Julgamento deverá traçar uma linha de equilíbrio entre a soberania tributária e os compromissos internacionais assumidos pelo Brasil (ntonio Augusto/SCO/STF/Flickr)
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Publicado em 15 de março de 2025 às 07h00.
Após o pedido de vista do ministro Nunes Marques, o debate sobre a incidência de Imposto de Renda de Pessoa Jurídica (IRPJ) e Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) sobre os lucros obtidos no exterior por controladas e coligadas de empresas brasileiras tem movimentado os bastidores do Supremo Tribunal Federal.
O caso se refere, especificamente, a um mandado de segurança apresentado pela Vale, com o objetivo de afastar a incidência da “tributação automática” pelo IRPJ e pela CSLL sobre os lucros auferidos por sociedades controladas localizadas na Bélgica, na Dinamarca, em Luxemburgo e nas Bermudas. Na prática, o que está em discussão é a possibilidade de tributação, no Brasil, dos rendimentos das pessoas jurídicas, originados por empresas situadas em países onde haja acordo vigente para evitar a dupla tributação.
“Embora exista dispositivo expresso na legislação determinando a tributação dos resultados de controladas e coligadas no exterior, os acordos firmados pelo Brasil – que seguem o padrão da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) – têm um dispositivo que prevê que os lucros de uma empresa situada num dos Estados (por exemplo, na Dinamarca) só sejam tributáveis nesse Estado, inclusive no caso de estabelecimento permanente de empresa situada no outro Estado (por exemplo, no Brasil). Esse é o argumento para que, tendo tais lucros sido tributados pelas controladas no exterior, não haveria base para sua tributação no Brasil”, apontou o tributarista Fábio Lunardini, do Peixoto & Cury Advogados.
Na última sessão, realizada em fevereiro, no Plenário Virtual, pouco antes de o ministro Nunes Marques pedir vista, o placar estava 2 a 1 a favor da União, com votos de Gilmar Mendes e Alexandre de Moraes pela tributação, enquanto o relator, André Mendonça, votou pela prevalência dos tratados internacionais.
Além do impacto financeiro imediato que representa a discussão, estimado na casa dos R$ 22 bilhões, o julgamento no STF deverá traçar uma linha de equilíbrio entre a soberania tributária e os compromissos internacionais assumidos pelo Brasil.
“No caso concreto, a União sustenta que a norma questionada se sobrepõe aos tratados internacionais, garantindo a tributação universal, enquanto os contribuintes argumentam que a regra viola acordos internacionais com o quais o Brasil selou contratos de não bitributação e o princípio da isonomia tributária”, contextualiza Letícia Micchelucci, sócia da Área Tributária do Loeser e Hadad Advogados.
Anos atrás, pessoas jurídicas situadas no Brasil, que remetiam valores ao exterior a título de prestação de serviços, conseguiram decisões no Superior Tribunal de Justiça, no sentido de que tais valores, pertencendo ao prestador situado em país com Acordo de Bitributação com o Brasil, seriam tributadas apenas lá.
Já o artigo 98 do Código Tributário Nacional dispõe que os tratados e as convenções internacionais revogam ou modificam a legislação tributária interna, e serão observados pela que lhes sobrevenha.
“Caso prevaleça a tese da tributação imediata, o Brasil reforçará sua posição arrecadatória em bases universais, mas poderá comprometer a competitividade global de suas empresas. Por outro lado, se os demais ministros acompanharem o ministro relator, uma decisão favorável aos contribuintes fortalecerá o princípio da segurança jurídica e da boa-fé, deixando claro que o Brasil honra com os tratados firmados e cumpre com as obrigações internacionais assumidas”, analisa o advogado Thulio Alves, tributarista do Loeser e Hadad Advogados.