Leonardo Hallal e Miguel Fernandes: como entender o futuro da moda? (Imagem criada pela ferramenta de IA ChatGPT/Reprodução)
Chief Artificial Intelligence Officer da Exame
Publicado em 21 de maio de 2025 às 11h42.
Última atualização em 21 de maio de 2025 às 14h09.
Eu li esse dado enquanto encarava mais uma manhã de guarda-roupa monocromático — calças pretas, camiseta preta, casaco… preto. Pensei: se os CEOs estão apostando em algoritmos para reinventar coleções inteiras, por que eu continuo preso ao Ctrl-C Ctrl-V do meu armário?
Foi aí que liguei para Leonardo Hallal, o consultor de imagem que conheci meses atrás, depois de uma palestra que dei a profissionais do setor. Convidei ele para conversar sobre como a IA está mudando a forma das pessoas se vestirem.
Hallal sustenta que o estilo nasce da combinação de doze “personas” — dominantes, complementares e transitórias. “Encontrar quais personas você veste é que vai formar o seu estilo … não existe nenhum estilo igual ao seu”, explicou. Essa teoria casa com a lógica dos algoritmos de recomendação, que transformam traços de comportamento em tamanhos literalmente infinitos: as medidas vão do corpo às redes sociais.
A matemática do retorno é difícil de ignorar. O mercado global de IA em moda deve saltar de US $ 1,26 bilhão em 2024 para US $ 1,77 bilhão em 2025, num ritmo de 40 % ao ano, segundo pesquisa da The Business Research Company. O nicho de IA generativa é ainda mais veloz: de US $ 96,5 milhões em 2023 para US $ 2,23 bilhões em 2032, a 36,9 % de CAGR, de acordo com dados da Market.US.
Dentro dos ateliês, a diferença já aparece — protótipos que exigiam semanas hoje nascem em minutos; provadores virtuais derrubam devoluções.
Hallal traduz o impacto em língua de costureira: “Você precisa tratar a inteligência artificial como alguém que vai te ajudar a performar melhor… o prompt é seu e o toque final é seu.” Na prática, a IA assume tarefas de modelagem, estamparia e previsão de demanda, liberando designers humanos para decisões de direção criativa.
Com a mesma franqueza, o consultor aponta a zona cinzenta: “Está tudo muito igual… a inteligência artificial tende a padronizar ainda mais.” A homogeneização, amplificada pelas redes sociais, ameaça engolir o autoral. A saída, insiste Hallal, é “o antídoto da autoria”: narrativas únicas, curadoria de referências e controle manual das bases de treino.
A preocupação não é teórica. Start-ups portuguesas que testam provadores baseados em avatares identificaram 17 % menos sugestões premium para usuários de pele escura — viés hereditário dos datasets originais. Hallal resume o dilema em uma linha: “Sempre vai existir um coeficiente humano.”
Além de conteúdo, a IA mexe na produção física. Cadeias on-demand que cortam tecido só depois de a peça ser vendida miram no “estoque zero” — resposta direta ao desperdício de 12 % da produção têxtil global que nunca encontra comprador.
Ao conectar previsão de demanda, corte robotizado e rastreio em blockchain, marcas de luxo pretendem cumprir as futuras regras europeias de passaporte digital de produto, mantendo ao mesmo tempo margens mais gordas.
Quem integrar geração de imagem, manufatura automatizada e logística reversa ditará tendência até o fim da década. Investidores já aceleram: mais de 400 start-ups específicas de moda levantaram US $ 21 bilhões em 2023, focadas em design generativo, fotografia sintética e provadores AR, conforme pesquisa divulgada pela Vogue Business.
Ao encerrar a gravação, Hallal devolveu-me a pergunta que move todo o setor: “Onde é que você vai se diferenciar num mar de conteúdo que pode copiar o seu estilo?” Ele próprio deu a pista. Se a IA já é costureira, figurinista e vitrine, cabe a nós decidir se viramos manequins uniformizados — ou autores do próprio look.
Para assistir a entrevista completa em vídeo acesse o link.