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Crise climática e financiamento global: uma questão de escolhas, não de escassez

Dados e análises mostram que o capital global é suficiente para financiar a transição climática, mas sua mobilização exige uma redefinição de prioridades e uma abordagem estratégica de longo prazo

Na COP30 em Belém do Pará, o mundo espera avançar em financiamento climático  (Leandro Fonseca/Exame)

Na COP30 em Belém do Pará, o mundo espera avançar em financiamento climático (Leandro Fonseca/Exame)

Da Redação
Da Redação

Redação Exame

Publicado em 2 de março de 2025 às 08h00.

*Felipe Monteiro, diretor comercial e de relação com investidores da Systemica

A COP29 trouxe à tona um desafio persistente: a dificuldade em estabelecer um novo objetivo de financiamento climático que reflita a escala dos investimentos necessários para a transição energética e a mitigação das mudanças climáticas.

Essa dificuldade, no entanto, não é resultado de escassez de recursos financeiros, mas sim de uma má alocação de capital e da ausência de prioridades claras. A verdadeira questão reside na alocação ineficiente de capital, e não na sua indisponibilidade. Dados e análises mostram que o capital global é suficiente para financiar a transição climática, mas sua mobilização exige uma redefinição de prioridades e uma abordagem estratégica de longo prazo.

Segundo o Fórum Econômico Mundial, seriam necessários investimentos equivalentes a 1% do PIB global para atingir as metas climáticas estabelecidas no Acordo de Paris. No entanto, atualmente, menos de 0,1% do PIB mundial é direcionado para essa finalidade.

Em paralelo, o estoque global de ativos financeiros soma aproximadamente US$ 271 trilhões, o que representa um volume mais do que suficiente para cobrir as necessidades de investimento em sustentabilidade, estimadas em cerca de 1,4% desse total.

Em outras palavras, se investidores alocassem uma pequena fração de seus portfólios — apenas 1,4% — para iniciativas climáticas, os recursos necessários estariam disponíveis. A conclusão é clara: o desafio não é a falta de capital, mas sim sua distribuição e aplicação eficiente.

Se sabemos o que fazer, por que fazer e quanto custa fazer, o próximo passo é responder a duas perguntas: como fazer esse esforço de mudança e como financiá-lo? A questão central é: como transformar o capital disponível em investimentos reais e eficazes para a transição climática?

Em um mundo onde 1% da população detém mais da metade da riqueza planetária e no qual, especialmente após a crise de 2008, os governos estão altamente endividados, é pouco provável que o volume de recursos necessários para a transição venha dos trabalhadores, ocupados em sobreviver, ou do setor público, ocupado em rolar suas dívidas.

Diante deste cenário, a resposta exige uma reestruturação dos paradigmas econômicos e uma liderança mais assertiva do setor privado, que é o único capaz de catalisar a mudança. Empresas e gestoras de investimento precisam ir além das tradicionais métricas de risco, retorno e liquidez e integrar a dimensão do impacto positivo em seus processos decisórios. A incorporação dessa quarta dimensão é essencial para alinhar os interesses financeiros com as necessidades globais de sustentabilidade.

Nos últimos 20 anos, houve avanços significativos nessa direção. A transição energética já é uma realidade com crescimentos substanciais em energia solar e baterias, mercados de carbono foram regulamentados e compromissos de descarbonização até 2050 foram assumidos por grandes corporações e gestoras de ativos.

No entanto, em 2024, um movimento contrário começou a ganhar força, especialmente nos Estados Unidos, com a crescente resistência às práticas ambientais, sociais e de governança (ESG). Esse fenômeno, conhecido como "greenlash", ameaça reverter os progressos alcançados, ao apresentar a agenda climática como um suposto fardo econômico.

Um exemplo emblemático dessa resistência é o caso da Net Zero Asset Managers (NZAM), uma iniciativa lançada em 2020 para engajar gestores de ativos na busca por emissões líquidas zero. Apesar do compromisso inicial, em 2025 várias gestoras começaram a se retirar da iniciativa, priorizando retornos financeiros de curto prazo em detrimento dos compromissos climáticos.

Esse recuo revela uma realidade preocupante: muitos compromissos assumidos não foram genuínos. Se estas instituições não haviam entendido as implicações reais da crise climática, sua adesão a compromissos foi ilegítima. Se entenderam e ainda assim recuaram, a falha é ainda mais grave.

O debate sobre as soluções para a crise climática não deve se concentrar na negação do problema, mas em como enfrentá-lo de forma eficiente. No mercado privado, o dever fiduciário das empresas de maximizar o retorno para os acionistas não pode ser dissociado das responsabilidades socioambientais.

Até porque a mudança climática é um fator crítico de risco financeiro, e ignorá-la representa uma falha no cumprimento das obrigações fiduciárias. A integração de análises de risco climático e a internalização de externalidades negativas são passos essenciais para alinhar os interesses econômicos com as necessidades ambientais.

Não há trade-off entre os interesses econômicos e sustentabilidade. Ao contrário - não haverá futuro econômico se não houver investimentos direcionados para enfrentar a clise climática.

Segundo a consultoria Boston Consulting Group (BCG), caminhamos para um cenário de aquecimento global de 4º até o final do século, muito além da meta do Acordo de Paris.

Nesta trajetória, o PIB mundial deverá encolher 30% até 2100. Além disso, de acordo com a Confederação Nacional dos Munícipios, entre 2013 e 2022, foi registrado prejuízo de R$ 400 bilhões no Brasil devido a desastres naturais.

O caminho a seguir deve incluir a adoção de ferramentas como a precificação de carbono, a análise de cenários climáticos e a transparência na divulgação de riscos relacionados ao clima.

Além disso, políticas públicas que incentivem investimentos sustentáveis e penalizem práticas prejudiciais ao meio ambiente são fundamentais para criar um ambiente propício à transição. O setor privado, por sua vez, deve assumir um papel de liderança, mobilizando recursos e incorporando a dimensão de impacto em suas decisões estratégicas.

A crise climática exige uma resposta urgente, coordenada e eficaz. O mercado privado tem um papel central nesse processo, não apenas como fonte de financiamento, mas principalmente como agente de mudança.

Alinhar interesses financeiros com objetivos climáticos garante o enfrentamento da crise e a construção de um futuro econômico mais sustentável e resiliente. Fica evidente, portanto, que a alocação estratégica de capital é mais do que uma necessidade ambiental, é uma oportunidade econômica e uma obrigação ética para as gerações presentes e futuras.

Como dito uma vez por Barack Obama “Somos a primeira geração a sentir os efeitos da mudança climática e a última que pode fazer algo a respeito”.
Acompanhe tudo sobre:ClimaMudanças climáticas

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