Cristiane Souza, CEO da marca de azeite Gallo no Brasil: "A ansiedade pode ser uma armadilha para o desenvolvimento profissional. Confie no tempo certo de avançar” (Gallo/Divulgação)
Repórter
Publicado em 1 de março de 2025 às 12h54.
Última atualização em 1 de março de 2025 às 13h11.
Durante sua trajetória profissional de mais de 25 anos, boa parte na área comercial, Cristiane Souza, hoje presidente da marca de azeite Gallo no Brasil, recebeu um conselho de uma líder que a acompanha até hoje: "Espere. Nada melhor do que a empresa inteira achar que você está pronta. Quando você virar, ninguém vai questionar sua capacidade."
Na época, Cristiane ansiava por um cargo maior, mas sua líder a aconselhou a confiar no tempo certo. Essa orientação a ajudou a evitar a armadilha da ansiedade e consolidar sua ascensão profissional de forma sólida.
"A ansiedade pode ser uma armadilha. Às vezes, queremos acelerar, mas é importante que as pessoas ao redor enxerguem que estamos prontos para dar o próximo passo."
Hoje, Souza é a primeira mulher e a primeira brasileira a ocupar a presidência da Gallo no Brasil – até então foram homens, e boa parte portugueses, por seu tratar de uma empresa centenária de Portugal.
Sua trajetória, marcada por resiliência e disciplina, é um exemplo de que o crescimento profissional precisa de estratégia, tempo e, acima de tudo, muito preparo para alcançar o topo.
"Não deixe ninguém tirar você do caminho só por conta da sua condição. O potencial está dentro de você", diz Souza. Desde cedo, ela precisou buscar suas próprias oportunidades para conquistar espaço no mercado corporativo.
Nascida em Umuarama, no interior do Paraná, Souza teve uma infância simples. Perdeu o pai quando tinha apenas 11 meses, e sua mãe, muito jovem, precisou contar com a ajuda da família para se sustentar até conseguir uma vaga em um banco.
Sem acesso fácil às grandes oportunidades, Cristiane estudou em escola pública até a sétima série e, depois, contou com a ajuda da tia para pagar o ensino médio. Para ingressar na faculdade, precisou recorrer a crédito estudantil e custeou parte do curso de Administração na PUC-SP com seu salário de estágio.
"Mesmo com toda dificuldade, minha mãe foi a minha maior referência. Ela me ensinou que a gente pode ser o que quiser, mas precisa construir isso," afirma a CEO.
Seu primeiro estágio foi na Ford, na área de RH, mas sua grande oportunidade veio quando uma gestora a indicou para a Unilever, na área de vendas. Sem o status de trainee, levou cerca de 5 a 7 anos para conquistar sua primeira posição de liderança dentro da empresa.
"O que te molda é a vontade de progredir. A resiliência nasce da necessidade de buscar o seu espaço," afirma Souza.
Cristiane foi promovida a diretora duas vezes após suas licenças-maternidade, o que é raro no meio corporativo. Nos últimos anos na Unilever, liderou a spin-off Compra Agora, uma distribuidora digital da empresa, e passou a gerir um negócio completo. Essa experiência foi crucial para prepará-la para assumir a presidência da Gallo no Brasil após 25 anos na Unilever.
"Quando você começa a olhar tudo dentro de uma empresa, não se encaixa mais apenas em uma função ou uma marca. Isso me preparou para assumir a Gallo no Brasil."
A Gallo enfrentou um período desafiador em 2023, devido ao aumento de preços da safra, que impactou toda a categoria de azeites. Ainda assim, manteve a liderança no segmento no Brasil. Para Cristiane, os momentos de crise também são oportunidades.
"Muitas marcas param de investir em momentos difíceis. Nós fizemos o contrário: lançamos novos produtos, apostamos em marketing e comunicamos o valor do azeite para o consumidor," afirma a CEO.
Presente em mais de 80 mercados, a Gallo tem no Brasil seu maior consumidor global, superando Portugal. Um dos principais projetos sob sua liderança foi a criação da Casa Gallo, um portfólio ampliado de produtos que inclui azeitonas, vinagres e molhos de pimenta, diversificando a atuação da marca.
"Queremos que o brasileiro compreenda melhor as diferenças entre os azeites e veja o produto como parte essencial da alimentação saudável."
A empresa também investe, desde 2024, R$ 20 milhões em comunicação para reforçar o valor da categoria premium de azeites, segmento que, no Brasil, representa apenas 7% do mercado, enquanto na Europa ultrapassa 15%.
A marca de azeites Gallo foi fundada oficialmente em Portugal, em 1919, por Victor Guedes, mas há indícios de que sua história remonte a 1860. Atualmente, a Gallo faz parte da Gallo Worldwide, uma joint venture entre a Unilever e a Sociedade Francisco Manuel dos Santos.
Com presença em mais de 40 países, a Gallo mantém sua fábrica em Abrantes, Portugal, produzindo azeites extravirgem, virgem, puro e aromatizados, além de vinagres, pimentas e azeitonas.
No Brasil, aonde chegou no início do século XX, a marca tem grande relevância: o país representa 60% do faturamento global e abriga a maior equipe da companhia, com cerca de 100 funcionários. Outros mercados importantes incluem Portugal, Polônia e Angola.
"O Brasil é o maior mercado da Gallo no mundo, superando até Portugal."
Para crescer no setor, a empresa aposta na categoria premium, ainda pouco explorada no país.
"Hoje, esse segmento representa apenas 7% do mercado, mas pode dobrar e alcançar 15%, seguindo o modelo português."
O mercado sofreu com a alta dos preços nos últimos anos, afetando as vendas. No entanto, a colheita de 2024 trouxe um alívio.
"Os preços não voltarão ao patamar de R$ 20, mas podemos esperar que fiquem entre R$ 30 e R$ 35 no segundo semestre."
Com isso, a Gallo espera um crescimento de 20% no volume de vendas em 2025 no Brasil.
Cristiane Souza é a primeira mulher e a primeira brasileira a ocupar o cargo de CEO da Gallo no Brasil. Sob seu comando, a liderança feminina na empresa já chegou a 40%, com meta de atingir 50% nos próximos anos. A Gallo também assinou o Pacto Global da ONU para empoderamento feminino.
"Quero que as mulheres vejam que é possível chegar ao topo. Contar minha história é mostrar que podemos ir longe, mesmo sem um caminho traçado desde o início," afirma a presidente.
Como líder, Souza busca construir um ambiente de autonomia para sua equipe, incentivando a inovação e o senso de dono entre os colaboradores.
"Quero deixar um legado de protagonismo. Na Gallo, cada um pode transformar seu trabalho em um grande projeto. Isso faz a diferença”, diz. “Uma das lições que eu trago comigo nesta trajetória é acreditar que é possível é o primeiro passo para destravar o impossível."