Os gastos tributários são renúncias de receita pública que são concedidas através de isenções de impostos e alíquotas diferenciadas a determinados setores produtivos (Leandro Fonseca/Exame)
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Publicado em 23 de setembro de 2025 às 20h13.
Última atualização em 23 de setembro de 2025 às 20h14.
O Brasil registra gastos tributários que variam entre 4% e 6% do Produto Interno Bruto (PIB), o equivalente a aproximadamente 28% das receitas da União. Estudo do Instituto Esfera, em parceria com a Associação Brasileira da Indústria Química (Abiquim), aponta que os percentuais dos gastos superam o orçamento dos próprios ministérios ligados às atividades econômicas que são beneficiados por essa política. Somado a isso, pouco se sabe sobre a eficiência e retorno desses benefícios para os brasileiros.
Os chamados gastos tributários são renúncias de receita pública que são concedidas através de isenções de impostos e alíquotas diferenciadas a determinados setores produtivos, política muito utilizada nas principais economias do mundo. A concessão do benefício passa pela aprovação do Congresso Nacional e é sancionada pelo presidente da República.
A pesquisa aponta que, na Agricultura, por exemplo, essa renúncia de receita é cinco vezes maior que o orçamento da pasta; em Minas e Energia, quase quatro vezes; já na Saúde e na Educação, as renúncias equivalem a 0,4 e 0,2 vezes os gastos diretos, respectivamente.
Para além dos números, o diretor acadêmico do Instituto Esfera Fernando Meneguin aponta para um problema estrutural dos benefícios: a falta de governança sobre esses gastos tributários.
“A discussão sobre os gastos tributários surgiu por uma necessidade de se combater o déficit; no entanto, o que temos de perceber é que os gastos tributários são uma forma de atenuar a alta carga tributária. O problema não é a existência dos gastos tributários, mas sim a falta de transparência e de análise de eficiência deles”, comenta.
Governança
Ao comparar com outros países, o levantamento revela que os gastos tributários são um fenômeno global. Países como Suécia, Finlândia e Holanda possuem um percentual ainda maior de renúncias fiscais em relação ao seu PIB. Apesar de estar dentro dos patamares praticados por outras economias do mundo, o Brasil não trabalha com mecanismos de controle capazes de avaliar o impacto e a qualidade desses benefícios. Organismos internacionais como o Fundo Monetário Internacional (FMI) e o Banco Mundial destacam três práticas positivas para essa análise:
Transparência e avaliação: equiparar a análise de gastos tributários à de gastos diretos. Estabelecer metas claras e instituir relatórios regulares.
Revisão periódica: estipular prazos para que os benefícios expirem caso se provem ineficazes.
Critérios de eficiência e equidade: avaliar se houve cumprimento dos objetivos de forma eficiente, e se obedecem critérios de equidade social.
Legislação
Os patamares atuais devem ser revistos até o final do próximo ano, para que se mantenha a conformidade imposta pela Emenda Constitucional nº 109/2021. A legislação determina um teto de até 2% do PIB para gastos tributários a partir de 2027.
A mesma lei prevê a criação de uma Lei Geral dos Gastos Tributários (LGGT), que deveria estabelecer critérios objetivos para a concessão, avaliação e redução gradual dos benefícios. Essa regra acessória, contudo, não prosperou até os dias de hoje.
De acordo com o Instituto Esfera, uma boa política de gastos tributários seria feita nos moldes do Regime Especial da Indústria Química (REIQ). A lei que concede o benefício exige contrapartidas claras e metas de desempenho.
“A LGGT, se implementada, transformaria as renúncias fiscais em instrumentos de política pública transparentes e eficientes, com início, meio e fim”, diz o estudo.
Recorde de carga tributária
Ainda segundo as projeções do estudo, o Brasil deverá registrar, nas próximas décadas, o maior aumento de carga tributária do mundo. A projeção é que a carga tributária brasileira passe dos 34% atuais para 42,8% daqui 25 anos.
O envelhecimento populacional, que elevará os gastos com previdência e saúde, deve pressionar o sistema fiscal de forma inédita até 2050. Nesse cenário, a falta de governança sobre os gastos tributários torna-se um desafio ainda mais crítico.
“Em um futuro com alta carga tributária, a sociedade brasileira precisará de mecanismos de alívio fiscal bem calibrados, justificados por resultados claros, e não de exceções opacas e inerciais que perpetuam privilégios”, conclui a pesquisa.