O empregador deve equilibrar a necessidade de acompanhar a produtividade com o respeito à privacidade e à saúde mental dos empregados (Divulgação: Jasmin Merdan/Getty Images)
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Publicado em 16 de setembro de 2025 às 21h11.
A demissão em massa de funcionários do Banco Itaú gerou discussões sobre até onde vai o poder das empresas em monitorar atividades de empregados em home office. A prática de coletar dados de uso de computador, cliques e abas abertas levantou questionamentos sobre a legalidade desse tipo de fiscalização e os limites entre o direito do empregador e a privacidade do trabalhador.
Especialistas afirmam que o monitoramento é permitido por lei, mas deve seguir critérios claros de transparência e proporcionalidade. Segundo o advogado trabalhista Pedro Maciel, sócio da Advocacia Maciel, a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) reconhece o teletrabalho e prevê duas modalidades: por jornada ou por tarefa.
“No caso do teletrabalho por jornada, cabe ao empregador adotar sistemas para controlar o início e o fim da jornada, inclusive para eventual pagamento de horas extras. Já no regime por tarefa, não há controle de horário, apenas da entrega da produção”, explica. Ele lembra que a legislação não define ferramentas específicas de monitoramento, mas impõe que a carga de trabalho não ultrapasse os limites contratados.
O desafio, na prática, está na fronteira entre o dever de fiscalização e o risco de abusos. Com a popularização do home office, sobretudo após a pandemia, surgiram problemas ligados à chamada hiperconectividade. “Muitos trabalhadores permanecem sempre conectados, o que pode levar a crises de ansiedade e até burnout. O direito à desconexão precisa ser respeitado, assim como acontece no trabalho presencial. Intervalos e o fim da jornada não podem ser ignorados”, alerta Maciel.
Transparência
Do ponto de vista digital, a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) também impõe limites. Para o advogado Luiz Augusto D’Urso, especialista em Direito Digital, a transparência é a chave. “O monitoramento em home office é permitido, desde que o funcionário seja avisado sobre quais dados são coletados, quais aplicativos são usados e até onde vai essa fiscalização. A partir do momento em que há comum acordo e clareza, não há conflito com a lei”, explica.
Outro ponto sensível está na escolha das ferramentas. Empresas que utilizam softwares sem certificação ou de origem duvidosa podem colocar em risco não apenas a intimidade dos funcionários, mas também os próprios dados corporativos. “É fundamental adotar aplicativos de fornecedores confiáveis e exigir que cumpram rigorosamente a legislação. Sem isso, tanto a empresa quanto o trabalhador ficam vulneráveis”, afirma D’Urso.
No campo judicial, informações obtidas por monitoramento também podem ser usadas em processos trabalhistas, desde que respeitem os princípios da transparência e do consentimento. Ele reforça que “se os dados foram coletados dentro dos limites comunicados previamente, podem servir como prova em litígios”. “O que não é admissível é usar informações além do combinado ou sem aviso prévio”, esclarece.
Em síntese, a lei reconhece o poder de fiscalização das empresas, mas esse poder não é absoluto. O empregador deve equilibrar a necessidade de acompanhar a produtividade com o respeito à privacidade e à saúde mental dos empregados. Como reforça Maciel, “o essencial é que os trabalhadores sejam claramente informados sobre as regras de controle para não serem surpreendidos com punições”.