Corona Zero: Consumo de cervejas sem álcool disparou, mas não será suficiente para compensar queda geral na indústria (Ambev/Divulgação)
Editora do Exame INSIGHT
Publicado em 30 de setembro de 2025 às 15h23.
Última atualização em 30 de setembro de 2025 às 17h34.
No sell side, ninguém está muito otimista com a Ambev.
Das 17 casas que cobrem o papel, segundo a Bloomberg, apenas duas, de menor tradição – MorningStar e Scotiabank – têm recomendação de compra.
Entre os vários ‘neutros’ e poucos ‘sell’, a XP acaba de se colocar como a mais pessimista, rebaixando as ações para venda, com menor preço-alvo em 12 meses entre todas as casas, de R$ 10,90. É um potencial de queda de 12% em relação à cotação de fechamento de ontem.
Hoje, os papéis da dona da Skol, da Bud e da Brahma caem cerca de 2,5% após o downgrade. (No ano, os papéis estão praticamente de lado. Em 5 anos, também.)
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Em relatório, a equipe do analista Leonardo Alencar pinta um cenário duro para o curto e médio prazo, em meio a redução do consumo per capita de cerveja no Brasil, pressões de custos e um cenário competitivo desafiador.
E traz ainda fatores que jogam contra a tese de maneira mais estrutural, como o consumo cada vez maior das canetinhas emagrecedoras – que além do apetite, reduzem a ingestão de bebidas alcoólicas –, além da maior preocupação com saúde da geração Z.
“Esperamos um momentum de lucro fraco pelo menos até o segundo semestre de 2026, impulsionado pela dinâmica fraca de receita associada a maiores custos”, escrevem os analistas da corretora, que tem uma previsão de lucro para o próximo ano 13% abaixo do consenso.
Com isso, vê a empresa negociada a múltiplos esticados, de 14 vezes o lucro para o próximo ano, o nível mais alto desde meados de 2023, quando a ação começou um processo de de-rating.
Com o lucro previsto pela XP, o desconto em relação a controladora AB Inbev está praticamente zerado, e um desvio-padrão da média histórica, em mais um sinal de que há espaço para desvalorização.
No curto prazo, a corretora vê um terceiro trimestre bastante desafiador, com as temperaturas mais amenas jogando contra o consumo, de acordo com um modelo proprietário desenvolvido por sua equipe de análise.
O segundo trimestre já tinha trazido uma surpresa negativa em termos de volumes e precificação para toda a indústria brasileira de cervejas. A direção da companhia atribuiu 70% disso a fatores relacionados ao clima, além de pressões de preço relativas ao seu principal concorrente.
A previsão da XP é de um recuo de 6,1% nos volumes de vendas da Ambev no Brasil no terceiro trimestre na comparação com o mesmo período do ano anterior.
Na mão oposta, os custos de produção devem passar a pesar mais sobre as margens. Além da pressão dos preços de milho, trigo e alumínio, trata-se de matemática pura.
A empresa vem reiterando o guidance de crescimento de custo-caixa por hectolitro de 5,5% a 8,5% no acumulado do ano. Até julho, esse custo aumentou apenas 1,2%, o que indica que o maior impacto vem pela frente.
Olhando para o médio prazo, o fator mais complexo é a competição – leia-se a Heineken. “Projetamos que o crescimento da receita vai continuar desafiador em 2026, principalmente devido a um ambiente competitivo mais desafiador, na medida em que seu principal competidor tem sinalizado uma abordagem voltada para volume depois de inaugurar uma nova fábrica, o que provavelmente vai trazer pressões tanto de volume quanto de precificação para a Ambev”, destaca Alencar.
O relatório traz ainda preocupações mais estruturais para a tese do consumo de bebidas alcoólicas no longo prazo.
A primeira é o consumo de medicamentos a base de GLP-1, como Ozempic e Mounjaro, que além de reduzir o apetite também tem mostrando uma redução significativa no consumo de álcool entre os usuários. A queda da patente do Ozempic no país no próximo ano tende a baratear a alternativa, ampliando sua adoação.
“Ainda é muito cedo para ser categórico a respeito dos efeitos de longo prazo do consumo de bebidas alcoólicas, mas acreditamos que questões estruturais sobre a tese de investimento e a capacidade de crescimento de lucro de longo prazo da companhia devem se intensificar, particularmente em meio a resultados fracos”, diz a XP.
Outro fator é a maior preocupação com saúde e bem-estar entre os mais jovens, especialmente a geração Z.
A corretora cita uma pesquisa da Euromonitor que mostra que, ao longo dos últimos cinco anos, as vendas de cervejas não alcoólicas no Brasil dispararam de 140 milhões para 702 milhões de litros – posicionando o Brasil como o segundo maior mercado global, atrás apenas da Alemanha.
A Ambev está bem posicionada neste mercado, com três marcas de cerveja-zero: Brahma, Budweiser e Corona. “O aumento dessas categorias contudo não tem compensado a desaceleração geral da indústria”, afirmam Alencar e equipe.
A tese pessimista é coroada na última seção do relatório, que traz o caso da BAT, de cigarros, que foi obrigada a fazer uma baixa contábil de mais de US$ 30 bi no seu portfólio por conta da perda de valor das suas marcas com a uma redução no consumo, especialmente entre os mais jovens.
A XP reconhece que álcool e cigarro são indústrias distintas e que as bebidas alcóolicas não tem visto a mesma taxa de declínio do Big Tobacco.
“Contudo, o caso da BAT ilustra como as tendências de consumo podem impactar estruturalmente as perspectivas de lucro das empresas, e mostra o que pode ser o worst-case scenario.”