Tributaristas acreditam que aplicação prática da retroatividade pode depender de regulamentação legislativa específica (Vinicius Tupinamba/Thinkstock)
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Publicado em 2 de julho de 2025 às 21h03.
Com o cabo de guerra entre governo e Congresso sobre a majoração do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF), contribuintes se perguntam sobre qual é a situação de empresas ou pessoas físicas que efetuaram pagamento do tributo no período em que vigiu uma alíquota maior.
Em 22 de maio o governo anunciou um aumento no imposto por meio de decreto, e estabeleceu elevação de alíquota para compras de dólar e de remessas de recursos para o exterior. Nos dois casos, o imposto chegou a 3,5%. A decisão, no entanto, foi revertida pelo Legislativo na semana passada, por meio de uma articulação que envolveu lideranças da Câmara dos Deputados e do Senado Federal.
Segundo a advogada Leticia Schroeder Micchelucci, sócia da área tributária do Loeser e Hadad Advogados, a sustação do decreto do Executivo pelo Congresso traz a discussão sobre a retroatividade da decisão: se ela produz efeitos ex tunc (retroativos) ou ex nunc (a partir da decisão).
“A tendência, segundo precedentes do Supremo Tribunal Federal (STF), é que a sustação de ato normativo pelo Congresso tenha efeitos retroativos, tornando nulos os efeitos dos decretos desde suas edições. No entanto, a aplicação prática dessa retroatividade pode depender de regulamentação legislativa específica ou de decisão judicial”, afirmou.
“Os contribuintes podem avaliar ingressar no Judiciário para questionar a medida em relação ao período em que ela estava vigente, não apenas em razão da elevação das alíquotas com intuito meramente arrecadatório, o que gera desvio de finalidade, mas principalmente nos casos em que houve a criação de novas hipóteses de incidência com clara ofensa ao princípio da legalidade, como é o caso da tributação de operações de antecipação de pagamentos e demais financiamentos a fornecedores, o chamado risco sacado. No regime constitucional brasileiro, a competência tributária primária é do Congresso Nacional, que a exerce em nome do povo”, avalia o mestre em direito constitucional Daniel Corrêa Szelbracikowski, que também é especialista em direito tributário.
Risco sacado
Em Florianópolis (SC), uma empresa de embalagens ingressou com mandado de segurança com o objetivo de suspender a exigência do IOF sobre operações de antecipação de recebíveis conhecidas como “risco sacado”.
De acordo com o especialista Júlio César Soares, sócio da Advocacia Dias de Souza, ações particulares ganham força argumentativa adicional com a edição do decreto legislativo.
“Se o ato presidencial for manifestamente inconstitucional, essa inconstitucionalidade, por sua vez, pode, em tese, ensejar efeitos retroativos, mas essa declaração cabe ao Judiciário, por meio de ação direta ou controle difuso”, aponta.