Economia

Carne e arroz estão mais baratos, mas até quando vai a queda do preço dos alimentos?

Dados do IPCA mostram que carne bovina, frutas, legumes, arroz e feijão tiveram quedas nos últimos meses; economistas analisam cenário para o segundo semestre

André Martins
André Martins

Repórter de Brasil e Economia

Publicado em 27 de agosto de 2025 às 14h54.

O preço dos alimentos no domicílio registrou queda pelo quinto mês consecutivo no Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo 15 (IPCA-15), a prévia da inflação, conforme dados divulgados na terça-feira, 26, pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). O grupo apresentou uma redução de 1,02% na prévia deste mês.

Os principais itens com redução de preços incluem a carne bovina, além de outros alimentos in natura, como frutas, legumes e grãos, especialmente o arroz.

No grupo completo de alimentos e bebidas, que inclui também os alimentos fora do domicílio, a queda foi a terceira consecutiva.

A expectativa é que a inflação de agosto dos alimentos, que será divulgado no início de setembro, também apresente deflação. Será a quinta queda consecutiva, se confirmada.

Segundo economistas ouvidos pela EXAME, a explicação para essa queda de preços está na supersafra de alguns itens, no clima e na sazonalidade. A expectativa é que os preços continuem a recuar nos próximos meses, mas em menor proporção.

"Safras boas sempre ajudam a reduzir a inflação dos alimentos. Quando o ano não enfrenta desafios climáticos, como El Niño ou La Niña, que afetam o volume e a distribuição das chuvas no Brasil, podemos observar uma inflação mais controlada nos alimentos", afirma André Braz, economista da FGV Ibre.

Julio Cesar Barros, economista do Banco Daycoval, explica que historicamente os preços dos alimentos apresentam um comportamento mais favorável no meio do ano, devido à maior oferta de diversos itens nesse período, como os produtos in natura. Ele destaca, no entanto, que a surpresa está no preço da carne bovina.

"Essa sazonalidade com queda de preços já era esperada. Contudo, as carnes vermelhas, que não seguem necessariamente essa sazonalidade, também têm apresentado queda", comenta Barros.

No caso das carnes, com recuo de 0,94% em agosto, a queda foi de 0,58 ponto percentual no IPCA-15 em relação a julho. Segundo a equipe de inflação da Warren Investimentos, isso é reflexo da desvalorização da arroba do boi em julho e meados de agosto, em um cenário de oferta mais elevada do que o esperado para este ponto do ciclo.

No grupo de alimentos in natura (-4,17% no IPCA-15 de agosto contra -1,45% em julho), o resultado reforça, mais uma vez, o caráter de queda da inflação de 2025, segundo a análise da consultoria. O grupo acumula sete leituras consecutivas de deflação desde maio, seguindo uma trajetória semelhante à do ano passado, quando o movimento se estendeu de junho a novembro.

Outros pontos de atenção são o arroz e o feijão, que apresentaram quedas mais intensas. O arroz recuou 3,12% no IPCA-15 de agosto (vs. 2,69% em julho), enquanto o feijão caiu 2,01% (vs. -1,69%). O grupo vem apresentando deflação desde novembro de 2024, sustentado por boas safras e pela normalização dos preços após as fortes chuvas que atingiram o Rio Grande do Sul em maio do ano passado.

Tarifas dos EUA vão baixar os preços da comida?

A avaliação da Warren Investimentos é de que o movimento de queda no preço dos alimentos continuará, mas com intensidade menor nos próximos meses. A expectativa é que a alimentação no domicílio termine o ano com uma alta de 4,94%, desacelerando em relação ao ano anterior.

Cesar Barros, economista do Banco Daycoval, acredita que o período mais favorável, com deflação dos alimentos, deve mudar nos próximos meses, com o retorno da inflação positiva em setembro.

"Para 2025, a expectativa é que a inflação da alimentação no domicílio encerre o ano com alta de 5,2%, desacelerando em relação à alta de 8,2% observada no ano passado", diz.

Segundo os economistas, existe a expectativa de uma redução nos preços por conta da tarifa de 50% sobre os produtos brasileiros vendidos para os Estados Unidos. Carne bovina e frutas como manga e melão ficaram de fora da lista de isenção.

A avaliação, porém, é que o efeito será secundário e limitado, uma vez que o produtor pode readequar o tamanho da sua produção.

Na avaliação de Braz, da FGV Ibre, os alimentos devem terminar o ano com uma inflação mais baixa do que inicialmente prevista. No entanto, ele ressalta que, a médio prazo, será necessário monitorar a oferta de alimentos e o clima para entender a sustentabilidade da queda dos preços.

"Não necessariamente os preços vão cair para sempre. A queda dos preços é impulsionada por uma oferta maior, mas o clima pode não ser tão favorável nas próximas safras, e precisamos acompanhar as previsões meteorológicas", afirma Braz.

O economista da FGV também destaca que os choques causados pela pandemia de Covid-19 em 2020, pela guerra entre Rússia e Ucrânia em 2022 e pelos desafios climáticos e câmbio elevado em 2024 fizeram os alimentos aumentarem mais de 50% desde 2020, enquanto a inflação geral foi de 35%. O impacto da queda vista nos últimos meses não será suficiente para recuperar completamente o poder de compra do brasileiro.

"As pessoas podem notar que alguns preços melhoraram, mas ainda estão longe dos níveis que viam há cinco anos. E, considerando que a inflação normalmente corrige os salários, se o aumento salarial foi inferior à inflação dos alimentos, isso significa que muitas famílias deixaram de consumir certos itens e não vão conseguir retomar esse consumo da noite para o dia", afirma.

Braz acredita que, a médio e longo prazo, o governo precisa investir em tecnologia, como sementes resistentes à seca, e em infraestrutura, como ferrovias e cabotagem, para garantir safras mais robustas e superar os desafios climáticos, evitando preços voláteis.

"Se o governo também investir no pequeno produtor rural, com linhas de crédito para ele, ele poderá investir em tecnologia, melhorar a produtividade e aumentar a oferta sem precisar comprar mais terras. Essas são medidas de médio a longo prazo que o governo pode tomar para melhorar a oferta de alimentos e garantir uma inflação mais baixa nesse segmento", conclui.

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