Liquidez na bolsa segue reduzida, com ausência de investidor institucional (Reprodução/Getty Images)
Editor de Invest
Publicado em 19 de setembro de 2025 às 06h00.
O Comitê de Política Monetária do Banco Central (Copom) tirou um pouco do otimismo de quem esperava que a Selic pudesse ser reduzida ainda este ano. O BC manteve os juros inalterados, conforme o previsto, mas se mostrou ainda bastante cauteloso com o andamento da inflação, deixando claro que poderá voltar a subir a taxa caso seja necessário. Hoje, tem mais gente no mercado dizendo que o aperto vai durar mais tempo que o previsto. É uma boa notícia para os rentistas que têm aproveitado os retornos da renda fixa com baixo risco. Mas e o investidor da bolsa, como fica?
Ângelo Belitardo, gestor da Hike Capital, avalia que a permanência da Selic em 15% até 2026 não invalida a alocação em Bolsa, mas "muda alguns eixos". Empresas mais dependentes de capital e com dívidas mais longas ficam reféns de juros baixos para chegar a um valuation justo. Um aperto mais demorado eleva o risco de exposição a esses ativos, o que inclui as ações "cíclicas", de empresas que tem seus resultados mais atrelados ao mercado interno e, logo, à economia doméstica.
"A carteira deve migrar para nomes de caixa forte, baixo endividamento, geração recorrente e capacidade de repassar preços", afirma Belitardo. É hora de priorizar empresas que conseguem rentabilizar seu capital e lucrar acima dos custos, mesmos com os juros elevados. Escolher papéis para manter na carteira por um horizonte de longo prazo, negócios geradores de caixa e que paguem dividendos, de preferência. Como contrapeso à volatilidade, Belitardo recomenda uma posição em renda fixo pós-fixada e crédito privado de baixo risco (high grade).
"A leitura central é de que o gatilho para alívio dos múltiplos passa a depender mais da melhora da inflação e do fiscal de forma mais consistente", diz o gestor.
Já Max Bohm, estrategista de ações da Nomos Investimentos, acredita que uma demora no corte de juros joga para o início do ano que vem um rali de ações dos setores cíclicos que poderia ocorrer no final do ano. Mas isso não muda muito a estratégia de se posicionar nesses papéis.
"Para quem tem uma visão de longo prazo, eu acho que já é uma oportunidade começar a comprar esses papéis de setores de consumo, varejo, construção civil, logística, que estão mais alavancados e que são mais sensíveis à dinâmica de juros", afirma. "Posições pequenas, diversificadas, mas é o momento de montar, visando os próximos 12 meses".
Camilo Cavalcanti , gestor de portfólio da Oby, acredita que o mercado ainda trabalha com uma precificação de corte de juros, ainda que um pouco mais à frente.
"Isso mantém um ambiente positivo para ativos de risco brasileiros, especialmente quando somados ao ambiente externo de desvalorização do dólar e queda de juros nos EUA", afirma.
O estrategista de ações da Genial, Filipe Villegas, diz que uma parte muito pequena do mercado apostava em corte de juros ainda este ano. Ele não acredita em mudanças nas tendências de alocação no mercado acionário, ao menos não por esse motivo.
"A correlação negativa se mantém: taxa de juros elevada é ruim para ações. Mas o que manda no mundo, hoje, são as decisões e acontecimentos nos Estados Unidos. É o que vai determinar se o investidor global vai ter mais ou menos apetite por risco".
A liquidez do mercado à vista da B3 em 2025 chegou ao menor nível em seis anos. E isso reflete um interesse ainda baixo do investidor gringo na bolsa brasileira, mesmo com o fluxo estrangeiro estando positivo no acumulado do ano.
"Quem está posicionado hoje em ações brasileiras é o pequeno investidor e o investidor estrangeiro. O institucional está completamente fora", diz Villegas. "O que está impactando o mercado brasileiro hoje são dois principais temas: para onde vai o endividamento brasileiro e quem vai ser o vencedor das eleições do ano que vem." Para o estrategista, são esses os fatores que repelem a participação de bolsos maiores na B3, que já poderiam estar posicionados para uma queda de juros no curto prazo.
Flávio Conde, analista da Levante Investimentos, concorda com Villegas ao dizer que não é a expectativa de queda de juros que está levando ao investidor à bolsa hoje. "O mercado aqui só sobe mesmo quando vem dinheiro do exterior", afirma, o que faz a política monetária dos Estados Unidos ser mais importante em termos de precificação das ações do que as decisões do Copom.
Internamente, o que cria risco para o investidor, diz Conde, "seria a inflação brasileira voltar a subir e o Copom cortar juros só no segundo semestre do ano que vem. Mas essa não é a expectativa, pelo contrário".
A EXAME também perguntou aos estrategistas, gestores e analistas ouvidos nesta reportagem quais empresas podem ser consideradas boas escolhas para navegar em cenário de juros altos por mais tempo. A seguir, o que eles disseram.
"Exemplos que costumam navegar bem esse ambiente, pensando em qualidade, caixa e dividendos, incluem bancos incumbentes e seguradoras com histórico de rentabilidade e capital robusto: Itaú (ITUB4), Banco do Brasil (BBAS3), BB Seguridade (BBSE3). Pode ser o momento também de começar a alocar em ações alavancadas mesmo que o juros comece a cair só em 2026, como Vamos (VAMO3), Movida (MOVI3), Simpar (SIMH3), JSL (JSLG3) e Ânima Educação (ANIM3).
"Considerando o cenário de fechamento de curva futura de juros, queda de Selic em breve, gosto de papéis que estão mais alavancados, vão ter redução na despesa financeira e aumento no lucro líquido. Vamos (VAMO3), eu acho interessante, Localiza (RENT3), também é um bom papel. MRV (MRVE3), C&A (CEAB3), Azzas 2154 (AZZA3), Pague Menos (PGMN3) também são nomes mais cíclicos que podem subir bem nos próximos 12 meses."
"Nesse cenário de juros altos por mais tempo, o setor financeiro é um destaque, por ter a capacidade de entregar retornos acima de seu custo de capital. Empresas resilientes a essa conjuntura são aquelas que conseguem entregar crescimento de lucros mesmo em cenários adversos, assim como aquelas menos alavancadas - que dependem menos do capital de terceiros. Hoje vemos oportunidades interessantes em nomes como Bradesco e Itaú e também em PRIO, por conta da alta geração de caixa e baixa alavancagem".
"O que nós estamos recomendando hojeé uma carteira bastante diversificada, com foco em empresas de menorcapitalização e não tem um nome específico. Se o investidor é mais conservador, pode ficarem bancos, empresas de saneamento, setor elétrico. Se o perfil é mais agressivo, tem as small caps, tem varejo e e-commerce, empresas que são alavancadas, como setor de saúde, locadoras de veículos. Tem oportunidade no mercado brasileiro como um todo."
"Numa conjuntura de juros mais altos, as empresas mais resilientes são, em primeiro lugar, aquelas que não têm dívida alta. E tem muita empresa com esse perfil. No setor de saneamento, Sabesp, Sanepar e Copasa; em telecomunicações, tem TIM e Vivo. São empresas que tem mais previsibilidade de receita, assim como transmissoras de energia, distribuidoras e geradoras. Nesse cenário, as seguradoras também ganham bem porque elas têm reservas técnicas que, aplicadas a Selic de 15%, o ganho financeiro, que faz parte do lucro líquido sobe, o que é bom para Porto, BB Seguridade e Caixa Seguridade".