Especialistas avaliam o impacto da Reforma do Imposto de Renda a longo prazo (Marcelo Cabral/Agência Brasil)
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Publicado em 6 de outubro de 2025 às 13h15.
O projeto da reforma do Imposto de Renda (IR), aprovado pela Câmara dos Deputados na última quarta-feira (1º), não deve ter impactos duradouros na carga tributária dos trabalhadores, de acordo com especialistas ouvidos pela Esfera Brasil.
O projeto prevê que rendas mensais de até R$ 5.000 fiquem isentas de pagamento de imposto, beneficiando trabalhadores de menor renda. Também consta no texto a redução parcial de tributação para quem ganha entre R$ 5.000 e R$ 7.350, valor da faixa intermediária.
“A medida é vista como uma vitória política, pois reduz a carga sobre trabalhadores de renda menor. Porém, é uma cortina de fumaça. Os gastos desenfreados do governo federal e a ausência de uma política séria de correção das tabelas de isenção, apesar de prevista a implementação, ocasionará a corrosão das isenções em pouco tempo. A Reforma Tributária que já se avizinha trará uma tributação maior, especialmente, para o setor de serviços. Isto consolida o Brasil na posição que já ostenta há bastante tempo, dos países com a maior tributação do mundo”, afirmou Joaquim Rolim Ferraz, sócio do Juveniz Rolim Ferraz Advogados.
Perda de arrecadação
Ele alerta para o perigo do déficit orçamentário dos cofres públicos. “Não há eficiência da máquina pública, não há qualidade dos serviços públicos e há um gasto desenfreado dos recursos públicos. O futuro tributário do Brasil caminha para um colapso, infelizmente".
O atual limite de isenção para os brasileiros é de quem ganha até dois salários mínimos e, para quem ganha acima desse valor, são cobradas alíquotas de até 27,5%. Para compensar a perda de arrecadação, a proposta institui alíquota mínima de até 10% para quem tem renda elevada. No modelo, contribuintes que já pagaram mais de 10% não teriam cobrança adicional.
Por exemplo, quem obteve renda anual acima de R$1,2 milhão e pagou menos de 10% terá que pagar a diferença para alcançar esse patamar.
A advogada Daniela Poli Vlavianos, do escritório Arman Advocacia, elogia a medida, mas ressalta a temporalidade da isenção do IR para a faixa salarial proposta.
“Os impactos fiscais tendem a ser positivos e materialmente relevantes no curto e médio prazos. Projeções indicam ganho de arrecadação com a combinação ‘imposto mínimo + tributação de dividendos’; estimativas reportadas mencionam bilhões de reais por ano em receitas adicionais e até uma sobra orçamentária ao fim do período de transição, a depender da versão final aprovada pelo Congresso. Quanto à desigualdade, a incidência mínima pessoal sobre altos rendimentos, somada à taxação de dividendos, reduz a regressividade do Imposto de Renda, deslocando parte do peso hoje concentrado em rendas do trabalho/formais"
Distorção tributária
De acordo com o levantamento inédito do Sindifisco Nacional lançado essa semana, com base em dados da Receita Federal, mostra que contribuintes de altíssima renda no Brasil pagam proporcionalmente menos da metade do Imposto de Renda do que a classe média desde 2009 — e que essa distorção vem crescendo ao longo dos anos. Segundo o estudo, entre 2007 e 2023, a alíquota efetiva média de IR dos super‑ricos teve queda de quase 40%.
Em 2023, contribuintes com renda mensal superior a 320 salários mínimos pagaram 4,34% de alíquota efetiva sobre sua renda anual de cerca de R$ 5 milhões. Já aqueles com renda entre cinco e 30 salários mínimos mensais, foram tributados em 9,85% — mais que o dobro dos super‑ricos.
Em 2007, essas faixas tinham percentuais próximos: 6,9% para os mais ricos e 6,3% para a classe média — o que indica que a diferença surgiu ao longo da última década e meia.
Uma parte expressiva da renda dos mais ricos provém de lucros e dividendos, que possuem tributação isenta. Esse tipo de ganho tem crescido e se intensificou após a pandemia de Covid-19. Nesse período, os lucros das empresas cresceram mais que outras rendas: de 2020 a 2023, os lucros e dividendos aumentaram 43% e as rendas totais cresceram 31%.
“A própria exposição de motivos governamental e a página oficial sobre a reforma do imposto de renda destacam que a justiça tributária no topo depende de tributar lucros e dividendos hoje isentos, razão pela qual a manutenção do art. 10 da Lei 9.249/1995 (que diz que os lucros ou dividendos pagos ou creditados a sócios pela pessoa jurídica são isentos da incidência do imposto de renda) sem ajustes tende a reabrir a distorção com o tempo. Mecanismos automáticos devem vir acompanhados de avaliação de impacto e relatórios anuais de efetividade remetidos ao Congresso”, destaca Daniela Poli Vlavianos.
A tabela progressiva do IR não é atualizada desde 2015, para acompanhar a inflação. Com isso, trabalhadores e assalariados, mesmo sem ganho real, acabam sendo empurrados para faixas maiores de imposto. De acordo com o estudo, para as rendas da classe média, isso implica que a alíquota efetiva média sobe com o tempo, enquanto para os super‑ricos as brechas e isenções fazem com que ela caia.