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Impactos na saúde: mortes por calor extremo dobram na América Latina

Estudo Lancet Countdown de 2025 mostra que 13 de 20 indicadores de saúde bateram recordes globais e poluição do ar causada pela queima de combustíveis fósseis mata 2,5 milhões por ano

A temperatura média anual no Brasil em 2024 foi de 27°C, 1,2°C acima da média de 2001 a 2010 (Debarchan Chatterjee/NurPhoto via Getty Images/Getty Images)

A temperatura média anual no Brasil em 2024 foi de 27°C, 1,2°C acima da média de 2001 a 2010 (Debarchan Chatterjee/NurPhoto via Getty Images/Getty Images)

Sofia Schuck
Sofia Schuck

Repórter de ESG

Publicado em 29 de outubro de 2025 às 08h00.

Última atualização em 29 de outubro de 2025 às 09h47.

A poucos dias da COP30 em Belém, um novo relatório da revista The Lancet lançou um alerta: a inação frente às mudanças climáticas custa milhões de vidas todos os anos com impactos em escala na saúde e na economia. 

Desenvolvido em parceria com a Organização Mundial da Saúde, o cenário é alarmante: 13 dos 20 indicadores de ameaças à saúde monitorados atingiram níveis sem precedentes.

O retrato é um reflexo da desigualdade climática: países que enfrentam as piores consequências são justamente os que menos contribuem com as emissões e que não tem acesso a recursos para avançar na transição para uma economia de baixo carbono. 

As mortes relacionadas ao calor extremo duplicaram na América Latina desde os anos 1990, saltando de 6.400 para 13 mil óbitos anuais -- uma alta de de 103%. No Brasil, essas mortes custam US$ 5,1 bilhões por ano, refletindo um aumento de 249% em relação à década anterior.

++ Leia mais: Mudanças climáticas podem custar US$ 1,1 bilhão para os sistemas de saúde globais, revela estudo

Globalmente, a poluição do ar causada por combustíveis fósseis mata 2,5 milhões de pessoas todos os anos, enquanto a mortalidade por calor extremo atingiu 546 mil óbitos anuais e representou um salto de 23%.

Segundo os pesquisadores, há um paradoxo. Enquanto a crise climática se agrava, governos ao redor do mundo gastaram coletivamente US$ 956 bilhões em subsídios líquidos a combustíveis fósseis em 2023.

O valor significa mais de três vezes os US$ 300 bilhões anuais de financiamento climático prometidos na COP29 para mitigação e adaptação. 

"O balanço deste ano apresenta um quadro sombrio e inegável. A destruição de vidas e meios de subsistência continuará a aumentar até que se acabe com a dependência dos fósseis", destacou em nota Marina Romanello, diretora executiva do Lancet Countdown na University College London.

Recordes em efeito cascata

Em 2024, o ano mais quente já registrado, cada pessoa no planeta foi exposta a uma média recorde de 16 dias de calor extra prejudicial à saúde.

Bebês com menos de 1 ano e idosos acima de 65 anos sofreram 20 dias de ondas de calor, um aumento de 389% e 304%, respectivamente, em relação à média entre 1986 e 2005.

Somente em 2024, a poluição causada pela fumaça de incêndios florestais provocou um recorde de 154 mil mortes no mundo [/grifar e uma alta de 36%. Já o potencial de transmissão da dengue cresceu 49% globalmente desde os anos 1950.

A exposição ao calor resultou em 639 bilhões de horas potenciais de trabalho perdidas em 2024, com prejuízos equivalentes a US$ 1,09 trilhão -- quase 1% do PIB mundial. Além disso, o custo das mortes por calor em pessoas acima de 65 anos atingiu US$ 261 bilhões.

América Latina no epicentro da crise

No Brasil, o cenário também preocupa:[grifar] a temperatura média anual no país em 2024 foi de 27°C, 1,2°C acima da média de 2001-2010.

A poluição do ar matou 30 mil brasileiros em 2022, sendo 79% dessas mortes causadas pela queima dos combustíveis fósseis, enquanto o custo econômico chegou US$ 50,3 bilhões. 

As perdas no ambiente de trabalho pela alta nos termômetros somaram US$ 17,6 bilhões (0,8% do PIB) em 2024, concentradas na construção civil (34%) e na agricultura (28%).

O risco de transmissão da dengue também aumentou 108% no país desde os anos 1950.

Por outro lado, apenas 3 das 32 cidades brasileiras avaliadas têm níveis adequados de vegetação urbana, importante barreira de resfriamento. Entre 2015 e 2024, 0,9% do território nacional sofreu seca extrema todos os anos, e houve 11% mais dias com perigo de incêndio muito alto ou extremo.

Paradoxalmente, somente 58% dos estudantes de medicina e 34% de saúde pública receberam formação sobre mudanças climáticas e saúde.

Na América Latina, o risco de incêndios florestais aumentou em média 26,4%, tornando-os hoje a terceira principal causa de perda de cobertura arbórea. Os maiores saltos foram observados no Chile (+105%), Bolívia (+82%) e México (+28%).

As perdas econômicas por desastres climáticos extremos chegaram a US$ 13,6 bilhões por ano na América Latina e Caribe.

Secas e ondas de calor deixaram 123 milhões de pessoas em situação de insegurança alimentar moderada ou grave em 2023.

"O calor extremo e os incêndios florestais já não são exceções — são o novo normal. O Brasil tem papel central para liderar uma transição justa e saudável na América Latina", afirmou Stella Hartinger, diretora do Lancet Countdown Latin America.

O risco da expansão fóssil

Apesar das evidências científicas, as 100 maiores empresas de combustíveis fósseis aumentaram suas previsões de produção desde março de 2025, planejando uma escala três vezes maior do que um planeta habitável pode suportar.

Suas emissões de gases de efeito estufa podem ultrapassar os níveis compatíveis com 1,5°C quase três vezes até 2040.

"Cada real gasto em combustível fóssil é um real a menos em saúde pública. O custo de não agir é maior do que o de agir", resume Marina Romanello.

Além disso, o relatório revelou que bancos privados estão financiando a expansão: os 40 maiores credores do setor investiram coletivamente US$ 611 bilhões em 2024 -- um aumento de 29% em relação a 2023, excedendo em 15% seus empréstimos a economia verde. 

"Se continuarmos prisioneiros da dependência dos combustíveis fósseis, os sistemas de saúde e as capacidades de resposta a catástrofes não tardarão a ficar sobrecarregados, colocando ainda mais em risco a vida de 8 bilhões de pessoas", reforçou a professora Nadia Ameli, copresidente do Grupo de Trabalho da Lancet Countdown.

COP30 é oportunidade histórica

Em meio ao cenário alarmante, o relatório aponta para progressos importantes que mostram que a mudança é possível e há soluções disponíveis para evitar a catástrofe climática. O afastamento do carvão, particularmente em países ricos, evitou cerca de 160 mil mortes prematuras por ano entre 2010 e 2022 devido à redução da poluição atmosférica.

A participação de fontes renováveis no setor elétrico atingiu um recorde histórico de 12% em 2022, com a transição para energia limpa gerando empregos mais saudáveis.

Das 858 cidades que reportaram à CDP (o maior sistema voluntário de relatórios sobre mudanças climáticas do mundo) em 2024, 834 concluíram ou planejam avaliações de risco climático.

Além disso, o setor de saúde reduziu emissões de gases de efeito estufa em 16% entre 2021 e 2022.

Às vésperas da COP30, os pesquisadores acreditam que "há uma oportunidade histórica para virar o jogo e transformar a ciência em ação".

 "Conseguir uma transição que proteja a saúde, seja equitativa e justa requer unidade e esforços coordenados de todos os setores da sociedade."

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