Natura: falta de desinvestimento internacional na Avon chama a atenção dos analistas (Natura/Divulgação)
Repórter de finanças
Publicado em 1 de julho de 2025 às 13h13.
Depois de três anos desde o último encontro com investidores, a Natura realizou seu Investor Day para detalhar a reestruturação da empresa. A empresa retoma o ticker NATU3 a partir desta quarta-feira, 2, em um curioso caso de incorporação reversa: a empresa mãe, a holding Natura & Co, foi "engolida" pela filha, a Natura Cosméticos.
Apesar do evento ter marcado um novo momento para a empresa, com uma estratégia voltada para o crescimento na América Latina, disciplina na alocação de capital e reestruturações internas, os convidados sentiram falta de novidades. Segundo analistas do Citi e do Itaú BBA, não houve grandes surpresas nos anúncios do dia.
Para o Itaú BBA, o encontro marca "um novo capítulo, com foco claro na América Latina", mas sem trazer mudanças relevantes nas projeções atuais.
O banco mantém recomendação de compra para o papel, com preço-alvo de R$ 14.
O Citi, por sua vez, tem recomendação neutra e classifica o papel como de alto risco, com preço-alvo de R$ 11,80.
Segundo o banco americano, a falta de definição sobre o futuro da Avon Internacional continua sendo um dos principais obstáculos para o destravamento de valor.
O Citi também diz que a expectativa é de que a América Latina enfrente um 2025 mais desafiador, com crescimento limitado.
Também há previsão de maiores despesas operacionais (Opex) e custos de transformação mais elevados, o que pode pressionar os lucros e levar a revisões negativas nas estimativas.
Apesar da recente queda das ações possivelmente já refletir parte desse cenário, a casa vê pouco espaço para valorização adicional com os dados atualizados. No ano, os papéis recuam 15,2%.
O principal vetor de alta segue sendo a resolução do caso Avon Internacional, que se estende por mais tempo do que o previsto inicialmente.
O Itaú BBA, atualmente, vê a NATU3 sendo negociada a 13,1x P/L (preço por lucro) em 2025 e 9,7x P/L em 2026, excluindo Avon Internacional, ou 35,6x P/L em 2025, e 13,3x P/L em 2026 considerando apenas operações continuadas.
Para o Citi, entre os vetores de expansão mapeados, a companhia destacou a entrada em mercados com baixa penetração, com ênfase no México — onde apenas 9% dos domicílios consomem produtos da Natura, contra 54% no Brasil.
O Itaú BBA concorda. Para o banco, as principais alavancas de geração de valor daqui em diante são aumentar a penetração da marca Natura na América Latina (ainda sub-representada) e reverter o desempenho do México — que representa 33% da receita da região e, na em sua visão, é o maior fator de pressão sobre a rentabilidade.
“Há muitos elementos em movimento que aumentam o risco de execução — por isso, acompanhar a geração de caixa é a métrica mais importante para reconstruir a confiança, à medida que o negócio se torna cada vez mais centrado na América Latina”, escreve o Itaú BBA.
Há também uma frente voltada à diversificação de canais: a Natura pretende defender sua participação dominante de aproximadamente 25% no canal de vendas diretas, ao mesmo tempo em que acelera sua presença no varejo físico e no e-commerce com atuação B2C, destaca o Citi.
O plano de expansão das lojas próprias também foi reforçado, com destaque para um ROIC robusto de 37% e a estratégia de converter pontos multimarcas em lojas Mono Brand, de maior produtividade.
Chamou a atenção a falta de detalhamento sobre a Avon Internacional — que reúne as operações fora da América Latina e saiu de um processo de chapter 11 no fim do ano passado.
A empresa apenas afirmou que espera uma menor queima de caixa da operação em 2025, enquanto segue buscando uma forma de se desfazer do ativo. A expectativa do mercado era de que essa situação já estivesse resolvida antes da reestruturação do grupo.
Para o Citi, a falta de desinvestimento internacional na Avon é um ponto-chave. Segundo o banco, a marca deve passar por novos ajustes em seu portfólio, mas não há uma urgência em acelerar o crescimento da Avon: ela provavelmente servirá como uma marca de entrada para as consultoras.
“Embora a gestão tenha indicado uma queima de caixa menor este ano em comparação a 2024, acreditamos que o mercado espera uma resolução mais concreta sobre o desinvestimento, dado o quanto esse segmento ainda consome de caixa atualmente.”, disse em relatório.
Novos investimentos, porém, estarão condicionados à capacidade da marca de gerar ROI mais alto de forma orgânica, o que reforça uma clara disciplina de capital, discute o banco. A 13x P/L 2026, os pontos positivos e negativos da Natura parecem estar razoavelmente precificados.
No entanto, o Citi afirma que a Avon passará por um reposicionamento de marca, com investimentos planejados para atrair novos consumidores e aproveitar a alta consideração de compra que a marca ainda possui entre clientes atuais.
“Os planos de investimento estão sendo ajustados para que sejam relevantes no reposicionamento da Avon, sem corroer margens ou impactar negativamente a margem bruta. A ideia é condicionar os aportes ao quanto a marca já está gerando de resultados”, informaram o Citi relatório.
O Itaú BBA também destaca que não houve atualizações relevantes sobre a Avon Internacional e o principal ponto foi a projeção de uma queima de caixa menor em 2025, mesmo considerando os custos de reestruturação.
“A história permanece inalterada: como ainda não há um comprador real para o ativo, a gestão segue trabalhando no processo de carve-out para conter a queima de caixa e encerrar gradualmente a operação.”
Mesmo em meio à reestruturação e aos desafios no mercado internacional, o Brasil continua sendo o principal pilar da Natura. Em 2024, a operação local registrou uma margem Ebitda de 21,5%, com a marca Natura representando cerca de 80% da receita no país. A despeito da erosão nas receitas da Avon nos últimos anos, a empresa conseguiu ganhar participação de mercado e ampliar suas margens.
“A gestão reiterou a confiança no potencial de crescimento da marca Natura por meio de canais ainda pouco explorados (varejo e e-commerce) e categorias específicas (como haircare)”, diz o Itaú BBA.
Já em relação à Avon, a percepção dos analistas é clara: a marca ainda atua como um entrave ao crescimento no Brasil, mas os investimentos devem continuar de forma seletiva. A estratégia é manter os aportes limitados, evitando impacto negativo sobre margens ou geração de caixa.
“A Avon não pode ser uma alavanca de compressão de margem ou de geração de caixa no Brasil”, aponta relatório.
A tendência natural, segundo especialistas, é que a marca Natura siga ganhando espaço sobre a Avon, o que favorece a rentabilidade por meio de um mix mais eficiente. A margem Ebitda da marca Natura no Brasil é estimada entre 23% e 24% atualmente.