Trump e Paul Atkins, durante a posse do presidente da SEC, em abril de 2025 (Chip Somodevilla /Getty Images)
Editora do Exame INSIGHT
Publicado em 29 de setembro de 2025 às 18h49.
Última atualização em 29 de setembro de 2025 às 19h41.
O presidente da SEC, Paul Atkins, escreveu hoje um artigo para o Financial Times reforçando que vai acelerar a proposta de Donald Trump para substituir a obrigatoriedade de balanços trimestrais por reportes semestrais — e defendendo uma postura de ‘regulação mínima’ para a agência.
“O governo deve prover a dose mínima eficaz de regulação necessária para proteger os investidores, permitindo que os negócios prosperem”, afirmou.
Sua tese é que é o mercado quem deve decidir pela periodicidade — mostrando mais uma vez como a discussão sobre a mudança na frequência de reportes pode ser barulhenta, mas, na prática, é inócua sob quase todos os aspectos.
“Está na hora de a SEC retirar o peso de sua mão na balança e permitir que o mercado dite a frequência de reporte mais adequada, considerando fatores como setor, porte e expectativa dos investidores”, disse.
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De várias formas, o mercado já seu veredicto. Como pondera o próprio Atkins, companhias estrangeiras listadas em bolsas americanas são obrigadas a reportar semestralmente, mas boa parte delas continua divulgando resultados trimestrais.
Da mesma forma, desde que o Reino Unido retornou ao reporte semestral em 2014, algumas grandes companhias optaram por seguir reportando a cada trimestre, simplesmente porque o mercado demanda e premia a transparência.
Uma pesquisa feita pelo CFA Institute em 2019 — quando Trump trouxe a ideia em seu primeiro mandato — mostra que os investidores preferem as divulgações trimestrais às semestrais numa proporção de dois para um, mesmo se mudança resultasse em economia para as empresas.
“Os investidores querem pagar por isso, porque eles sabem que as informações são úteis para tomar decisões”, disse Sandy Peters, head de políticas de reporting da instituição.
O argumento de Trump para acabar com os balanços trimestrais é de redução de custos, mas principalmente que os gestores focariam mais no longo prazo — segundo o presidente, como faz a China, que olha “50 a 100 anos”.
A ideia de que o olho no curto prazo desincentiva investimentos mais estruturais é antiga. Mas a experiência já mostra que não há relação de causa e efeito entre a periodicidade de balanços e a disposição a investir.
O Reino Unido proporcionou um laboratório natural nesse sentido, porque em menos de uma década, mudou duas vezes a regra de reporte: em 2007, tornou obrigatória a divulgação trimestral, para retirá-la sete anos depois, em 2014.
Pesquisadores da Columbia Business School analisaram justamente esse ciclo e descobriram que não houve alteração significativa nos níveis de investimento ou ativos físicos das companhias, nem quando o reporte trimestral foi introduzido e nem quando foi abolido em 2014.
A cobertura de analistas, por outro lado, aumentou quanto a obrigação de balanços trimestrais foi introduzida e os erros de estimativas de lucros caíram. Em outras palavras: o custo de divulgação pode ser alto, mas tende a reduzir o custo de capital, já que os investidores pagam quando tem clareza de informações.
Em tempos de recordes nas bolsas americanas e em que o mercado está premiando quem mais investe, especialmente em inteligência artificial, é possível questionar a própria premissa de que os investidores são curto-prazistas. Na verdade, as grandes bolhas se formam quando o mercado coloca muita expectativa justamente no futuro.
Há ainda uma questão de finanças corporativas básicas: nem todo mundo deveria investir na mesma magnitude.
O ex-secretário do Tesouro americano, Larry Summers, desenhou em um artigo em 2019, na primeira ofensiva do presidente americano contra os balanços trimestrais:
“As companhias diferem em grande medida na qualidade de sua gestão. É natural que aquelas com melhor gestão e mais oportunidades vão reinvestir mais seus lucros e ganhar retornos mais altos ao longo do tempo. Inferir, como muitos advogados do curto prazismo vem fazendo, que isso prova que todas as empresas devem investir mais é se comprometer com a falácia óbvia de confundir correlação com causalidade”, escreveu.
A comparação com a China é o melhor termômetro do quão míope é o argumento. Primeiro, as companhias chinesas reportam trimestralmente. Segundo: a margem de lucro das grandes empresas listadas dos Estados Unidos está próxima de 14%, enquanto na China roda em torno de 8%, com excessos que resultaram em sobrecapacidade do mercado imobiliário ao industrial.
A diferença vem, obviamente, do investimento direcionado pelo Estado — uma ideia que cada vez mais apetece o mandatário americano.