Inteligência Artificial

O futuro da música na era da IA

IA pode abocanhar até R$ 120 bilhões da receita global de músicos até 2028, segundo estimativa da CISAC

Skylab e Miguel: tecnologia como ferramenta, não substituição (Imagem criada pelo chatbot ChatGPT/Reprodução)

Skylab e Miguel: tecnologia como ferramenta, não substituição (Imagem criada pelo chatbot ChatGPT/Reprodução)

Miguel Fernandes
Miguel Fernandes

Chief Artificial Intelligence Officer da Exame

Publicado em 14 de maio de 2025 às 16h35.

Em 2028, quase um quarto da renda global dos músicos, algo em torno de R$ 120 bilhões, pode escorrer para músicas geradas por inteligência artificial, projeta a CISAC, entidade que reúne mais de quatro milhões de criadores no mundo.

O número assusta porque não se trata só de receita: ele sugere uma guinada no modo como músicas nascem, circulam e são monetizadas.

Para entender o que realmente está em jogo, procurei Rogério Skylab, sinônimo de experimentação no rock brasileiro e pioneiro no uso de IA no Brasil. Ele lançou três videoclipes (“Mictório” e as duas partes da Trilogia do Fim), gerados 100% por IA.

Um artista na passagem das tecnologias

Skylab se define como “artista na fronteira”, lembrando que já atravessou vinil, CD, streaming e agora IA:

“A IA é uma grande revolução, mas a montagem continua sendo pessoal; ela vem em auxílio, não para substituir o homem.”

Nos clipes, anéis de petróleo viram sangue e macacos viram gente, cenas que, segundo ele, “seriam impossíveis de filmar mesmo com muito dinheiro”.

O estúdio no bolso e a nova batalha jurídica

Inteligências artificiais como Suno e Udio prometem “estúdio de bolso”: digite “pagode romântico sobre saudade” e receba a faixa pronta. Grandes gravadoras reagiram, acusando uso não licenciado de seus catálogos, o que pode custar centenas de milhares de reais por música. A disputa lembra as primeiras batalhas do streaming: inovação corre à frente da lei, e quem define as regras ganha vantagem.

Skylab vê a IA como ferramenta, não ameaça, mas alerta para a atenção dilacerada das redes:

“Nosso cérebro exige fragmentos; precisamos lutar para não perder o fôlego das narrativas longas.”

O que a transformação na música nos ensina

A disrupção que varre a indústria fonográfica é um ensaio-geral do que acontecerá em todos os setores que dependem de conteúdo, dados e criatividade.

Em 2024, os serviços de streaming receberam mais de um milhão de novas músicas por mês. E 87% dessas 202 milhões de músicas tiveram menos de mil execuções no ano. O paralelo corporativo é óbvio: relatórios, códigos, campanhas ou vídeos gerados por IA podem inundar sua organização de versões “mais do mesmo”. Se todo mundo produzir tudo, curadoria vira imperativo competitivo. Quem investe em filtros, humanos e tecnológicos,  conquista a atenção que vale dinheiro.

A batalha jurídica das gravadoras contra as IAs ilustra o valor de catálogos “higiênicos”: detentores de conteúdo organizado e devidamente licenciado negociam contratos de fornecimento de dados para treinar modelos de inteligência artificial, uma nova fonte de receita que projeta um mercado bilionário para datasets “certificados”.

Há, ainda, o tema da autenticidade. Pesquisas recentes mostram que grande parte dos departamentos de marketing B2B não está pronta para o impacto dos deepfakes. Nesse ambiente, o “ruído” defendido por Rogério Skylab — o erro, a voz trêmula, o backstage — vira diferencial. Marcas que mostram bastidores e assumem imperfeições se tornam mais críveis do que aquelas que despejam peças publicitárias polidas por IA.

Orquestra algorítmica

Perguntei a Skylab se teme que máquinas substituam músicos humanos. A resposta:

“A expressão nunca vai deixar de existir. Você tem que viver o seu tempo… estar aberto ao novo não significa eliminar o passado.”

A reflexão serve para qualquer líder: a IA não é a banda que demite a orquestra; é o instrumento que exige um novo maestro. Só quem aprender a reger essa mistura, combinando dados, ética e a dose certa de “ruído” humano, sobreviverá à próxima onda, seja no palco, seja na sala de reuniões.

Para ver a entrevista completa acesse aqui.

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