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Ainda que o mundo tenha registrado sucessivos recordes de temperatura, propagação de mitos climáticos persiste e dificultando o desenvolvimento de políticas públicas eficazes e a mobilização social necessária para enfrentar a crise. (Freepik/Freepik)
Editora ESG
Publicado em 1 de abril de 2025 às 14h42.
Um fenômeno conhecido como "efeito da verdade ilusória" tem se mostrado perigosamente nocivo ao debate sobre as mudanças climáticas.
Conforme pesquisas recentes, esse conceito consiste na repetição constante de informações falsas - mesmo quando claramente refutadas pela ciência -, que tendem a aumentar sua aceitação pelo público criando barreiras significativas para a ação climática.
De acordo com a Divisão de Mudanças Climáticas do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA), "em muitos lugares, a desinformação está atrasando a ação que é tão vital para combater aquele que é um dos maiores desafios que a humanidade enfrenta".
Enquanto o mundo registra sucessivos recordes de temperatura – com 2024 ultrapassando pela primeira vez a marca de 1,5°C acima dos níveis pré-industriais e janeiro de 2025 atingindo o alarmante patamar de 1,75°C – a propagação de mitos climáticos persiste, dificultando o desenvolvimento de políticas públicas eficazes e a mobilização social necessária para enfrentar a crise.
Embora seja verdade que o clima terrestre oscila ao longo de períodos geológicos, as evidências científicas são claras: a taxa atual de aquecimento é aproximadamente 10 vezes mais rápida que qualquer período de aquecimento natural dos últimos 65 milhões de anos.
O consenso científico indica que as atividades humanas, principalmente a queima de combustíveis fósseis, são responsáveis por quase todo o aquecimento global observado desde a revolução industrial.
Os níveis atmosféricos de dióxido de carbono atingiram concentrações inéditas em 2 milhões de anos, enquanto metano e óxido nitroso estão em seus níveis mais elevados em 800 mil anos.
Este mito confunde eventos meteorológicos (de curto prazo) com tendências climáticas (de longo prazo). Paradoxalmente, o aquecimento do Ártico tem sido associado a invernos mais rigorosos em algumas regiões, como demonstrou a severa onda de frio que atingiu o Texas em 2021, causando bilhões de dólares em prejuízos.
O aquecimento global pode desestabilizar o vórtice polar, permitindo que massas de ar ártico escapem para latitudes mais baixas, gerando extremos aparentemente contraditórios - mas que, na verdade, fazem parte do mesmo desequilíbrio climático.
Um aquecimento que parece pequeno em números absolutos pode desencadear impactos devastadores nos sistemas naturais e humanos. O Acordo de Paris estabeleceu a meta de limitar o aquecimento global a 1,5°C acima dos níveis pré-industriais justamente porque cada fração de grau importa.
Dados recentes do Copernicus revelam que, em janeiro de 2025, a temperatura média global atingiu 13,23°C, representando um aumento de 1,75°C em relação aos níveis pré-industriais. Este foi apenas o mais recente de uma série alarmante de recordes – em 18 dos últimos 19 meses, o aumento da temperatura global ultrapassou 1,5°C.
Estudos do IPCC mostram que, com 2°C de aquecimento (em vez de 1,5°C), mais de 2 bilhões de pessoas adicionais estariam expostas a calor extremo, a produtividade agrícola cairia drasticamente em algumas regiões, e cerca de 99% dos recifes de coral seriam perdidos - comparado a 70-90% no cenário de 1,5°C.
Um estudo de 2021 analisou a literatura científica revisada por pares e constatou que 99% dos artigos publicados concordavam que as mudanças climáticas têm "origem antropogênica". O que significa que as alterações observadas no clima global são causadas principalmente pela ação humana, em contraposição a processos naturais.
Esta conclusão reforça pesquisas anteriores que já haviam identificado um consenso de 97% entre cientistas sobre a causa humana do aquecimento global. A narrativa da falta de consenso é frequentemente empregada para semear dúvidas e postergar ações necessárias.
Apesar da urgência da situação, ainda existe uma janela estreita de oportunidade. O Relatório de Lacuna de Emissões do PNUMA indica que, com uma redução de 42% nas emissões de gases de efeito estufa até 2030, seria possível limitar o aquecimento global a 1,5°C.
O que torna o cenário ainda mais alarmante é que os recordes de temperatura continuam sendo quebrados mesmo sob o fenômeno La Niña, que tipicamente reduz a temperatura média global.
Para alcançar as metas climáticas, o mundo precisaria reduzir suas emissões anuais em aproximadamente 22 bilhões de toneladas de CO₂ equivalente nos próximos sete anos, priorizando o desenvolvimento de baixo carbono nos setores de transporte, agricultura, silvicultura, energia, indústria e construção.
A prevalência desses mitos destaca a importância da comunicação científica eficaz. Especialistas apontam que a simples refutação de informações falsas pode, ironicamente, aumentar sua visibilidade.
Estudos recentes sobre cognição humana– a ciência que analisa como adquirimos, processamos e utilizamos informações – demonstram que simplesmente refutar notícias falsas com fatos isolados frequentemente não é suficiente para modificar crenças estabelecidas.
Como então tornar a complexa realidade climática mais acessível e convincente que as narrativas simplistas da desinformação, sem comprometer a precisão científica essencial para informar políticas públicas eficazes?
Com os oceanos registrando seu segundo janeiro mais quente (20,78°C), a extensão do gelo marinho no Ártico atingindo seu menor valor já registrado para o mês (6% abaixo da média), e recifes de coral no Brasil e na Austrália já sob alerta de branqueamento, o desafio para cientistas, educadores e comunicadores persiste.