Luiz Lessa, presidente do Banco da Amazônia: "Precisamos ter os instrumentos para disputar a principalidade do relacionamento com os nossos clientes" (Thiago Diniz/Banco da Amazônia/Divulgação)
Editor de Macroeconomia
Publicado em 9 de julho de 2025 às 09h50.
Última atualização em 9 de julho de 2025 às 09h58.
O Banco da Amazônia é amplamente conhecido como um banco de fomento para a região Norte do Brasil. Mas a instituição quer se consolidar como um banco comercial.
"Precisamos ter os instrumentos para disputar a principalidade do relacionamento com os nossos clientes. Com o fomento, isso não é possível, porque você faz um crédito de investimento. Se você não está no dia a dia, com os produtos e serviços bancários de dia a dia, não disputa a principalidade", diz o presidente do Banco da Amazônia, Luiz Lessa, em entrevista à EXAME.
A instituição financeira lançou novos produtos neste ano como consórcios e traz ao mercado nesta quarta-feira, 9, data em que comemora 83 anos, sua linha de "maquininhas" de pagamentos.
Para os próximos meses, irão ao mercado cartões de crédito e uma reformulação do aplicativo.
Para representar essas ambições, o banco apresentou uma nova marca. "Mais do que a mudança de símbolo, a nova marca é um símbolo de uma mudança que amplia completamente a atuação sem perder a essência do fomento", afirma Lessa.
Na conversa com EXAME, Lessa destrincha os desafios de atuar na região Norte, o racional financeiro para as mudanças recentes do banco e os planos -- e as ambições -- da instituição para a COP30, que acontece em Belém em novembro.
O Banco da Amazônia faz 83 anos, conhecido como um banco de fomento. Mas está se repaginando, o que chama a atenção, sobretudo em um ano de COP30. Qual o momento do banco?
A COP, na realidade, é um pano de fundo. Ela tem lançado luz sobre tudo o que acontece aqui na região. Vim para o banco há dois anos e, quando nós chegamos, era um banco de fomento. Mas na realidade é um banco comercial. No momento de uma COP, aí sim era um mote para a gente reativar esse banco, para que ele fosse realmente um banco comercial. Nesse ponto que começamos a desenvolver essa estratégia para, quando chegasse a COP, ter outro banco para apresentar à sociedade. Um banco comprometido com o desenvolvimento da região e melhoria da qualidade de vida das pessoas, geração de emprego e renda, mas também um banco comercial. Para isso, desenvolvemos um plano de transformação.
Qual o racional?
O grande projeto é a substituição do nosso core bancário, para ter funcionalidades de banco comercial. Isso já está em fase de implementação. Em uns seis, sete meses teremos resultados. Nesse programa de transformação para chegar na COP, um ponto importante é a marca. Nossa marca tem mais de 20 anos de estrada e, apesar de ser forte e conhecida, precisa se comunicar com o público e o mercado de hoje. Então, a atualização da marca passou a ser uma discussão para marcar esse reposicionamento do banco como 'estou de volta, rejuvenescido'. Cunhamos uma frase de efeito para isso: mais do que a mudança de símbolo, a nova marca é um símbolo de uma mudança que amplia completamente a atuação sem perder a essência do fomento.
Do ponto de vista prático, o que muda? Qual é a capacidade de competitividade do banco hoje?
Em outros bancos, a cabeça pensante não está aqui. Há uma política nacional que não necessariamente tem fit com a região. Conhecemos bem os nossos clientes e suas necessidades. Mas precisamos ter os instrumentos para disputar a principalidade do relacionamento com os nossos clientes. Com o fomento, isso não é possível, porque você faz um crédito de investimento. Se você não está no dia a dia, com os produtos e serviços bancários de dia a dia, não disputa a principalidade. A grande discussão é como disputar a principalidade. Precisamos ter um banco digital para oferecer as coisas digitalmente. Entrar no mundo digital rompe fronteiras. Vamos lançar um novo aplicativo, o que deve acontecer no final do ano. Com ele, vamos oferecer conta e serviços digitais para os nossos clientes. Isso abre um novo flanco de negócio.
Qual a expectativa com esse novo aplicativo em termos de aquisição de clientes, de aumentar essa base?
Queremos amplificar essa base de clientes no mundo digital para ser outro negócio do banco e mais uma fonte sólida de receita. Como disse, precisamos criar instrumentos da principalidade. Ou seja, produtos e serviços. Temos uma base grande de PMEs aqui, de MEIs, pessoal do MPO Urbano e Rural [programa microcrédito para empreendedores populares informais] e do Pronaf.
Um item que vai ser lançado no dia 9 de julho é a adquirência: a nossa 'maquininha' verdinha do Banco da Amazônia, com custos muito competitivos. Hoje, 3.400 clientes nossos, mesmo que não tenhamos esse produto, já são domiciliados no banco. Com essa maquininha, pretendemos não só fazer mais negócios — antecipação de recebíveis, mais negócios de crédito — mas também melhorar o lado do fomento, levando para os microempreendedores do MPO, do Pronaf, dos MEIs e dos MPEs. Uma maquininha com custos adequados para a região para que a gente possa estar na principalidade desses clientes.
Quais outros produtos vocês já lançaram?
Há duas semanas, lançamos o consórcio Banco da Amazônia, que é uma parceria com dois players do mercado, o Ferraz Consórcio e a Desbrava Veículos, no qual fizemos um modelo de negócio inovador e fizemos uma associação de balcões. Tem também o nosso cartão de crédito, que está no forno. Devemos lançar em agosto a primeira versão classic, mas logo na sequência a gente vai lançar — e aí será olhando para a COP30 — o cartão black com a pegada de sustentabilidade. É um produto que vai ser o nosso carro-chefe na COP30, juntamente com a agricultura familiar e o MPO.
Também estamos fazendo uma parceria com o fornecedor de uma plataforma de investimentos e estamos na fase de implementação. Essa plataforma vai ser mais um serviço digital que vamos oferecer para a população. Todas essas mudanças vão fazer a gente consubstanciar isso numa nova marca, que traz esse momento de virada.
Qual a lógica financeira por trás desses lançamentos?
Há dois anos, o resultado do banco era excelente, mas 90% vinha do crédito e 10% de serviços bancários. Quando comparamos a outros bancos, o crédito representa cerca de 60% do resultado. Para diminuir essa participação do crédito, tem que ter outros produtos e serviços. Em 2024, desenhamos isso tudo e neste ano estamos lançando para aumentar essa participação de produtos e serviços para dentro da nossa DRE.
No crédito, 95% do resultado vinha do Fundo Constitucional de Financiamento do Norte (FNO) em 2023. Queremos diminuir a participação do FNO. Não vamos parar de fazer FNO. Vamos continuar aplicando cada centavo. Mas precisamos construir uma carteira comercial robusta. A meta é que, dentro do resultado do crédito, 60% venha do FNO e 40%, do crédito comercial. A ideia é garantir um balanço mais robusto, sujeito a solavancos do mundo do crédito.
A região Norte tem indicadores econômicos, sociais e logísticos desafiadores. Qual a especificidade de trabalhar nela?
Temos três blocos de atuação para contribuir para o desenvolvimento da região e melhorar a qualidade de vida das pessoas. O primeiro deles é focar no CPF (MEI, microcrédito, PRONAF), sobre o qual temos estruturas de crédito – notadamente, créditos subsidiados. Mas não adianta apenas dar crédito, tem que dar assistência técnica para que elas evoluam seu negócio.
Além disso, temos muita demanda de infraestrutura, tanto social – saneamento, água, rodovia, energia elétrica – quanto infraestrutura para os negócios. Hoje, o Arco Norte escoa mais de 50% do milho produzido no Brasil e 38% da soja. O crescimento do agronegócio no Matopiba tem sido acelerado. Isso demanda investimento em infraestrutura, de armazenamento, de logística de transporte, de portos, de barcaças para transportar.
Por isso, outro pilar de atuação é em infraestrutura. Financiar, por exemplo, uma transição energética, uma ampliação de uma rede de transmissão ou de uma criação de uma usina. A gente possibilita que a indústria se instale, mas também que o produtor de açaí tenha energia elétrica para processar, congelar e ter melhor condição de comercialização.
Entre o micro e a infraestrutura, temos os hubs de desenvolvimento. A vocação do sul da região, por exemplo, é o agronegócio. O que a gente pode fazer, além de financiar a produção e financiar a infraestrutura de escoamento? Financiar a agroindústria para gerar valor agregado no local.
O que vocês querem levar à COP30 e qual a importância prática dela?
Quando se fala de COP30 e de questão climática e Amazônia, pouco se fala de como aumentar também a geração de renda e de prosperidade econômica para as pessoas que vivem na região da Amazônia Legal. Temos que aproveitar a COP. Não o evento de 12 dias, mas todos esses holofotes que a COP traz aqui para a região.
Precisamos de uma visão pragmática do que a gente quer para a Amazônia. Não dá para ter uma visão romântica de que aqui são árvores e, quando não é árvore, é aquele moço andando no barquinho no Igarapé. É bonito, mas é uma visão lúdica, romântica. São 30 milhões de pessoas que moram na Amazônia Legal. Especificamente na região Norte, 70% da população mora em 16 municípios.
O problema é urbano, de saneamento, de tratamento de resíduos sólidos. Temos de botar luz sobre isso. Isso não é mais importante do que recuperar área degradada, cuidar das árvores, mas tem que vir para a discussão. Faz parte do dia a dia de 70% da população.
Em boa medida, garantir melhores condições de vida também ajudará na questão de preservar a floresta...
Temos uma cobertura vegetal original de 85% na região Norte, mas mais de 75% da população vive em níveis de IDH inaceitáveis. Temos de fazer o equilíbrio. Essa COP tem ser sobre o equilíbrio entre preservação e a vida das pessoas que estão aqui. Quando a pessoa ganha mais renda e melhora o IDH, diminui automaticamente a pressão dela sobre os recursos naturais da floresta. Ela tem a opção de ter receita, de ter uma qualidade de vida boa, sem precisar cortar uma árvore.
Uma das principais discussões que estamos levando para a COP é a agricultura familiar. Ela também tem de deixar de ser uma coisa romântica. A agricultura familiar é um negócio difícil de fazer. Não adianta a gente fazer um assentamento, colocar as pessoas lá e dar um financiamento de Pronaf. Ela vai fazer o quê?
Qual a solução para a agricultura familiar?
Tem ser uma solução da cadeia produtiva. Não dá para fazer com todas as cadeias, mas em algumas funciona. No Acre, financiamos uma cooperativa. Ela expandiu, principalmente para o mercado externo, por causa da carne de frango que vende. Para crescer a produção, precisava de investimentos e financiamos o parque para melhorar a produção. Agora, ela precisava dos insumos, o frango precisava chegar. Desenhamos com eles que a produção dos seus insumos viria da agricultura familiar.
Montamos uma estrutura em que, com R$ 450 mil do Pronaf, conseguimos montar um módulo de granja de 27 mil pintos para o agricultor familiar. É bem razoável. A empresa vai dar a garantia de compra de 10 anos.
Então, fizemos uma solução que envolve o banco, ao resolver o problema da garantia para o investimento da agricultura familiar, e solucionou o problema de expansão de produção da empresa e criamos 80 novas pessoas de classe média na agricultura familiar. Isso é viável dentro das cadeias que a gente consegue encaixar.