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Juliette Binoche, Glória Pires e Tainá Müller: a nova geração de diretoras no Festival do Rio

Durante o evento, que exibiu mais de 300 filmes entre os dias 2 e 12 de outubro, atrizes apostaram no estrelato atrás das câmeras e refletiram sobre o cenário das mulheres na indústria cinematográfica

A hora e a vez delas: mulheres brilham na direção no Festival do Rio (Montagem EXAME/ Christian Rodrigues)

A hora e a vez delas: mulheres brilham na direção no Festival do Rio (Montagem EXAME/ Christian Rodrigues)

Luiza Vilela
Luiza Vilela

Repórter de Casual

Publicado em 13 de outubro de 2025 às 14h43.

Última atualização em 13 de outubro de 2025 às 15h29.

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Rio de Janeiro (RJ)* - Os holofotes do cinema ainda brilham mais nos homens quando o assunto é direção. Mas nos últimos anos, as mulheres têm migrado para trás das câmeras com grandes produções nas principais mostras mundo afora. No Brasil, por exemplo, o Festival do Rio trouxe mais de 30 títulos dirigidos por elas — e entre as estreantes no cargo, nomes como Juliette Binoche, Kristen Stewart, Glória Pires e Tainá Müller se sobressaltaram.

A falta de mulheres na direção é uma realidade desde que o cinema existe, muito embora esse seja um cenário que vem mudando ao longo dos anos — mesmo que a passos lentos. De 2022 para cá, produções de sucesso dirigidas por diretoras vem ganhando mais reconhecimento internacional, caso de Ataque dos Cães, da neozelandesa Jane CampionVidas Passadas, da sul-coreana Celine Song, e de Anatomia de uma Queda, da francesa Justine Triet, ambos reconhecidos no Oscar de 2024. 

A disparidade, no entanto, ainda é evidente, sobretudo na maior premiação do cinema. Em quase um século do Oscar, somente três diretoras receberam uma estatueta pelo trabalho — Campion entre elas —, num total de 10 indicações. A cerimônia se aproxima para a 98ª edição em 2026.

Também foram poucas as diretoras que tiveram filmes lucrativos no último ano. Segundo o estudo do Centro de Estudo de Mulheres na Televisão e no Cinema, da Universidade Estadual de San Diego, só 16% dos 250 filmes de maior bilheteria mundial em 2024 foram dirigidos por mulheres.

Apesar da falta de prêmios e do pouco espaço para reconhecimento, o trabalho delas vem ganhando força nos principais festivais de cinema de todo o mundo.

Juliette Binoche estreou na direção em Cannes e trouxe seu filme para o Festival do Rio de 2025 (CHRISTIAN RODRIGUES)

Kristen Stewart fez sua estreia como diretora em Cannes, em maio deste ano, com A Cronologia da Água, adaptação do livro homônimo de Lidia Yuknavitch, assim como a já premiada Juliette Binoche, que este ano dividiu o trabalho de atuação e direção pela primeira vez em seu novo longa In-I in Motion, um documentário sobre os bastidores da peça de criou com o dançarino Akram Kram, em 2007.

"Tinha que mexer nesse material de bastidores da peça, porque ele mostra bem o que o corpo e a mente humana são capazes. Mas não sei precisar se foi uma escolha pular da atuação para a direção", disse Binoche em uma conversa com jornalistas da qual a EXAME Casual fez parte.

"Eu só sabia que queria compartilhar essa história, e que esse seria um lugar novo para mim. Eu quis testar".

Os dois filmes fizeram parte da mostra do Festival do Rio, que neste ano, entre seus 300 títulos, teve cerca de 10% dos longas-metragens dirigidos por mulheres. No caso das brasileiras, algumas delas estrearam na direção durante o evento, caso de Gloria Pires, Tainá Müller e Isis Broken.

Marianna Brennand, diretora de Manas ( Guilherme Licurgo)

Brasileiras na direção

Se no resto do mundo o trabalho na direção já é raridade entre as mulheres, no Brasil, que tem um orçamento contido para grandes produções cinematográficas, conseguir espaço na indústria neste cargo é ainda mais desafiador. Mas elas estão entrando, pouco a pouco, e fazendo barulho.

De 1961 a 1971 no Brasil, menos de 1% dos filmes eram dirigidos por mulheres, percentual que subiu para cerca de 15% entre 2001 e 2010, segundo a pesquisa global "Women in Cinema", feita pela Fapesp. Entre 1995 e 2018, elas representaram 21% dos diretores dos 240 filmes brasileiros de maior bilheteria. 

"A gente sabe que ainda existe uma disparidade muito grande na presença das mulheres na indústria cinematográfica", diz Marianna Brennand, diretora de Manas, em entrevista à EXAME Casual. "Mas, sem dúvida, é um sinal dos tempos: a cada ano a gente vem se fortalecendo e mostrando a importância da nossa voz, do nosso olhar, das nossas histórias, e o quanto elas se conectam universalmente".

Manas é um dos exemplos da voz universal das mulheres na direção. O filme estreou em Veneza no ano passado, onde recebeu o Director’s Award da mostra Giornate Degli Autori. Ao todo, já acumula mais de 20 prêmios em festivais de todo o mundo — e chegou a ter sessões para membros da Academia do Oscar mediadas por Sean Penn e Julia Roberts em setembro de 2025.

"O que mais me emociona é perceber que o filme tem despertado em muitas mulheres o desejo de se expressar, de contar suas histórias, de quebrarem seus silêncios", completa ela.

Glória Pires estreia na direção com 'Sexa' (CHRISTIAN RODRIGUES)

Os 60 anos na narrativa de Glória Pires

Na onda de expressas verdades e histórias, outro filme que marcou a estreia de uma mulher na direção no Festival do Rio foi Sexa, dirigido Glória Pires, uma produção da Giros Filmes. Há mais de cinco décadas trabalhando como atriz, a agora cineasta resolveu apostar no primeiro trabalho como diretora em uma história que conversasse com seu momento atual.

"Não desmerecendo o trabalho dos homens, mas fazer esse filme rodeada de mulheres foi uma experiência única. Porque a direção vem de um outro pensamento, é uma coisa mais reflexiva, e a nossa visão, querendo ou não, acaba sendo diferente", disse Pires. "E vejo as coisas mudando para a gente. Acredito que daqui para frente não será tão sofrido ser diretora, no sentido de você ter que ter uma batalha provar sua capacidade."

A ficção à brasileira narra a história de Bárbara (Glória Pires), que chega aos 60 anos e lida com a pressão estética e social que recai sobre as mulheres no início da terceira idade. Com um filho adulto e etarista e uma paixão mais jovem, ela se redescobre em vontades, desejos e sonhos independentemente de sua idade. O filme tem estreia prevista nos cinemas brasileiros para 11 de dezembro.

"O roteiro tem essa mulher de 60 anos bem fora do padrão, que vive um momento parecido com o que eu estou vivendo agora", pontuou a atriz. "Chega uma hora que você não tem que caber na expectativa dos outros, e foi por isso que abracei esse projeto."

Tainá Müller estreia na direção com 'Apolo' no Festival do Rio (CHRISTIAN RODRIGUES)

A família tradicional brasileira de Tainá Müller

Fora da ficção, quem também estreou na direção no Festival do Rio foi Tainá Müller, dessa vez no documentário Apolo. O longa acompanha a história de Isis Broken (também diretora do filme) e Lourenzo, um casal transexual que, após conceber um filho naturalmente durante a pandemia de covid-19, inicia uma jornada pelo Brasil em busca um novo pré-natal respeitoso e especializado.

"Sempre senti muita falta de ter uma voz própria no cinema, porque as mulheres sempre estiveram nas telas como musas — eu mesma surgi como atriz num lugar um pouco assim", disse Müller durante a estreia do filme no Cine Odeon.

"A mulher que dirige, que é roteirista e que produz é uma mulher que ousa pensar. E infelizmente, a gente andou muito, mas é um fato novo ter mulheres pensando. Vejo esse espaço da direção como algo quase sagrado e tenho a certeza de que a gente não pode arredar o pé."

Com um olhar sensível sobre as várias configurações de família e uma reflexão sobre a maternidade e paternidade de pessoas transexuais, Apolo foi o vencedor do prêmio de Melhor Documentário de Longa-metragem na Premiére Brasil. O filme estreia nos cinemas de todo o Brasil no dia 27 de novembro.

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