Chief Artificial Intelligence Officer da Exame
Publicado em 29 de março de 2025 às 08h59.
Última atualização em 31 de março de 2025 às 13h45.
Recentemente, coloquei as mãos no mais novo modelo de geração de imagens da OpenAI. Assim que bati o olho nos primeiros resultados, fiquei surpreso com o realismo e a precisão do estilo visual – seja retrô futurista, seja no formato de filme antigo, ou, para meu espanto, no traço suave e hipnótico característico dos clássicos do Studio Ghibli.
OpenAI bloqueia imagens no estilo Ghibli em nova ferramenta do ChatGPTMinha primeira reação foi genuíno deslumbre. Uma simples descrição do tipo “cidade brasileira à la Miyazaki, com ruas coloridas e nuvens oníricas” bastou para o sistema produzir algo que parecia ter saído direto de A Viagem de Chihiro. No entanto, não demorou muito para eu me lembrar da famosa declaração do próprio Hayao Miyazaki: ele não apenas não aprova a IA, como a considera um insulto à vida humana. Uma ironia quase inevitável: estamos homenageando e popularizando o estilo de um artista que claramente discorda desse uso tecnológico.
Essa experiência me levou a refletir sobre propriedade intelectual. Copiar o “estilo Ghibli” seria ético ou mesmo legal? Em tese, estilos não são protegidos por copyright. E muitos defendem que essas ferramentas agem como “assistentes” na hora de criar. Mas também compreendo a frustração de quem vê seu trabalho ser replicado por algoritmos treinados em bancos de dados gigantescos, sem crédito ou permissão.
Ainda assim, no dia a dia das empresas, a qualidade e a velocidade dessas criações abrem oportunidades inegáveis. Em poucos cliques, uma equipe de marketing pode gerar dezenas de layouts para uma campanha, ou um estúdio de animação pode esboçar storyboards inteiros sem precisar desenhar cada cena. É uma mudança de paradigma que, apesar de polêmica, veio para ficar.
No contexto brasileiro, os benefícios e riscos se misturam. Por um lado, temos estúdios de publicidade, produtoras e agências que vêm encontrando na IA um atalho para prototipar ideias. Por outro, uma pesquisa publicada pela Exame indicou que pouco mais de 20% das empresas se sentem realmente preparadas para lidar com ferramentas de IA no setor criativo. Muitos executivos ainda encaram a tecnologia com desconfiança ou falta de clareza sobre regulamentações.
Enquanto isso, o debate legal não para de crescer. Países como Estados Unidos e membros da União Europeia já discutem regras para exigir transparência e remunerar criadores cujos trabalhos alimentem modelos de IA. No Brasil, projetos de lei sobre o tema incluem possibilidades de pagamento de royalties e limites de uso de conteúdo protegido. A tendência é que surjam normas mais rígidas, sobretudo no que diz respeito a plágio, uso indevido de imagem e desinformação.
Como Diretor de Inteligência Artificial, minha sugestão é simples: abrace a inovação, mas com responsabilidade. Se a sua empresa pretende utilizar IA para criar conteúdo, estabeleça diretrizes claras – desde o crédito a artistas, até o uso de bases de dados livres de restrições. É igualmente essencial preparar equipes criativas, oferecendo treinamentos e oportunidades para aprender a dialogar com a ferramenta (afinal, bons prompts geram resultados superiores).
Precisamos encontrar um equilíbrio entre a empolgação que vem de gerar imagens em segundos e a cautela necessária para não atropelar direitos e valores de quem, como Miyazaki, enxerga nessa revolução um risco à essência da arte. No fundo, o objetivo é evoluir sem perder a sensibilidade humana – algo que, pelo menos por enquanto, só a imaginação real consegue capturar na sua totalidade.
O autor que vos escreve, em sua versão de Os Simpsons
Por mais que a IA desenhe cenas de tirar o fôlego, ainda cabe ao olho humano dar direcionamento, propósito e significado a essas criações. A nova tecnologia da OpenAI é, sem dúvida, um divisor de águas. Minha experiência pessoal – vendo fotos, cenários e personagens que pareceriam impossíveis de surgir automaticamente – mostra que estamos numa era de transformações profundas. Agora, resta às lideranças empresariais decidirem como usar esse poder: apoiar a criatividade humana ou simplesmente substituí-la? Acredito firmemente que a melhor resposta seja uma parceria, não uma troca.
Publiquei no meu Instagram esse post em que o ChatGPT me ajudou a fazer uma capa pra Exame.