Caso os problemas relacionados ao sono se tornem frequentes, o ideal é buscar uma ajuda profissional. (Freepik)
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Publicado em 26 de setembro de 2025 às 11h33.
Uma pesquisa da Fundação Oswaldo Cruz de 2023 revelou que 72% dos brasileiros sofrem com distúrbios do sono. O número mostra que a maioria dos trabalhadores já passou ou passa por dificuldades para ter uma noite de descanso adequada, seja por problemas para adormecer, interrupções durante a noite ou sono insuficiente.
Esse dado também reflete uma realidade que afeta diretamente a produtividade no trabalho de milhões de profissionais, que chegam às empresas sem o descanso necessário e são bombardeados com demandas apertadas, tarefas a serem entregues e decisões importantes a serem tomadas.
Para entender a importância do sono no ambiente corporativo, a EXAME conversou com dois neurologistas especialistas, que também compartilharam estratégias para minimizar os impactos de uma noite ruim.
"Uma única noite mal dormida já é o suficiente para gerar efeitos claros no desempenho profissional, mesmo que a pessoa não perceba de imediato", explica a neurologista Márcia Assis, membro da Academia Brasileira do Sono. A médica aponta que os principais sintomas incluem queda da atenção, dificuldade de concentração e lentidão para compreender instruções.
Além disso, a especialista detalha que a privação de sono compromete a memória de trabalho, causando falhas na memorização e dificuldade para organizar ideias. "Estes prejuízos na função cognitiva aumentam o risco de falhas em tarefas que exigem precisão, como cálculos, registros e manuseio de equipamentos, gerando riscos de acidentes de trabalho", alerta.
O neurologista Lucio Huebra, membro do conselho administrativo da Academia Brasileira do Sono, observa impactos ainda mais amplos. "Com a falta de sono temos uma tendência a tomada de decisões impulsivas, sem um adequado julgamento crítico, com tendência de um comportamento mais simples e acomodado", afirma. Ele destaca também que "a criatividade é muito impactada, tanto no aspecto de produção de conteúdos artísticos quanto na busca de soluções criativas para os diversos tipos de problemas".
Para dar mais dimensão ao problema, a Dra. Márcia Assis diz que estudos mostraram que ficar 17 a 19 horas acordado pode comprometer o desempenho cognitivo de forma semelhante a ter 0,05% de álcool no sangue. Esse nível se aproxima do limite legal de embriaguez em vários países, evidenciando ainda mais como o cansaço pode ser perigoso no ambiente de trabalho.
Nutricionistas e médicos do sono concordam que um café da manhã equilibrado é essencial após uma noite mal dormida. A recomendação é escolher alimentos que forneçam energia gradual: proteínas como ovos, carboidratos complexos como aveia e frutas. Essa combinação evita picos de açúcar no sangue que podem piorar o cansaço.
Vale ressaltar que mesmo sem apetite, é indicado pelo menos uma refeição leve, já que pular o desjejum pode comprometer ainda mais o metabolismo e reduzir a energia disponível para o cérebro durante a manhã.
A exposição à luz solar matinal é uma das estratégias mais recomendadas pelos especialistas. A luz natural funciona como sinalizador para o ritmo circadiano, ajudando o corpo a entender que é hora de estar alerta. Sendo assim, uma horinha de exposição ao sol da manhã já pode fazer diferença no nível de energia do dia.
Além disso, essa prática também ajuda a regular o ciclo de sono para a noite seguinte. Pessoas que têm dificuldade para adormecer se beneficiam dessa exposição matinal, que auxilia o cérebro a sincronizar os horários de sono e vigília.
"O uso de café ou outras bebidas cafeinadas pode aliviar a sonolência transitoriamente, aumentando o sistema de alerta", reconhece o Dr. Lucio Huebra. Entretanto, ele faz uma ressalva: "Pessoas têm sensibilidade diferente ao efeito da cafeína, sendo que alguns não notam uma melhora efetiva da concentração e tem aqueles que sentem maior ansiedade e irritabilidade".
Dessa forma, a indicação é perceber como o seu corpo reage ao estímulo da cafeína e sempre fazer consumo moderado, evitando exageros. O neurologista também afirma que se deve evitar a cafeína no fim da tarde ou período noturno.
"É importante ressaltar que o uso da cafeína não garante um reparo total como o de uma noite adequada de sono", alerta o médico.
Sim, tirar uma soneca durante o dia pode ser uma boa estratégia! Segundo o Dr. Lucio Huebra os "cochilos curtos podem ajudar a promover renovação de energia, maior disposição e melhora cognitiva". Entretanto, é importante se atentar que a duração ideal seria em torno de 30 minutos somente, já que esse tempo permite recuperar parte da energia sem entrar em fases profundas do sono.
Outra recomendação é que esse descanso deve acontecer antes das 15 horas para não interferir no ciclo natural do sono.
Pesquisas sobre metabolismo, incluindo um estudo publicado na Ibero-American Journal of Health Science Research, mostram que refeições pesadas aumentam a produção de melatonina, hormônio responsável pelo sono. Por isso, os nutricionistas recomendam pratos com vegetais, proteínas magras e quantidades moderadas de carboidratos complexos.
Essa escolha alimentar ajuda a manter os níveis de energia estáveis durante a tarde, período crítico para quem já está lidando com os efeitos da privação de sono.
Outro problema relacionado ao cansaço é a desidratação, que amplifica os sintomas de fadiga. Sendo assim, para aqueles que querem lutar contra o sono é importante beber água, já que a hidratação facilita a circulação sanguínea e o transporte de nutrientes, processos importantes para sustentar algum nível de alerta mental.
A dica aqui é estabelecer lembretes para beber água, uma vez que pessoas cansadas frequentemente esquecem dessa necessidade.
Os neurologistas foram firmes ao desaconselhar o uso excessivo de estimulantes. Doses altas de cafeína ou bebidas energéticas podem provocar palpitações e ansiedade, criando um ciclo que consequentemente prejudica o sono da noite seguinte.
Outro erro comum é tentar compensar a baixa produtividade trabalhando mais ou sem pausas. Os especialistas explicam que o cérebro fatigado precisa de intervalos regulares para processar informações e evitar erros que podem comprometer a qualidade do trabalho.
É importante também criar o hábito de não mexer no celular antes de dormir, pois a luz azul das telas interfere na produção natural de melatonina. Um estudo do Instituto Norueguês de Saúde Pública mostrou que uma hora de tela na cama aumenta em 59% o risco de insônia e reduz em média 24 minutos a duração do sono.
Os membros da Academia Brasileira do Sono também enfatizam que o trabalhador deve evitar tomar decisões importantes no trabalho após uma noite mal dormida, além de se distanciar de posições que podem causar acidentes, como assumir a direção de um veículo, ou manipular uma máquina perigosa.
"A privação crônica do sono aumenta risco de doenças como hipertensão arterial, obesidade e diabete", alerta a Dra. Márcia Assis. A neurologista destaca que os prejuízos ocorrem desde a primeira noite e o risco é ainda maior quando vira rotina. Por essa razão, ela recomenda priorizar a necessidade pessoal ao invés do trabalho.
"Se não dormimos adequadamente em número de horas e em qualidade de sono não teremos uma produtividade ideal. Trabalhar sem dormir é como tentar correr com pouco combustível, você até começa, mas não vai longe", exemplifica.
A quantidade ideal para adultos, segundo a médica, é de 7 a 9 horas de sono por noite, com média de 8 horas. Ela ressalta que as necessidades podem variar de pessoa para pessoa, mas a recomendação nunca é menor do que 6 horas.
Vale destacar que, caso os problemas relacionados ao sono se tornem frequentes, o ideal é buscar uma ajuda profissional.