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Katanas e a química que forjou uma sociedade

Em novo artigo da parceria Exame com Jovens Cientistas, conheça a revolução metalúrgica que transformou simples minério em símbolo cultural

A milenar arte da forja japonesa revela segredos metalúrgicos que transformaram uma nação. (Freepik)

A milenar arte da forja japonesa revela segredos metalúrgicos que transformaram uma nação. (Freepik)

Publicado em 28 de abril de 2025 às 03h05.

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*Por Enzo Santos

A katana, reverenciada como a alma do soldado, é uma espada longa e curva, conhecida mundialmente como um símbolo da cultura marcial japonesa e da classe guerreira samurai. Sua lâmina elegante, forjada com uma técnica específica, representa a precisão da arte ferreira e a personificação dos valores de honra, disciplina, respeito e lealdade, característicos da cultura japonesa.

Para além de uma simples arma, a katana era vista como uma extensão do corpo e do espírito do samurai, uma companheira leal. Entretanto, estas lâminas eram produzidas há mais de três mil anos, com bronze.

Embora não existam registros que indiquem com acurácia como elas eram feitas, a tese mais aceita é a de que os fornos utilizados para aquecimento da argila tinham a capacidade de derreter este metal. O bronze veio a ser usado antes do ferro pois é uma mistura de Cobre e Estanho, metais com menor temperatura de fundição.

Por tais motivos, as barras de bronze eram moles e facilmente perdiam o corte. Apenas 1200 anos depois, com a implementação do sistema aristocrático e do mercantilismo, no período Heian, os ferreiros japoneses tiveram acesso ao aço.

Todavia, a geologia vulcânica, predominante na ilha, impedia a obtenção natural do minério através de meios naturais, como a mineração. Isto fez com que o Japão fosse obrigado a adquirir a majoritariedade de seus minérios de seus vizinhos, a China e a Coreia.

A revolução química que mudou o jogo

O aço é uma mistura de Ferro, Carbono e partes menores de outros elementos como Silício, Enxofre e Fósforo. Os oceanos do planeta Terra, há mais de três bilhões de anos, eram ricos em ferro dissolvido.

Contudo, com o surgimento das cianobactérias, que realizam processos metabolizantes e produzem oxigênio que, quando em contato com o metal, reage, criando uma solução que mantém um corpo de chão de óxido férrico no fundo dos oceanos.

Isto posto, pensa-se que após certo tempo, estas bactérias eram envenenadas pelo próprio oxigênio que produziam, fazendo com que as quantidades de gás diminuíssem e o ferro não precipitasse da solução.

Este ciclo de acúmulo de ferro causou a formação de rochas sedimentares no fundo dos oceanos, as formações ferríferas bandadas. As rochas mais comuns no Japão são magmáticas como diorito e granito, e embora tenham óxido férrico, a concentração deste composto é muito menor.

Contudo, o clima temperado das montanhas da região fomenta a ocorrência da sedimentação destas pequenas partes de ferro, sendo levadas pelos rios, misturando-se com a areia.

Os antigos japoneses repararam que, por conta da maior densidade desta mistura, em comparação com o resto da areia, acumulava-se nos pontos em que os rios sofriam mudanças de direção ou de velocidade. Cientes deste fenômeno, os mineradores canalizaram os rios para que pudessem obter maiores concentrações do metal.

Com este novo método, era possível obter areia de ferro com até 80% do metal, sendo mais concentrado que muitos minérios de ferro de qualidade. Se esta areia for submetida a uma fonte térmica que atinja 1250°C, é possível quebrar a ligação entre o oxigênio e o ferro, a fim de obter o metal em sua forma pura. Contudo, a forma sem mistura do ferro é menos resistente que o próprio bronze.

Katanas, as espadas que forjaram um império

A fim de obter-se o ferro sem misturas, precisa-se de um meio de aquecê-lo. Coincidentemente, uma das únicas formas viáveis a época para aquecer algo era a base do carvão mineral, que se aproxima da forma mais pura de carbono.

Quando o carbono é adicionado ao ferro, uma liga extremamente resistente é formada, o aço. Para a maioria dos elementos metálicos, a formação de ligas torna-os mais resistentes por conta da variação de tamanho entre os átomos. Isto reduz a capacidade dos átomos de se deslocarem entre eles.

Após o aquecimento de todo o conteúdo, as impurezas são removidas e o resíduo é um bloco de aço da mais alta qualidade. Somente então a forja da espada tem início, sendo aquecida e martelada até ganhar o formato e a espessura de lâmina, sendo dobrada e martelada novamente.

Este processo é repetido diversas vezes para a garantia da dureza da barra e distribuição correta entre as partes do fio e do dorso. Com a barra formada, ela é coberta com uma parte grossa de argila em seu dorso e uma camada mais fina no fio.

Isto é feito com intuito de levá-la à têmpera, processo no qual a barra é submetida a altas temperaturas e, posteriormente, é submersa em água fria, causando um choque térmico que, devido a argila, faz com que os átomos de Carbono que estão na região menos coberta resfriem mais celeremente, tendo menos tempo para abandonar a liga, mantendo sua rigidez.

Já a região mais coberta sofre o efeito contrário, o refrigeramento mitigado daquela liga causa uma maior evasão do gás, que define uma menor dureza do material. Assim, a espada tem sua resistência e maleabilidade respectivamente distribuída para a tarefa que aquela ferramenta irá realizar.

A katana transcende seu papel como arma, simbolizando a essência do desenvolvimento científico dos ferreiros japoneses, refletindo a profunda intersecção entre a química e a cultura. Mais do que um instrumento de combate, ela rebusca as tradições do Japão, representando um legado e traço histórico que influenciou a identidade cultural de um povo.

Seu processo de fabricação meticuloso, tonifica a conexão entre a ciência dos materiais e a filosofia oriental, tornando a katana um ícone duradouro.

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