Economia

PIB da Indústria cresceu 3,3% em 2024. O Brasil está se reindustrializando?

Resultado foi impulsionado pela recuperação da indústria de transformação, que cresceu 3,8%, o que é positivo, mas ainda não indica uma reindustrialização em curso

Recuperação da indústria de transformação foi puxada, principalmente, pela produção das categorias de bens de capital e de bens de consumo duráveis, que tiveram alta, respectivamente, de 9,1% e 10,6% em 2024 (José Paulo Lacerda/CNI/Divulgação)

Recuperação da indústria de transformação foi puxada, principalmente, pela produção das categorias de bens de capital e de bens de consumo duráveis, que tiveram alta, respectivamente, de 9,1% e 10,6% em 2024 (José Paulo Lacerda/CNI/Divulgação)

Publicado em 8 de março de 2025 às 08h00.

A recuperação das indústrias de construção civil e transformação ajudou a compor o resultado positivo do Produto Interno Bruto (PIB) da indústria geral divulgado nesta sexta-feira, 7, pelo Sistema de Contas Nacionais Trimestrais do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). A categoria encerrou o ano passado com um crescimento de 3,3%, bem acima do resultado de 2023, que foi de 1,6%.

Os resultados positivos foram espraiados por todos os segmentos, com destaques para a construção civil que, depois de uma queda de 0,5% no PIB de 2023, avançou 4,3% no ano passado. Assim como na indústria de transformação, que registrou elevação de 3,8% após dois anos seguidos de retração, de -0,5%, em 2022, e -1,3%, em  2023. Mas, afinal, esse impulso da indústria no PIB mostra que o país está se reindustrializando?

Dados compilados pelo economista e especialista em desenvolvimento econômico Paulo Morceiro ponderam que ainda é cedo para afirmar que se existe uma reindustrialização, após décadas de declínio do setor.

O levantamento mostra que a parcela da indústria de transformação no PIB a preços correntes encolheu, variando de 15,2% para 14,4% do PIB do Brasil entre 2023 e 2024. Apesar de a indústria de transformação ter superado o crescimento do PIB no ano passado, o resultado foi uma exceção nos últimos 10 anos. Antes disso, apenas em 2017, a categoria teve soma superior.

"No governo Lula 3, o crescimento médio do PIB foi de 3,3% em 2023-2024. Neste período, a indústria de transformação cresceu 1,2% (média simples 2023-2024). Portanto, não foi a indústria que puxou o PIB", destaca a análise ao sugerir que o desempenho da economia tenha sido impulsionado por outros setores.

O pesquisador associado sênior do South African Research Chair in Industrial Development da Universidade de Joanesburgo, na África do Sul, e do Núcleo de Economia Regional e Urbana da Faculdade de Economia da Universidade de São Paulo (FEA-USP) avalia como uma boa notícia a indústria de transformação ter crescido 3,8% em 2024. "Pois tem sido raro a manufatura crescer acima de 3% ao ano na última década", diz.

Alta dos bens de capital e de bens de consumo duráveis

No caso da construção civil, o IBGE atribuiu o resultado ao crescimento da ocupação na atividade, da produção de insumos típicos e da expansão do crédito. Enquanto que a recuperação da indústria de transformação foi puxada, principalmente, pela produção das categorias de bens de capital e de bens de consumo duráveis, que tiveram alta, respectivamente, de 9,1% e 10,6% em 2024.

Ao analisar os dados, a Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) observou que o desempenho de bens de capital ao longo do ano foi beneficiado pela expansão do crédito e pela recuperação da confiança dos empresários. "O que contribuiu para a retomada dos planos de investimento das empresas", destaca em nota.

A entidade também aponta para um forte crescimento da produção de veículos pesados, como ônibus e caminhões. A produção de ônibus, por exemplo, aumentou 34,7% em 2024, e a produção de caminhões avançou 40,5% no ano, segundo dados da Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea).

Na categoria de bens de consumo, a Fiesp avalia que o contexto do mercado de trabalho aquecido, com taxa de desemprego em mínimas históricas e expansão da massa salarial ampliada impulsionaram a recuperação da categoria, que refletiu numa maior produção de máquinas, aparelhos e materiais elétricos, como máquinas de lavar e fogões, além de móveis, como armários e camas.

Além disso, em comum com os bens de capital, a expansão do crédito também contribuiu para essa retomada, diz a federação industrial.

Indústria geral variou 0,3% no último trimestre

Por outro lado, a comparação do quarto trimestre de 2024 do IBGE sinalizou uma desaceleração da atividade econômica, após crescimento de 1,0%, 1,3% e 0,7% no primeiro, segundo e terceiro trimestres, respectivamente.

A indústria geral variou 0,3%, repetindo o destaque na Construção (2,5%), nas Indústrias de Transformação (0,8%) e nas Indústrias Extrativas (0,7%). Já a atividade de Eletricidade e gás, água, esgoto, atividades de gestão de resíduos, que no acumulado do ano cresceu 3,6%, registrou queda de -1,2%.

Especialistas apontam risco de desaceleração da indústria em 2025

O resultado indica que, em 2025, o quadro de desaceleração do PIB deve seguir, afirma a Fiesp. "Devido, em grande medida, à política monetária contracionista, às condições financeiras mais restritivas e ao menor impulso fiscal esperado para os próximos trimestres", aponta a Federação.

A análise é corroborada por Alex Agostini, economista-chefe da Austin Rating. "A indústria, em especial, teve um desempenho sólido [em 2024], o que é raro no Brasil. Mas agora já começa a haver uma expectativa mais negativa", diz o especialista.

"Com os juros altos, setores como bens duráveis – móveis, eletrodomésticos, eletroeletrônicos e veículos – devem sofrer mais, pois dependem muito do crédito. Como os juros devem continuar elevados, a indústria pode enfrentar dificuldades, e os serviços também devem sentir os efeitos no segundo semestre, já que têm uma relação forte com a renda", complementa.

O Comitê de Política Monetária vem intensificando o ritmo de elevação da taxa na Selic, com aumento de um ponto percentual nas duas últimas reuniões e a sinalização de aumento de mesma magnitude na reunião de março. A expectativa atual do mercado é que a Selic atinja 15% em junho e encerre 2025 no mesmo patamar.

Em nota, a Confederação Nacional da Indústria (CNI) disse que os resultados alcançados pelo setor no acumulado de 2024 se devem "às políticas voltadas para a reindustrialização", como a Nova Indústria Brasil (NIB) e ações de financiamento de entidades como BNDES e Finep.

O segmento industrial ressaltou, porém, que é preciso ter atenção com o cenário que se desenha para este ano, devido ao impacto da política monetária e de medidas protecionistas internacionais.

E cobrou do governo federal a adoção de iniciativas "que contribuam para a racionalidade dos gastos públicos, bem como que haja ⁠mais rigor nas ações de todos os poderes públicos com relação a novos gastos e custos, principalmente aqueles que possam ir na contramão do controle fiscal", afirma a CNI.

Para 2025, a Austin projeta um crescimento do PIB de 1,5%, enquanto a representação da indústria paulista mensura em 2%.

A Fiesp avalia que setores menos sensíveis ao ciclo econômico, como agropecuária e indústria extrativa, podem compensar as forças contracionistas. Como mostrou a EXAME, os economistas estimam que a safra recorde de grãos entre 2024 e 2025 deve impulsionar PIB brasileiro neste ano, após retração de 3,2% do agro.

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