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Bitcoin: autoridades do governo dizem ser contra reserva do ativo (Leandro Fonseca/Exame)
Editor do Future of Money
Publicado em 21 de agosto de 2025 às 12h03.
Representantes do Ministério da Fazenda e do Banco Central afirmaram na última quarta-feira, 20, que o Congresso não deveria aprovar um projeto de lei que obrigaria o Brasil a criar uma reserva de bitcoin. Inspirada em um movimento semelhante ocorrido nos Estados Unidos, a proposta foi apresentada na Câmara dos Deputados.
O projeto de lei foi proposto pelo deputado Eros Biondini (PL-MG). Em início de tramitação, a proposta envolveria a aquisição de unidades da criptomoeda e uso como ativos de reserva pelo governo federal. Na justificativa da proposta, ele afirma que a reserva seria destinada a "diversificar os ativos financeiros do Tesouro Nacional" e "proteger as reservas internacionais contra flutuações cambiais e riscos geopolíticos".
A medida foi proposta pouco depois da vitória do presidente Donald Trump nas eleições de 2024. Trump assinou uma ordem executiva neste ano que criou uma reserva estratégica de bitcoin, mas sem compras do ativo e usando apenas unidades que foram apreendidas em operações policiais.
A Comissão de Desenvolvimento Econômico da Câmara realizou uma sessão específica para debater o projeto que contou com a participação de representantes do governo. Daniel Leal, subsecretário da Dívida Pública do Tesouro Nacional do Ministério da Fazenda, disse que a pasta é contra o projeto.
Leal reconheceu que a discussão sobre a criação de uma reserva de bitcoin é "extremamente válida" e que a tecnologia blockchain "é de fato inovadora e merece ser observada e acompanhada". Entretanto, afirmou que "a gente não pode confundir as políticas públicas de fomento tecnológico com a gestão prudencial de reservas oficiais".
A visão do integrante do governo é que o projeto apresentaria quatro riscos para o Brasil. O primeiro seria um "risco elevado e desnecessário na gestão das reservas internacionais" devido a uma volatilidade da criptomoeda que, na visão da pasta, ainda seria muito elevada, impedindo o seu uso como ativo de reserva.
O segundo seria um potencial do projeto de servir como incentivo ao mercado de criptomoedas e ao bitcoin mais especificamente, o que poderia misturar "os objetivos distintos de política de reserva e política industrial no mesmo instrumento legal". Leal afirma que o projeto também "confunde as atribuições do Banco Central e do Tesouro Nacional, recriando um fundo que hoje não estaria previsto".
Por fim, ele ressaltou que a obrigação da criação da reserva "teria impacto fiscal significativo e cria obrigações implícitas que podem comprometer a disciplina fiscal e a estabilidade macroeconômica" ao obrigar o governo a realizar compras da criptomoeda.
"A luz dos princípios de boa gestão fiscal e monetária, e como representante aqui do Ministério da Fazenda, a gente entende que esse projeto, da forma que está, não deveria ser aprovado", concluiu.
"Há um caminho para incentivar o ecossistema de blockchain com marcos regulatórios claros, programas de pesquisa e desenvolvimento, sem expor o patrimônio público a risco desproporcionais e sem comprometer a segurança das reservas internacionais e nem a solidez do fiscal do país", defendeu.
Luis Guilherme Siciliano, chefe do Departamento de Reservas Internacionais do Banco Central, também disse que a autarquia é contra o projeto atual: "Atualmente, os criptoativos não atendem aos critérios de elegibilidade para a inclusão nos portfólios de reservas de bancos centrais, sendo incompatíveis com os objetivos tradicionais de segurança, liquidez e retorno."
"Sua elevada volatilidade compromete a previsibilidade e a estabilidades exigidas de ativos utilizadas como reserva de valor. Além disso, os criptoativos ainda operam em um ambiente jurídico e normativo marcado por incertezas e ausência de padronização internacional", comentou Siciliano.
O representante do BC também citou um estudo realizado pelo Banco Mundial em 2024 em que há a visão de que o bitcoin ou outras criptomoedas precisariam ter uma expansão de liquidez e uma redução significativa na sua volatilidade para que pudessem ser adotados como ativos de reservas por bancos centrais.
Siciliano pontuou que a estratégia dos Estados Unidos para o bitcoin envolve uma acumulação e proibição de vendas, mas que isso ainda não caracteriza a criptomoeda como parte das reservas internacionais do país. Ele também citou posicionamentos contrários à medida por outros bancos centrais ao redor do mundo.
Apesar das visões trazidas pelo Ministério da Fazenda e pelo Banco Central, nem todos os representantes do governo foram contrários à proposta. Pedro Henrique Guerra, chefe de gabinete do vice-presidente Geraldo Alckmin (PSB), defendeu a medida e disse que o bitcoin seria um "ouro melhorado".
"Imaginem agora as potencialidades de um ouro melhorado, um ouro digital, por assim dizer, mais escasso e
transacionável em poucos minutos, 24 horas por dia, 7 dias por semana", comentou.
Ele afirmou ainda que "ao contrário das reservas e moedas fiduciárias, uma reserva em bitcoin não incorreria em custos fiscais de carregamento, promovendo previsibilidade, credibilidade e estabilidade" e citou a possibilidade do governo ter novas fontes de receita a partir da emissão de títulos lastreados na criptomoeda, estratégia adotada por El Salvador.
Guerra disse que a medida fomentaria um mercado de mineração da criptomoeda no Brasil, fortaleceria e diversificaria as reservas internacionais e daria mais transparência aos fundos, além de colocar o país em uma posição de pioneirismo global. Anteriormente, ele já havia compartilhado uma posição favorável ao ativo.
O projeto de lei ainda precisará ser avaliado por comissões na Câmara antes de ser votado no plenário. Se for aprovado, precisará ter uma tramitação no Senado e, apenas em caso de aprovação, chegará à sanção ou veto do presidente Lula (PT).
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