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O que há de errado nas avaliações de desempenho? Veja as 10 falhas mais comuns

Avaliações de desempenho são práticas comuns no RH, mas quando mal conduzidas, minam a confiança, a cultura e a performance

Develop high-performing employees and a leadership pipeline with a mentoring strategy in your workplace. A business development manager working in the modern office with her team is brainstorming about a business plan or strategy on a digital tablet. (Nitat Termmee/Getty Images)

Develop high-performing employees and a leadership pipeline with a mentoring strategy in your workplace. A business development manager working in the modern office with her team is brainstorming about a business plan or strategy on a digital tablet. (Nitat Termmee/Getty Images)

Da Redação
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Redação Exame

Publicado em 29 de março de 2025 às 08h09.

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Por Rogério Chér, escritor, conferencista e sócio-fundador da Devello e da Winx

Entre os processos de RH, avaliações de desempenho são uma prática comum (por vezes não tão boa) em inúmeras organizações. Apesar de seu uso recorrente, suas falhas significativas parecem mais regra do que exceção. Em vez de contribuir para acelerar a prontidão das pessoas para seus desafios atuais e futuros, em contextos de aprendizagem contínua, prejudicam o engajamento, a cultura e a retenção de talentos.

Em razão da nossa observação junto a empresas de todos os setores e portes, testemunhamos diariamente 10 grandes equívocos das avaliações de desempenho:

Vinculação direta com bônus e remuneração

A prática de vincular diretamente as avaliações de desempenho a bônus e aumentos salariais pode fazer com que os funcionários se concentrem mais em agradar aos avaliadores do que em melhorar suas habilidades e alcançar os objetivos organizacionais. Segundo Edwin A. Locke, renomado psicólogo e especialista em motivação, recompensas externas, quando mal aplicadas, podem ter um impacto negativo no comportamento, com atitudes que priorizam o curto prazo em detrimento de uma visão sustentável do negócio a longo prazo.

Apurar metas e gerenciar os programas de bonificação e participação nos resultados são ações que merecem seu lugar específico no calendário de gestão de pessoas. Apuram-se metas, distribuem-se (ou não) os bônus para, em outro momento, falarmos sobre desempenho, feedback e PDI (planos de desenvolvimento individual). Isso é mais saudável para ambientes que impulsionam desafio, aprendizagem, engajamento e alta performance.

Aspecto de tribunal, condenação e sentença

Do pior jeito possível, para muitas empresas a avaliação de desempenho é o momento para dar feedback. O único, em todo o ano! É o instante do veredicto, da sentença transitada em julgado. Não deve ser assim. Não é assim em organizações de alto rendimento.

Sabemos que não existem times ruins, mas apenas equipes mal lideradas. E lideramos mal quando tratamos feedback desse modo: o instante do ano em que dizemos, de uma só vez, tudo o que não foi dito.

Em equipes de alta performance, a liderança joga falando, fala jogando. Proporciona feedback o tempo todo: dá direção técnica aos que precisam, suporta emocionalmente aqueles com tanque de energia baixo e com envolvimento insuficiente. Ou seja, lideram!

O momento da avaliação se torna, assim, um resumo de tudo o que foi dito e vivenciado, com as devidas lições aprendidas e com as medidas pertinentes para desenvolver novas competências técnicas e comportamentais em nossas equipes.

Por não terem esse espírito, é impressionante como os processos de avaliação de desempenho deixam as pessoas exaustas, frustradas e chamuscadas. Clima, engajamento e cultura sofrem abalos e sequelas negativas. Por quê?

Quando os fóruns para as avaliações se parecem mais com "tribunais", com foco exclusivo em falhas, podem criar um ambiente de medo e insegurança. Patrick Lencioni, autor de Os 5 Desafios das Equipes, alerta que um clima de medo e culpa mina a confiança e a colaboração dentro da empresa. Em vez de melhorar, os colaboradores acabam temendo o fracasso, o que prejudica a criatividade, a iniciativa e a inovação.

O processo de avaliação deve ser encarado como uma oportunidade para o desenvolvimento, com um foco positivo e construtivo. É essencial que as avaliações promovam o aprendizado e a potência de nossos times.

Foco excessivo em feedback negativo

Outra armadilha é o maior foco em feedback negativo.

É claro que precisamos dar feedback negativo para nossas equipes! Só não podemos transformar o processo de avaliação no fórum em que “descobrimos” no que as pessoas são ruins, contamos a elas e tentaremos (porque estamos entre as “melhores empresas para se trabalhar”) consertá-las.

Daniel Pink, em seu livro Motivação 3.0, destaca que focar apenas nos erros ou áreas de melhoria pode desmotivar os colaboradores e limitar seu potencial. Por isso, o feedback deve destacar tanto os pontos fortes quanto as áreas de desenvolvimento. A abordagem deve ser orientada para soluções, permitindo que o colaborador se desenvolva a partir das críticas construtivas.

Há quem vá mais além nessa abordagem.

No livro Descubra seus Pontos Fortes, Marcus Buckingham e Donald O. Clifton defendem a ideia de que as organizações devem focar mais em desenvolver os talentos e pontos fortes, em vez de dedicar tempo excessivo a corrigir pontos fracos.

Qual é a melhor alternativa? Em vez de tentar corrigir as fraquezas, deveríamos nos concentrar em criar condições para que as forças se expandam. Ao invés de tentar melhorar tudo o que é fraco, o foco deveria estar nas capacidades naturais do indivíduo, com o objetivo de aprimorá-las para que seu desempenho seja cada vez mais eficiente. “A chave para a alta performance não é o esforço incessante para corrigir suas fraquezas, mas a descoberta de onde você é naturalmente bom e a maximização desses talentos”, completam Buckingham e Clifton.

A ideia aqui é que, ao invés de gastar energia corrigindo fraquezas, o esforço deve se voltar para a identificação e aprimoramento das áreas em que a pessoa tem aptidão natural. Ficamos melhores quando trabalhamos nossas forças. Quando os indivíduos dedicam tempo e empenho no que já fazem bem, isso não só melhora seu desempenho, mas também aumenta sua confiança e motivação.

Imagine se a avaliação de desempenho da sua empresa pudesse despertar crescentemente as pessoas para seus talentos. Imagine que os PDIs pudessem potencializar esses talentos, transformando-os em pontos fortes. Esse é o espírito!

Quando trabalhamos nossas forças, sentimos mais realização e motivação. Buscar o foco no que fazemos bem, ao invés de tentar ser bom em tudo, é a chave para o crescimento pessoal e profissional. Isso promove engajamento e alta performance.

Lembre-se: muitas organizações se tornam potenciais humanos desperdiçados. Temos a opção de não nos tornarmos uma delas.

Ausência de métricas objetivas e transparentes

A falta de métricas claras é um erro grave nas avaliações de desempenho. Avaliações subjetivas e baseadas em impressões e suposições podem levar a decisões injustas e enviesadas. Estudos de Cathy O’Neil, autora de Weapons of Math Destruction, mostram como decisões baseadas em critérios subjetivos podem reforçar preconceitos e desigualdades.

O uso de métricas objetivas, mensuráveis, ao mesmo tempo desafiadoras e atingíveis, que podem ser analisadas de forma transparente, é essencial para garantir que as avaliações sejam percebidas como justas e úteis.

Foco exclusivo nas entregas, sem avaliação dos comportamentos

Embora as entregas sejam fundamentais, elas não devem ser o único critério de avaliação. Gary Hamel, no livro Humanocracia, defende que as organizações valorizem não apenas os resultados, mas também os comportamentos que alinham os funcionários à cultura da empresa. Comportamentos como colaboração, empatia e respeito às normas culturais precisam ser considerados nas avaliações de desempenho, tanto quanto as entregas.

Integrar a avaliação de resultados com a análise dos comportamentos dos funcionários é fundamental para garantir que sejam contributivos não só para os números, mas também para a cultura organizacional.

Falta de gestão das consequências

Quando as avaliações de desempenho não são acompanhadas de consequências claras, o processo perde seu propósito. A falta de ações concretas após as avaliações pode resultar em frustração entre os funcionários e em uma sensação de que seus esforços não foram reconhecidos. Segundo Tracy Maylett, autor de Engajamento MAGIC, a falta de consequências claras pode enfraquecer o engajamento dos funcionários.

Estabelecer uma relação clara entre as avaliações e as consequências (seja de desenvolvimento ou ações corretivas) ajuda a garantir que o processo seja levado a sério e tenha impacto real.

Quem pode ter acesso aos programas de coaching e mentoring proporcionados pela organização? Quem será convidado a representar a empresa em encontros nacionais e internacionais? Quem se torna elegível a certos programas especiais de desenvolvimento para liderança? São exemplos de consequências que reafirmam o que desejamos promover entre nossos talentos.

Lembre-se: as consequências não serão iguais de uma empresa para outra. Dependerão dos desafios estratégicos do negócio e do que sua cultura precisa reafirmar como atitudes e comportamentos, a começar pela liderança. No final das contas, ter um não uma boa gestão das consequências será um símbolo coerente ou incoerente do que prometemos por meio da cultura organizacional.

Mistura entre Desempenho e Potencial

Muitas vezes, as avaliações misturam o desempenho atual com o potencial futuro dos colaboradores, o que pode resultar em avaliações confusas e imprecisas.

Jim Collins, autor de Empresas Feitas para Vencer, afirma que a verdadeira liderança é identificada pelo potencial de longo prazo, e não apenas pelos resultados imediatos.

Diferenciar claramente entre o desempenho atual e o potencial futuro pode proporcionar uma avaliação mais completa e útil para o crescimento contínuo do funcionário. Separar esses dois momentos no calendário de gestão de pessoas, todavia, simplifica o processo. Primeiro, finaliza-se a avaliação de desempenho, com os feedbacks e discussões sobre planos de desenvolvimentos individuais. Depois, abre-se a discussão sobre potencial, em que a resultante será o pipeline de sucessão, com foco prioritário em cargos mais estratégicos. Separando esses dois momentos, traremos mais qualidade para os debates e para as decisões sobre gestão de talentos.

Distância da liderança em relação à equipe

Um erro nas avaliações de desempenho é a desconexão entre líderes e suas equipes. Brene Brown, pesquisadora e autora, destaca em seus estudos que a vulnerabilidade e a proximidade emocional são essenciais para uma liderança eficaz. Quando os líderes não estão próximos o suficiente para entender as realidades de suas equipes, as avaliações se tornam superficiais e desconectadas.

Os líderes devem se envolver ativamente com suas equipes, conhecendo suas dificuldades, apoiando seu desenvolvimento e contribuindo para um ambiente de confiança.

Uso sistemático da Curva Forçada

A curva forçada, que obriga os avaliadores a classificar os funcionários de forma a se ajustarem a uma distribuição predefinida, pode gerar um clima de competitividade desnecessária e prejudicar a colaboração. Marcus Buckingham alerta que a classificação forçada não reflete a verdadeira contribuição de cada funcionário. Isso pode aumentar a percepção de um processo injusto e desmotivador.

A curva forçada, por outro lado, tem sua pertinência. Por exemplo, quando precisamos dar um choque no sistema organizacional, quando queremos desafiar o compadrio, fomentar conversas corajosas, subir a régua da performance, questionar a definição de talento dentro da organização, ou mesmo em momentos de transformação da cultura, a curva forçada serve como instrumento eficaz. Enfim, trata-se de um remédio, um antibiótico. O erro não é usá-lo, mas sim transformá-lo em “dieta regular”.

Periodicidade anual

As avaliações anuais são frequentemente ineficazes, pois os feedbacks são dados com muito tempo de atraso, tornando-os pouco relevantes. Frederic Laloux, autor de Reinventando as Organizações, argumenta que as organizações de sucesso adotam ciclos de feedback mais curtos e contínuos, o que permite ajustes rápidos e melhorias constantes.

Os clientes que observamos com melhores práticas fazem isso: um grande momento do ano em que fecham seus ciclos de feedback e PDIs, pós avaliação, com momentos frequentes de escuta contínua junto às equipes.

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