Economia

Deportações em massa de Trump podem levar inflação nos EUA de 2,5% para 4%, diz economista

Mark Zandi, economista-chefe da Moody’s, aponta que inflação provocada pelas deportações é um choque do lado da oferta, algo que a política monetária dificilmente resolverá

Militar instala arame farpado em cima de muro na fronteira entre EUA e México, perto de San Diego (Patrick T. Fallon/AFP)

Militar instala arame farpado em cima de muro na fronteira entre EUA e México, perto de San Diego (Patrick T. Fallon/AFP)

Luciano Pádua
Luciano Pádua

Editor de Macroeconomia

Publicado em 16 de agosto de 2025 às 18h22.

O atual ritmo de deportações promovido pelo governo de Donald Trump, nos Estados Unidos (EUA), pode levar a inflação no país dos atuais 2,5% para 4% já no início de 2026.

O alerta é do economista-chefe da agência de classificação de risco Moody's, Mark Zandi. Em entrevista à revista Fortune, ele associa a alta esperada nos preços — especialmente em alimentos, serviços e setores que dependem de mão de obra estrangeira — à diminuição da força de trabalho imigrante.

Para ele, a queda na oferta de trabalho simultânea à estabilidade da demanda da economia pressionará os custos — e os preços —para cima no país. Segundo a Casa Branca, 750 imigrantes são deportados diariamente dos EUA.

"A força de trabalho composta por pessoas nascidas fora dos EUA está diminuindo, e a força de trabalho total estagnou desde o início do ano", afirmou à Fortune. "Isso está provocando um aperto em vários mercados, aumentando os custos e a inflação."

Dados recentes do Departamento do Trabalho dos EUA mostram que o Índice de Preços ao Produtor (PPI) — uma medida da inflação no atacado antes que ela chegue ao consumidor final — subiu 0,9 % de junho para julho, a maior alta desde 2021, com serviços respondendo por mais de três quartos desse aumento.

A Casa Branca rejeita o vínculo entre deportações e inflação, defendendo que a política visa liberar oportunidades para trabalhadores nativos. Segundo um porta-voz, toda a criação de empregos recente tem beneficiado exclusivamente americanos nascidos no país.

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Desde que o relatório de empregos de julho surpreendeu ao mostrar criação muito baixa de vagas e fortes revisões para baixo nos meses anteriores, economistas de instituições como Morgan Stanley, Barclays e Bank of America argumentam que a desaceleração nas contratações ocorre porque a oferta de trabalho foi artificialmente reduzida pelas deportações promovidas por Trump, pelo fechamento das fronteiras e pelo que Zandi chama de “autodeportações”.

“É o fechamento da fronteira sul, são as deportações, são as autodeportações”, afirmou à Fortune. “Os imigrantes estão com medo. Estão deixando o país, não estão entrando, não estão trabalhando."

A deportação em massa e a economia

A preocupação central de Zandi foca em uma restrição na oferta de trabalho, impulsionando salários e empurrando a inflação — um fenômeno dificilmente controlável apenas via política monetária, diferente de choques de demanda tradicionais.

Ele destaca que tarifas tendem a ser choques pontuais, enquanto restrições imigratórias podem desencadear um ciclo mais persistente de custos elevados.

Economistas e instituições como Brookings e AEI já alertavam, conforme reportagens de junho, que o enxugamento da população imigrante — que em 2025 pode marcar o primeiro êxodo líquido em 50 anos — pode detonar uma onda de inflação persistente e frear o crescimento econômico.

Já o Federal Reserve de Dallas modelou cenários nos quais deportações poderiam reduzir o PIB dos EUA em até 0,8 ponto percentual, e ainda mais em caso de intensificação das ações.

Essa abordagem, centrada na oferta, difere do outro espectro dos economistas que argumentam que a redução de empregos se deve à desaceleração da demanda — empresas retraindo contratações em setores como indústria e transportes, em contexto de instabilidade.

Trump e Jerome Powell: presidente americano intensifica ataques ao chefe do Federal Reserve (Drew Angerer/Getty Images)

Por que isso importa? Dica: juros e juros

No cerne da discussão está o dilema da política monetária — hoje um dos temas de maior pressão de Trump sobre o Federal Reserve (Fed), o Banco Central dos EUA, e seu presidente, Jerome Powell, que recebe críticas públicas do presidente do país.

Se houver uma queda real na demanda por trabalho nos EUA, isso indicaria um alívio sobre os salários e a inflação. Esse cenário abriria espaço para o Fed reduzir os juros.

Se a culpa for da oferta, cortar juros não atrai trabalhadores ou resolve gargalos de produção. Mas, se o problema for demanda fraca, taxas mais baixas podem reestimular contratações.

Mas os dados mais recentes de inflação — com desaceleração nas contratações e aumento de preços — complicam esse cenário. Na avaliação do economista-chefe da Moody's, a inflação provocada pelas deportações é um choque do lado da oferta, algo que a política monetária não consegue resolver facilmente.

“A inflação do lado da demanda tem implicações diferentes para a política monetária em comparação com a inflação do lado da oferta”, disse à Fortune. “Cortes nos juros não vão trazer mais imigrantes para o país.”

 

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