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Por que o café está caro?

O aumento significativo no preço da commodity 2024 não é apenas reflexo de flutuações do mercado

 (Ricardo Mendoza Garbayo/Getty Images)

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Instituto Millenium
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Publicado em 13 de fevereiro de 2025 às 11h37.

Por décadas, o café tem sido um dos pilares da economia brasileira, representando não apenas uma commodity essencial para exportação, mas também parte da identidade cultural do país. Contudo, o aumento significativo no preço do café, observado em 2024, não é apenas reflexo de flutuações do mercado, mas um alerta sobre os impactos profundos e contínuos das mudanças climáticas na agricultura.

Em 2024, o Brasil enfrentou uma das piores secas das últimas décadas, afetando diretamente as regiões produtoras de café, especialmente Espirito Santo, Minas Gerais e São Paulo, responsáveis por grande parte da produção nacional. Segundo a Confederação Nacional da Agricultura (CNA), as precipitações em algumas áreas ficaram até 40% abaixo da média histórica, comprometendo a qualidade e a quantidade da safra.

A seca resultou em perdas significativas na produção de café arábica, que depende de climas amenos e chuvas regulares. Estima-se que a safra brasileira de café em 2024 tenha registrado uma queda de 20% em relação ao ano anterior, segundo dados da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab). O impacto direto foi um aumento no preço do café em mais de 30% no mercado interno, além de elevar os custos para consumidores globais.

Os eventos climáticos extremos, como secas prolongadas e temperaturas recordes, estão cada vez mais frequentes e intensos, em linha com as previsões científicas sobre o aquecimento global. Estudos do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) apontam que o aumento da temperatura global em 1,5°C pode reduzir significativamente a área apta para o cultivo de café arábica.

No Brasil, isso significa que algumas das principais regiões produtoras podem se tornar inviáveis para o cultivo, forçando agricultores a buscar terras em altitudes mais elevadas ou adaptar-se a cultivares mais resistentes. Esse processo, no entanto, exige investimentos consideráveis, algo que pequenos produtores muitas vezes não conseguem arcar.

Além disso, a mudança nos padrões de chuva e o aumento da incidência de pragas agravam ainda mais os desafios. Essas pragas, que prosperam em climas mais quentes, têm causado prejuízos crescentes aos cafeicultores, obrigando-os a adotar métodos de controle que elevam os custos de produção.

O aumento do preço do café afeta não apenas os consumidores, mas também a economia de milhares de municípios brasileiros cuja renda depende diretamente da cadeia produtiva do café. Em um cenário de mudanças climáticas aceleradas, a insegurança econômica dos produtores pode aumentar, levando a êxodo rural e ampliação das desigualdades regionais.

Por outro lado, no mercado internacional, o aumento dos preços pode beneficiar exportadores de café em curto prazo. No entanto, a redução da oferta brasileira, que responde por mais de um terço do mercado global de café, pode abrir espaço para concorrentes, como Vietnã e Colômbia, consolidarem suas posições.

O Brasil precisa urgentemente adotar medidas de mitigação e adaptação às mudanças climáticas. Investir em pesquisas voltadas para o desenvolvimento de variedades de café mais resilientes ao calor e à seca é crucial. Além disso, políticas públicas que incentivem práticas agrícolas sustentáveis, como o uso eficiente de água e sistemas agroflorestais, podem ajudar a reduzir os impactos.

Iniciativas como a diversificação de culturas e o financiamento de sistemas de irrigação modernos também são essenciais para garantir a segurança econômica dos produtores. Por m, a inclusão do café no debate sobre créditos de carbono pode ser uma forma de financiar práticas mais sustentáveis, aproveitando o papel da lavoura no sequestro de carbono.

O aumento do preço do café em 2024 é um sintoma claro de um problema maior: as mudanças climáticas já estão afetando profundamente a agricultura brasileira. Ignorar essa realidade é comprometer o futuro de um setor vital para a economia e a cultura do país. É hora de ação coordenada entre governo, setor privado e agricultores para enfrentar os desafios impostos por um clima em transformação. O futuro do café brasileiro – e de milhões que dele dependem – está em jogo.

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