Agência de notícias
Publicado em 24 de abril de 2025 às 21h09.
As tarifas globais anunciadas pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, começam a afetar empresas de diferentes setores, como as de varejo e de consumo. Nas teleconferências referentes aos resultados do primeiro trimestre, CEOs alertaram para o risco de aumento de preços, reduziram as projeções de lucros, previram fortes perdas daqui para a frente e, em alguns casos, chegaram a citar o termo ''recessão''.
A Unilever e a Nestlé registraram vendas acima do esperado nos três primeiros meses do ano, após aumentarem os preços para compensar a disparada dos custos das commodities. Ambas as empresas, que perderam participação de mercado devido à inflação durante a pandemia, disseram que os consumidores terão que arcar com parte dos aumentos, já que uma guerra comercial global e o aumento dos preços das commodities voltam a pressionar seus custos.
— Estamos tentando aplicar o máximo de reajuste possível para cobrir nossos custos, ao mesmo tempo em que levamos em conta a reação dos consumidores em um ambiente competitivo — disse o CEO da Nestlé, Laurent Freixe, em uma ligação com jornalistas. — É correto destacar o sentimento fraco do consumidor — e isso não só nos EUA, mas de forma geral.
A PepsiCo, por sua vez, reduziu sua projeção de lucro para o ano inteiro, à medida que uma política comercial imprevisível nos EUA e o sentimento negativo do consumidor aumentam os custos e afetam a demanda por seus snacks e refrigerantes.
A dona das marcas Gatorade, Lipton e Quaker agora espera que os lucros por ação em 2025 fiquem no mesmo nível de 2024, com base em moedas constantes — contra uma previsão anterior de crescimento em torno de uma porcentagem média de um dígito. A empresa ainda projeta um aumento baixo de um dígito de receita orgânica, excluindo certos itens, conforme declarou em comunicado nesta quinta-feira.
Com uma ampla variedade de produtos, de cereais matinais e sucos de frutas a salgadinhos e refrigerantes, a PepsiCo oferece um retrato da situação dos consumidores diante das políticas implementadas por Trump. A empresa também se prepara para enfrentar custos crescentes na cadeia de suprimentos, com novas tarifas dos EUA encarecendo os ingredientes.
— À medida que olhamos para o futuro, esperamos mais volatilidade e incerteza, especialmente em relação a desdobramentos no comércio global—disse o CEO Ramon Laguarta, acrescentando que a empresa trabalha para minimizar o impacto dos custos mais altos sempre que possível.
A PepsiCo registrou queda de 1,8% nas vendas do primeiro trimestre, totalizando US$ 17,9 bilhões. As vendas orgânicas, que excluem os efeitos da volatilidade cambial e aquisições, subiram 1,2%. O lucro ajustado foi de US$ 1,48 por ação, frente à média de estimativas de analistas de US$ 1,49.
Em meio à escalada da guerra comercial entre EUA e China, a farmacêutica Merck espera perder US$ 200 milhões em 2025 devido a tarifas já anunciadas. A estimativa, no entanto, não inclui a possibilidade de o presidente americano cumprir sua promessa de longa data de impor tarifas sobre importações farmacêuticas nos EUA, o que se somaria às tarifas já existentes. Isso significa que a Merck, que tem uma presença significativa de manufatura na Europa, pode enfrentar custos adicionais com novas tarifas.
No primeiro trimestre, os resultados da Merck superaram as expectativas. As vendas do trimestre foram de US$ 15,5 bilhões, acima da previsão de analistas de US$ 15,3 bilhões. O lucro ajustado foi de US$ 2,22 por ação, superando a estimativa de US$ 2,13 por ação.
Durante reunião na Casa Branca na última segunda-feira, Trump foi alertado sobre o impacto que suas tarifas estão tendo no comércio pelos CEOs do Walmart e da Target, segundo uma fonte familiarizada com o assunto.
Embora menos de um quinto das empresas do índice S&P 500 tenham realizado ''calls' sobre seus resultados até terça-feira, as tarifas foram mencionadas em mais de 90% delas, segundo a FactSet. O termo “recessão” foi citado em 44% das chamadas, contra menos de 3% nas do quarto trimestre de 2024.
A Norfolk Southern, grande empresa ferroviária dos EUA, disse na quarta-feira que as tarifas podem desacelerar os embarques de carros e contêineres intermodais, enquanto a produção de carvão pode cair “em meio a significativa incerteza quanto ao comércio de exportação”.
Já a Boeing também afirmou que a guerra comercial entre as duas maiores economias do mundo a forçará a buscar compradores alternativos para algumas de suas aeronaves destinadas à China.
As tarifas vão aumentar o custo dos geradores a gás justamente quando a demanda por eletricidade nos EUA cresce em um ritmo “sem precedentes desde o fim da Segunda Guerra Mundial”, disse John Ketchum, CEO da NextEra Energy, dona da maior concessionária de energia elétrica do país.
O fabricante de turbinas a gás GE Vernova afirmou que seus custos podem subir até US$ 400 milhões neste ano, enquanto as empresas de serviços petrolíferos Halliburton e Baker Hughes alertaram que a guerra comercial de Trump pode reduzir os lucros, atrapalhar cadeias de suprimento e derrubar os preços do petróleo, o que levaria a uma retração na perfuração.
As ações da Baker Hughes caíram 6,4% na quarta-feira após a empresa informar que as tarifas podem custar até US$ 200 milhões em lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização este ano — um impacto de cerca de 4%.
AT&T e Verizon, duas das maiores empresas de telecomunicações dos EUA, alertaram que as tarifas podem aumentar o preço de celulares e roteadores sem fio.
— Se a tarifa for tão alta quanto estão dizendo sobre os celulares, não planejamos absorver esse custo. Simplesmente não será possível — disse o CEO da Verizon, Hans Vestberg, a analistas nesta semana.
A Boston Scientific afirmou que as tarifas custarão à fabricante de dispositivos médicos cerca de US$ 200 milhões este ano, mesmo tendo elevado sua projeção de lucro. A Johnson & Johnson manteve sua previsão anual de lucros na semana passada, mas apontou US$ 400 milhões em custos relacionados principalmente a tarifas sobre dispositivos médicos.
Na China, as fábricas começaram a desacelerar a produção e a conceder licença a alguns trabalhadores, à medida que a guerra comercial iniciada por Trump reduz os pedidos de produtos, que vão desde jeans até eletrodomésticos, informa o Financial Times.
Com a maioria dos produtos chineses agora enfrentando tarifas de pelo menos 145% nos EUA, alguns donos de fábricas dizem que clientes americanos cancelaram ou suspenderam pedidos, forçando a paralisação da produção por uma semana ou mais em fábricas que produzem desde solados de sapato até jeans, tomadas elétricas e fogareiros portáteis. Alguns donos de fábricas relataram que cortaram horas extras e trabalho aos fins de semana.
Cerca de 15% de todas as exportações chinesas no ano passado foram destinadas aos Estados Unidos.