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COP30: Bonn avança em transição justa, mas deixa financiamento em aberto para Belém

Reuniões preparatórias evidenciaram fraturas do multilateralismo climático e peso da ausência americana, enquanto Brasil projeta otimismo para conferência em novembro

Encerramento das conversas técnicas em Bonn: agenda pronta para Belém, mas definições sobre financiamento climático dependerão de chefes de Estado. (Lara Murilo / UNFCCC/Flickr)

Encerramento das conversas técnicas em Bonn: agenda pronta para Belém, mas definições sobre financiamento climático dependerão de chefes de Estado. (Lara Murilo / UNFCCC/Flickr)

Lia Rizzo
Lia Rizzo

Editora ESG

Publicado em 28 de junho de 2025 às 12h09.

Última atualização em 28 de junho de 2025 às 12h13.

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As negociações técnicas que se encerraram na última semana em Bonn, na Alemanha, trouxeram caminhos, mas também cristalizaram as tensões que definirão a COP30 em Belém.

Em duas semanas de conversas, o encontro revelou tanto a resiliência quanto as limitações do sistema multilateral climático, expondo as divergências fundamentais sobre financiamento e implementação que a equipe brasileira terá que administrar em novembro.

O cenário que resulta de Bonn é de um regime climático internacional funcionando, de fato, conforme pressões crescentes.

Questões geopolíticas, restrições orçamentárias e a ausência de potências tradicionais criaram um ambiente no qual mesmo avanços pontuais exigem esforços diplomaticos consideráveis.

Diagnósticos divergentes sobre os resultados

As análises após o fim das reuniões preparatórias ilustram ainda as diferentes lentes através das quais se observa o progresso nas negociações climáticas.

A delegação brasileira apresentou um balanço otimista, destacando acordos em 47 dos 49 ítens da agenda.

"Houve acordo praticamente sobre todos os temas em Bonn — objetivo global de adaptação, transição justa e diálogo sobre o balanço global", celebrou a embaixadora Liliam Chagas, negociadora-chefe do Brasil, durante a coletiva de imprensa realizada pela presidência da COP na última quarta-feira, 26.

A perspectiva contrasta com os pareceres de organizações internacionais que identificaram impasses estruturais em questões centrais.

"A questão central do financiamento climático pairou como uma sombra sobre as negociações", avaliou o WWF-Brasil em nota técnica, destacando que países desenvolvidos adotaram "posições intransigentes" enquanto aprovavam aumentos orçamentários para armamentos.

A divergência de interpretações reflete não apenas diferenças táticas, mas visões distintas sobre o que constitui progresso em um processo multilateral cada vez mais complexo.

Para a presidência brasileira, a manutenção do diálogo e a produção de textos, ainda que controversos, representa sucesso.

Já para observadores externos, a substância desses acordos permanece insuficiente diante da urgência climática.

Estratégia brasileira aposta em atores não-estatais

Diante dos impasses no financiamento público, a presidência brasileira seguiu uma abordagem pragmática através de sua quarta carta oficial, divulgada durante as negociações.

O documento estabelece uma "Agenda de Ação" que reconhece as limitações do processo formal e busca mobilizar o setor privado como protagonista na implementação climática.

"A Presidência brasileira da 30ª sessão da Conferência das Partes (COP30) reafirma o compromisso de impulsionar nosso Mutirão Global contra a mudança do clima com um apelo não apenas às Partes da UNFCCC, mas também a todos aqueles dispostos a agir decisivamente diante da urgência climática", reafirmou André Corrêa do Lago, presidente da COP30, na carta.

Conforme o texto, a estratégia brasileira baseia-se na premissa de que a transformação climática "requer ações, soluções e parcerias de toda a sociedade, para muito além dos governos nacionais".

O conceito de "mutirão" - inspirado, segundo a presidência, pela resposta coletiva às enchentes no Rio Grande do Sul em 2024 - torna-se metáfora central para uma abordagem que busca mobilizar atores não-estatais como protagonistas da implementação climática.

A carta revela ainda uma filosofia específica para contornar os impasses multilaterais:

"Em vez de simplesmente complementar as negociações, a Agenda de Ação deve implementar ativamente os compromissos acordados, com foco no Primeiro Balanço Global (GST) do Acordo de Paris".

André Corrêa do Lago e Ana Toni, respectivamente presidente e CEO da COP30, em sessão de diálogo aberto na reunião de Bonn, na Alemanha.

André Corrêa do Lago e Ana Toni, respectivamente presidente e CEO da COP30, em sessão de diálogo aberto na reunião de Bonn, na Alemanha: "Agenda de ação deve implementar ativamente os compromissos acordados, com foco no Primeiro Balanço Global (GST) do Acordo de Paris". (Rafa Neddermeyer/ COP30/Divulgação)

Financiamento expõe limites do multilateralismo

O impasse sobre financiamento em Bonn revelou fissuras profundas no sistema internacional.

A meta de US$ 300 bilhões anuais até 2035, acordada em Baku, já nasce reconhecidamente insuficiente, enquanto a retirada americana do processo climático amplia o vácuo de recursos e liderança.

Os países em desenvolvimento, articulados através do grupo Like-Minded Developing Countries, tentaram forçar discussões específicas sobre o Artigo 9.1 do Acordo de Paris — que estabelece obrigações legais para financiamento público de países desenvolvidos.

A resistência a essa agenda confirmou a persistente relutância de nações ricas em assumir compromissos mais rigorosos.

Paralelamente, as discussões sobre o objetivo aspiracional de US$ 1,3 trilhão em fluxos financeiros globais ganharam destaque em sessões paralelas.

"Não é parte formal da negociação, mas será um tema chave na COP30", observou Ana Toni, CEO da conferência, durante a coletiva de imprensa.

Transição justa como exemplo de progresso possível

O consenso entre especialistas e ambientalistas que acompanharam as reuniões foi de que o único avanço substancial em Bonn parece ter sido na agenda de transição justa, oferecendo um modelo para o que pode ser alcançado quando há convergência mínima de interesses.

Após anos de impasses, os negociadores produziram um texto informal que, embora sem status oficial, estabelece um ponto de partida tangível para novembro.

"A adoção informal de um texto sobre transição justa representa um passo fundamental, considerando que a COP29 sequer conseguiu chegar a um consenso textual", analisa Caroline Rocha, da La Clima.

"Permite que a COP30 em Belém comece com uma base de trabalho concreta, previamente conhecida pelas partes, o que pode acelerar significativamente as negociações", complementa Rocha

O progresso nessa área ilustra como questões que combinam preocupações sociais e ambientais podem encontrar maior receptividade entre diferentes blocos negociadores, especialmente quando envolvem oportunidades econômicas para setores industriais em transição.

Fim das negociações em Bonn, na Alemanha, mostrou que países em desenvolvimento insistiram em formulação que implica obrigações mais claras para transferências financeiras, enquanto nações desenvolvidas preferiram linguagem mais vaga. (Kiara Worth, UN Climate Change/Divulgação)

Adaptação revela tensões sobre soberania e recursos

As negociações sobre adaptação terminaram em deadlock (termo usado em negociações internacionais que significa impasse total ou paralisia nas discussões), exemplificando como questões técnicas se transformam em disputas políticas fundamentais.

O mundo levou uma década para estabelecer uma meta global de adaptação, mas definir indicadores de progresso e mecanismos de financiamento permanece um desafio intransponível.

O impasse central girou em torno da inclusão de "meios de implementação" (financiamento) versus "facilitadores da adaptação" nos indicadores de progresso.

Países em desenvolvimento insistiram na primeira formulação, que implica obrigações mais claras para transferências financeiras, enquanto nações desenvolvidas preferiram linguagem mais vaga.

"A adaptação climática é uma urgência, não mais uma escolha", observa Flávia Martinelli, do WWF-Brasil. "Esses indicadores são fundamentais para monitorar o avanço da implementação de ações de adaptação nos diferentes países."

O impasse culminou na produção de textos contraditórios que serão encaminhados para Belém sem tentativa de consenso.

Constrangimentos estruturais amplificam desafios

Os resultados de Bonn refletem não apenas divergências políticas pontuais, mas reconfigurações mais profundas no sistema internacional.

A ausência americana reduziu tanto os recursos disponíveis quanto a capacidade de mediação em questões técnicas, enquanto cortes orçamentários na própria ONU começam a afetar a capacidade operacional da UNFCCC.

"A preparação para a COP30 tem se mostrado particularmente desafiadora, não apenas pelos impasses internos do sistema UNFCCC, como também por transformações estruturais mais amplas, como a reconfiguração orçamentária da ONU", analisa Caroline Rocha.

"Cortes significativos e a redução de pessoal afetam diretamente a governança climática global", reflete a especialista.

Ana Toni também reconheceu essa realidade ao observar que "o clima político global se agravou muito nas últimas semanas, embora mesmo assim, o regime climático tenha funcionado em Bonn".

Belém como teste do multilateralismo climático

A COP30 herda agora uma agenda sobrecarregada. Este é o ano em que todos os países devem apresentar novas metas nacionais de redução de emissões, mas apenas 25 nações cumpriram o prazo inicial. A maioria delas países em desenvolvimento.

A presidência brasileira terá que equilibrar suas três prioridades declaradas - adaptação, transição justa e implementação do balanço global - com pressões crescentes por resultados concretos em financiamento.

Um desafio exponencializado pela necessidade de demonstrar que o multilateralismo climático pode produzir resultados substantivos mesmo em no contexto de fragmentação geopolítica. E questões operacionais domésticas também permanecem no radar.

Ana Toni lembrou que, embora aspectos como segurança e transporte tenham sido esclarecidos, as acomodações em Belém "continuam sendo um problema, especialmente no que diz respeito aos preços".

Contudo, a reiterada confiança expressa pela delegação brasileira, exemplificada na declaração deLiliam Chagas, de que "chegamos a Bonn pedindo entrega e saímos com avanços concretos", indica que o aparente desequilíbrio entre otimismo diplomático e realismo técnico pode representar uma dificuldade adicional na conferência de novembro.

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