recomeço, ela encarou desafios comuns de um imigrante, e um grande desafio que ela não imaginava. Ela começou sua nova vida nos Estados Unidos trabalhando com limpeza de casas e, mais tarde, fez um transporte de aeroportos. Mas o caminho se tornou ainda mais árduo quando, em seus primeiros meses no país, foi diagnosticada com um tumor no cérebro. Uma cirurgia de emergência e um tratamento longo a ajudaram a superar essa adversidade.
Patrícia Oliveira, diretora de parcerias da Cufa: "A minha missão é garantir que outros jovens possam ter a chance que eu não tive" (Patrícia Oliveira /Divulgação)
“Consegui me tratar por meio de um plano de saúde chamado Obama Care, foram cinco anos de tratamento”, afirma Patrícia que teve que gastar toda a reserva financeira do Brasil pagando o aluguel durante dois anos sem trabalhar.
Mesmo durante o tratamento, Patrícia se reergueu e voltou a trabalhar. Comprou um carro com o qual faz o transporte de passageiros ao aeroporto até hoje e também abriu uma escola de futebol. Além desses negócios, sentiu a vontade de ajudar a comunidade imigrante e as novas gerações de brasileiros. Esse desejo a levou a contribuir para a transformação da vida de jovens em situação de vulnerabilidade e assim nasceu o projeto Mentes Expansão, que visa levar jovens da periferia de São Paulo para os Estados Unidos com 100% de bolsa para estudo.
"Durante essa imersão de 10 dias, oito jovens brasileiros selecionados terão a oportunidade de visitar instituições renomadas em Nova York, como a Universidade de Columbia, a Universidade de Nova York (NYU), o Museu Metropolitano de Arte (MET) e a Organização das Nações Unidas (ONU)", afirma.
Para realizar o projeto Mentes Expansão, Oliveira conta que a CUFA (instituição que já atua como um pilar de apoio à comunidade periférica no Brasil) está colaborando para viabilizar a viagem, mas também está sendo organizada uma vaquinha online para arrecadar fundos adicionais.
Foi esse projeto que levou ao seu envolvimento com a CUFA neste ano, durante um evento social em Nova Iorque, onde Oliveira vive com os filhos. Hoje, Oliveira faz parte da diretoria da CUFA nos Estados Unidos, focando em promover outras ações para jovens imigrantes. Um de seus maiores projetos é a organização da "Taça das Favelas" em Nova York, que reunirá times de jovens em situação de vulnerabilidade.
"O objetivo é não apenas proporcionar uma competição esportiva, mas também usar o futebol como uma plataforma para ajudar esses jovens a conquistarem bolsas universitárias e oportunidades de carreira nos Estados Unidos," diz Patrícia que lembra que seus filhos conseguiram as bolsas de estudo por meio do futebol.
“A educação e o esporte são as chaves para abrir portas, e o meu trabalho na CUFA e em outras ações sociais mostra isso de forma clara”, diz Patrícia que se inspira na própria história de imigrante e que aguarda o green card.
"Nunca desisti, e agora minha missão é garantir que outros jovens possam ter a chance que eu não tive. Porque eu sei que, com oportunidade, a vida de qualquer um pode mudar."
“Os Estados Unidos é um país de imigrantes - desde a sua origem”, afirma Vitelio Brustolin, professor de Relações Internacionais da Universidade Federal Fluminense e pesquisador da Universidade de Harvard. Segundo o especialista, a imigração por lá começou no século 17, com os colonizadores europeus, principalmente os britânicos.
Nessa fase, os empregos que mais predominavam eram agricultores, artesãos, comerciantes, ferreiros, carpinteiros e pescadores. Além disso, havia uma grande atividade na construção civil e no transporte marítimo, fundamentais para o crescimento das colônias, além do trabalho escravo, que foi fundamental para o crescimento do país.
Depois desse período, vieram mais 3 fases que foram marcadas por uma onda imigratória:
Após essas ondas imigratórias, restrições à imigração foram intensificadas, principalmente após os ataques de 11 de setembro de 2001 - mas há muitos imigrantes, inclusive brasileiros, que ainda apostam nos Estados Unidos para trabalhar e estudar.