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Liderança climática brasileira exige setor privado protagonista e fim das 'amarras'

Potencial natural do país e fragmentação de políticas públicas foram analisados por especialistas como Luciana Servo, presidente do IPEA, em evento do Instituto Clima e Sociedade com EXAME

Instituto Clima e Sociedade anuncia hub para instituições públicas e privadas com capacidade técnica e conhecimento para integrar dimensões climática e econômica. (Freepik)

Instituto Clima e Sociedade anuncia hub para instituições públicas e privadas com capacidade técnica e conhecimento para integrar dimensões climática e econômica. (Freepik)

Publicado em 8 de julho de 2025 às 18h03.

Última atualização em 8 de julho de 2025 às 18h07.

O Brasil possui vantagens excepcionais para liderar a agenda climática global, mas permanece limitado por obstáculos institucionais e pela fragmentação de políticas públicas.

A avaliação unânime foi trazida durante o lançamento do hub de economia e clima do Instituto Clima e Sociedade (iCS), em evento realizado na sede da EXAME, que reuniu especialistas para discutir as intersecções entre desenvolvimento econômico e ação climática.

Orçamento reativo versus planejamento estratégico

Não faltam exemplos no cenário brasileiro atual, que ilustrem as significativas contradições na gestão de recursos públicos destinados à agenda ambiental.

Conforme apresentado por Luciana Servo, presidente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), dos 94 bilhões de reais destinados aos programas ambientais em 2024, 82 bilhões foram redirecionados para respostas a desastres e emergências climáticas.

"Basicamente usamos o orçamento de uma agenda transversal para dar resposta à emergência do Rio Grande do Sul, que é uma resposta a posteriori", explicou, referindo-se aos créditos extraordinários mobilizados após as enchentes históricas no estado.

Um diagnóstico que evidenciou a urgência de transição de um modelo reativo para estratégias preventivas de longo prazo.

A gestão reativa vem na contramão do potencial brasileiro para liderar a transição climática global, como já tem sido alertado por muitos especialistas.

Enquanto recursos são sistematicamente desviados para emergências, o país deixa de capitalizar vantagens competitivas únicas que poderiam prevenir essas mesmas crises.

Jorge Arbache, professor de economia da Universidade de Brasília (UnB), caracterizou o país como detentor do "maior estoque de capital natural do mundo".

O economista listou um abrangente portfólio de ativos, da matriz energética predominantemente limpa, aos 50% do território nacional coberto por florestas, passando por competitividade agrícola consolidada e a substancial capacidade de produção de serviços ecossistêmicos.

Para Arbache, as vantagens ambientais podem se tornar motores de crescimento econômico, contrastando com décadas de baixo crescimento que caracterizam a economia nacional desde os anos 1980.

"O Brasil tem condições de desenvolver uma agenda de negócios onde a questão climática e da sustentabilidade funcione como motor principal para enfrentar os problemas estruturais do país", afirmou.

"O país mantém 380 bilhões de dólares em reservas internacionais e atrai interesse substancial de investidores para projetos de transição climática, mas não consegue demonstrar capacidade de crescimento que atenda aos requisitos necessários para viabilizar esses investimentos", lembrou Rogério Studart, do Centro Brasileiro de Relações Internacionais (CEBRI).

O economista, que já representou o Brasil no Banco Mundial e no BID, observou ainda que as oportunidades são enormes "se o país conseguir se libertar um pouco das suas amarras institucionais e até culturais".

Uma perspectiva que coloca no centro também a reestruturação do sistema tributário para destravar recursos destinados à transição climática. A magnitude das oportunidades fiscais foi avalizada por Luciana Servo.

De acordo com a presidente do IPEA, a tributação de apenas 0,5% dos brasileiros mais ricos geraria 30 bilhões de reais anuais. Paralelamente, os gastos tributários projetados para 2025 alcançam 545 bilhões de reais.

A análise do IPEA revelou ainda que a maioria desses benefícios concentra-se em segmentos que não demandam apoio público, falhando em gerar empregos nos setores mais dinâmicos da economia - uma configuração que perpetua ineficiências na distribuição de recursos, limitando tanto a justiça social quanto a eficácia da política climática.

Setor privado protagonista, mas bancos públicos na agenda

Arbache foi categórico ao reconhecer as limitações dos instrumentos públicos tradicionais: "sem o setor privado esse tema não vai embora".

A constatação fundamenta uma crítica mais ampla ao modelo de financiamento climático atualmente em vigor no país.

O professor também desconstruiu expectativas sobre o papel dos bancos públicos de desenvolvimento, argumentando que essas instituições enfrentam limitações de capital que impedem seu protagonismo no financiamento da transição.

"O que precisamos é que esses bancos entrem numa outra agenda, de desenvolvimento, de conhecimento, de articulação", propôs."Hoje a agenda contemporânea de comércio e investimento em sustentabilidade é mais belicosa do que o comércio convencional".

A observação sinaliza que o Brasil precisa acelerar sua estratégia de monetização de ativos naturais antes que outros agentes estabeleçam domínio sobre esses mercados, exigindo articulação sofisticada entre setor público e privado para exportar soluções baseadas na natureza.

Ou, nas palavras de Jorge Arbache, caso o país não capitalize adequadamente suas vantagens naturais, pode restar apenas "o que nos sobrar" depois que outros agentes estabelecerem domínio sobre a valoração e comercialização de ativos ambientais.

Instituto Clima e Sociedade, liderado por Maria Netto, lança hub Economia e Clima.

Instituto Clima e Sociedade, liderado por Maria Netto, lança hub Economia e Clima. (Divulgação)

Conhecimento científico fragmentado demanda articulação

Soma-se aos múltiplos desafios, o fato de que o Brasil se prepara para sediar a COP30 em Belém enquanto enfrenta questionamentos contínuos sobre sua estratégia energética e os planos governamentais de expansão da produção petrolífera que podem atingir 1 bilhão de barris até 2030.

O hub proposto pelo iCS nasce também para preencher essas lacunas de informações, reunindo estudos especializados e traduzindo conhecimento científico tanto para audiências gerais quanto para tomadores de decisão no setor privado.

Como enfatizou Annelise Vendramini, professora e pesquisadora em finanças sustentáveis na Escola de Administração de Empresas de São Paulo da FGV:

"O Brasil produz pesquisa de altíssima qualidade. Organizarmos uma iniciativa assim é importante para que se possa nesse processo reflexivo e coletivo, achar caminhos mais bem documentados para pensarmos a ação climática".

Vendramini acrescentou que a relevância do hub é ainda maior no momento atual, "quando cada vez mais as pessoas se informam pelas redes sociais, onde predominam conversas anedóticas."

A professora da FGV enfatizou que a economia está "muito bem equipada" para fornecer reflexões sobre alocação eficiente de recursos escassos, uma capacidade analítica especialmente relevante quando o volume disponível é significativamente menor que o demandado pelo desafio climático.

Contudo, é preciso acelerar a tomada de decisões para investimentos em mitigação e adaptação, que atualmente operam com horizontes temporais excepcionalmente longos, como lembrou a professora da FGV. 

"As decisões de hoje geram consequências que se estendem por décadas", observou. "E exigem instrumentos analíticos sofisticados para avaliar a viabilidade de estratégias climáticas de longo prazo."

Institucionalização como resposta sistêmica

"É fundamental formar uma comunidade de instituições públicas e privadas com capacidade técnica para integrar as dimensões climática e econômica", afirmou Maria Netto, diretora executiva do iCS que conduziu a primeira conversa no evento de lançamento.

O encontro contou ainda com a presença de Bráulio Borges, do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (IBRE-FGV), Claudio Amitrano, do IPEA, e de Juliano Assunção, do Climate Policy Initiative da PUC-Rio.

Como parte das atividades do hub do iCS, foi anunciado também uma premiação para reconhecer estudos científicos que contribuam para alinhar estratégias econômicas com ação climática no Brasil. As inscrições para a primeira edição ficam abertas entre 8 de julho e 8 de agosto.

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