Donald Trump, presidente dos Estados Unidos, ao lado do magnata Elon Musk (Chris Unger/Reprodução)
Agência de notícias
Publicado em 20 de abril de 2025 às 10h46.
Última atualização em 20 de abril de 2025 às 10h47.
Às vezes, os bilionários que comandam o governo federal dos Estados Unidos parecem estar falando com outros bilionários.
“ESTE É UM ÓTIMO MOMENTO PARA COMPRAR!!!”, escreveu o presidente Donald Trump em suas redes sociais na semana passada, dando uma dica sobre ações que parecia ser dirigida à classe de investidores, e não aos americanos comuns que estão vendo seus investimentos em queda livre.
Howard Lutnick, o secretário de comércio, disse que sua sogra não se preocuparia se não recebesse seu cheque mensal da Previdência Social. Elon Musk, que está enxugando a equipe da Administração da Previdência Social, chamou-a de “esquema Ponzi” (outro nome para esquema de pirâmide). O secretário do Tesouro, Scott Bessent, afirmou que os americanos não estão olhando para as “ oscilações diárias” em suas economias para a aposentadoria.
E se os fabricantes de automóveis aumentarem seus preços por causa das tarifas de Trump? “Não poderia me importar menos”, disse o presidente a Kristen Welker, da NBC.
Os democratas dizem que os comentários mostram como Trump e seus amigos não têm noção da vida da maioria dos americanos e que isso é o que acontece quando os bilionários comandam a economia. Os republicanos rebatem que destacar as citações é uma escolha injusta e que, no longo prazo, todos se beneficiarão de suas políticas, mesmo que haja sofrimento agora. Os psicólogos dizem que a riqueza extrema de fato muda as pessoas e suas opiniões sobre aqueles que têm menos.
Independentemente de quem esteja certo, é seguro dizer que quase ninguém acredita que os comentários tenham sido politicamente úteis para Trump ou tranquilizadores para os americanos.
— É preciso rir para não chorar — declarou Whit Ayres, especialista em pesquisas de opinião relacionadas ao Partido Republicano.
— O que diziam sobre o antigo New York Mets? 'Ninguém aqui sabe jogar este jogo?' — disse Ayres, referindo-se ao que o técnico de beisebol Casey Stengel afirmou certa vez sobre os desafortunados Mets de 1962, e o título subsequente de um livro de Jimmy Breslin.
A Forbes estimou o patrimônio líquido de Trump em US$ 4,2 bilhões em 8 de abril, uma queda de US$ 500 milhões em relação a 2 de abril, dia em que o presidente lançou suas tarifas. A revista avaliou o patrimônio líquido de Musk, o homem mais rico do mundo, em US$ 364 bilhões em 17 de abril e o de Lutnick em US$ 3 bilhões no mesmo dia. Bessent, que já foi o principal investidor do bilionário filantropo liberal George Soros, listou ativos superiores a US$ 700 milhões em seu formulário de divulgação financeira este ano, mas acredita-se que seu patrimônio seja muito maior.
A oposição reagiu rapidamente aos seus comentários. O senador Chuck Schumer, líder da minoria, afirmou que Trump e seus amigos ricos vivem em uma “bolha de bilionários”, enquanto o Senador Bernie Sanders criticou Lutnick nas redes sociais.
“Talvez sua sogra não reclamasse se não recebesse o cheque do Seguro Social, mas dezenas de milhões de idosos que lutam para sobreviver reclamariam”, escreveu Sanders. “Quão alheio da realidade você está, para não perceber isso?”
Muito, pelo menos de acordo com as pesquisas de opinião.
— Se alguém estiver preocupado com o próprio bem-estar financeiro, acredite no que dizem — comentou Frank Luntz, líder de grupos de discussão, pesquisador e consultor de longa data, falando sobre os temores generalizados de aumento de preços e queda de ações provocados pelas tarifas de Trump. Ele disse que o presidente entendeu as ansiedades dos eleitores durante a campanha de 2024, quando prometeu repetidamente baixar os preços dos alimentos, mas parece ter se esquecido delas agora.
— Se você sabia que eles estavam passando por dificuldades em outubro, por que você não considera que eles estão passando por dificuldades em abril? — perguntou Luntz. Ele acrescentou que “a palavra que está faltando em tudo isso, da parte de Elon e do presidente, é empatia”.
Paul K. Piff, professor associado de ciências psicológicas da Universidade da Califórnia, em Irvine, estuda a psicologia dos ricos há quase duas décadas. Ele disse que a pesquisa mostra que, à medida que a riqueza de uma pessoa aumenta, na maioria das vezes a empatia e a compaixão pelos outros diminuem. Piff advertiu que há exceções e que ele não estava falando especificamente sobre os bilionários do governo Trump.
Contudo, ele afirmou que a riqueza excessiva tem efeitos profundos sobre o caráter de uma pessoa.
— Você certamente tem mais poder e mais influência sobre as pessoas em sua vida — disse ele. O dinheiro, segundo ele, "lhe dá espaço e distância das pessoas e, junto com isso, vem o aumento do foco em si mesmo. Não é difícil dizer que você perde a noção de como é a vida de muitas e muitas pessoas".
Susan Pinker, psicóloga canadense que escreveu para a coluna “Mind & Matter” do The Wall Street Journal sobre comportamento humano e anteriormente escreveu a coluna “The Business Brain” para o The Globe and Mail, disse que os ricos vivem em seu próprio mundo.
— O motivo pelo qual os super-ricos que estão à frente do governo não conseguem imaginar como as pessoas podem ficar angustiadas com algumas de suas políticas é que eles não as veem com tanta clareza — explicou.
— De uma perspectiva evolutiva, não fomos criados para nos sentirmos à vontade com todo mundo. Quanto mais forte for o grupo em que estamos inseridos, maior será a probabilidade de excluirmos os outros.
Steven Pinker, psicólogo de Harvard que é irmão de Susan Pinker, disse que não estava convencido de que os comentários dos bilionários se deviam à sua riqueza.
— Uma causa mais imediata pode ser a dissonância cognitiva — declarou ele, referindo-se ao estado psicológico que pode ocorrer quando as ações das pessoas não se alinham com suas crenças.
— No caso do governo Trump, eles não têm muita escolha a não ser se enrolar para defender o indefensável — disse Pinker.
Um porta-voz da Casa Branca, Kush Desai, falou em resposta às críticas aos comentários de Trump sobre o mercado de ações e os preços potencialmente mais altos que “o único interesse especial que orienta a tomada de decisões do Presidente Trump é o melhor interesse do povo americano — como, por exemplo, lidar com a emergência nacional imposta pelos déficits comerciais crônicos de nosso país”. As autoridades da Casa Branca também destacam que Trump prometeu não cortar os benefícios da Previdência Social.
Pesquisas recentes mostram que o índice de aprovação de Trump diminuiu desde sua posse, incluindo uma pesquisa da Quinnipiac realizada no início de abril que constatou que 53% desaprovavam Trump e 41% aprovavam. Essa foi uma mudança significativa em relação a uma pesquisa da Quinnipiac no início do governo, quando 43% desaprovavam e 46% aprovavam.
Embora a queda da popularidade de Trump nas pesquisas recentes seja semelhante à dos presidentes Joe Biden, Barack Obama e Bill Clinton neste momento de seus mandatos, ele teve uma queda acentuada no apoio entre eleitores independentes. Na recente pesquisa da Quinnipiac, 58% dos independentes desaprovaram Trump e 36% o aprovaram, em comparação com 46% que o desaprovaram em janeiro e 41% que o aprovaram.
As pesquisas não mostram o quanto a recente turbulência sobre as tarifas e o mercado de ações afetou a opinião dos eleitores sobre Trump. Porém, a pesquisadora de opinião pública relacionada ao Partido Democrata Celinda Lake disse que a maioria das pesquisas atuais atribui a Trump notas negativas em relação à sua maneira de lidar com a economia, uma fonte de sua força contra Biden durante a campanha de 2024.
Em sua visão, os comentários dos bilionários associados a Trump mostram o quanto eles conversam entre si.
— Eles jogam golfe com bilionários, jantam com bilionários, vão a Mar-a-Lago — disse ela.
— Quando foi a última vez que algum deles comprou uma dúzia de ovos ou um litro de leite?
Ou, como Trump disse ao iniciar um jantar em Mar-a-Lago com amigos depois que seus cortes de impostos se tornaram lei em dezembro de 2017:
— Todos vocês acabaram de ficar muito mais ricos.