JPMorgan Chase %26 Co. em NY (Getty Images)
Redação Exame
Publicado em 22 de outubro de 2025 às 06h00.
As falências da First Brands Group e da financeira Tricolor, ambas apoiadas por crédito privado, junto a perdas milionárias registradas por dois bancos regionais dos EUA (Zions Bancorporation e Western Alliance) acusados de fraude, têm gerado percepções diferentes entre os grandes bancos sobre potenciais riscos para o sistema financeiro. Enquanto o CEO do Wells Fargo, Charlie Scharf, minimiza os efeitos sistêmicos, o CEO do JPMorgan Chase, Jamie Dimon, assim como autoridades globai,s demonstram maior preocupação.
Scharf afirmou em entrevista realizada pelo Economic Club of New York que os riscos do crédito privado não devem ser generalizados e a qualidade do crédito do Wells Fargo tem sido “excepcionalmente boa”. De acordo com ele, embora uma desaceleração no ciclo de crédito seja inevitável após um longo período de bom desempenho, as recentes alegações de fraudenão indicam problemas mais amplos.
“Existe uma diferença muito, muito grande entre o que poderia ser uma fraude e o que é um problema de crédito decorrente do mau desempenho da base de clientes dessas empresas”, disse Scharf. Ele acrescentou que o Wells Fargo empresta apenas para credores não bancários que considera competentes, reforçando que a palavra “preocupação” seria exagerada no contexto atual.
Por outro lado, Dimon alertou que novas perdas podem surgir no setor de crédito privado após o colapso da Tricolor e da First Brands. Durante teleconferência com analistas, ele comparou o alerta a “ver uma barata". "Provavelmente há mais delas”, disse, sinalizando atenção redobrada ao setor.
O JPMorgan revelou ter registrado uma perda de US$ 170 milhões com a Tricolor, que entrou em colapso no mês passado em meio a alegações de fraude. Embora o banco não tenha exposição direta à First Brands, os dois casos evidenciam fragilidades no setor bancário paralelo — que inclui instituições de crédito privadas não regulamentadas e sem obrigação de divulgar seu nível de risco.
Essas conexões entre bancos tradicionais e empresas de crédito privado têm levantado temores sobre possíveis efeitos em cascata no setor, estimado em US$ 3 trilhões.
Segundo Dimon, “há players muito inteligentes nesse mercado, mas nem todos são. Alguns bancos que financiam essas entidades podem descobrir que os padrões de crédito não são tão sólidos quanto pensavam”.
A preocupação também chegou ao Fundo Monetário Internacional (FMI). Durante reunião anual em Washington, diretora da agência relatou ter dificuldades para dormir devido aos riscos crescentes nos mercados de crédito privado, que podem indicar a formação de uma bolha financeira nos Estados Unidos.
O caso da First Brands Group é um exemplo dos perigos potenciais. A fabricante de peças automotivas entrou com pedido de proteção contra falência no fim de setembro, preocupando credores pela falta de transparência de seu balanço. Parte de seus passivos bilionários está com bancos tradicionais, mas outros bilhões de dólares estão em dívidas “fora do balanço”, originadas no pouco regulado setor de crédito privado em expansão.
A gigante de autopeças First Brands Group, fundada por Patrick James, empresário malaio radicado em Ohio, entrou em colapso após registrar o desaparecimento de cerca de US$ 2 bilhões de suas contas. A empresa, que empregava 26 mil pessoas e faturava US$ 5 bilhões por ano, não conseguiu refinanciar US$ 6 bilhões em dívidas, o que precipitou o pedido de proteção judicial (Chapter 11) e uma investigação do Departamento de Justiça.
James, que considera deixar o cargo de CEO, nega irregularidades. Segundo seu advogado, o colapso foi resultado de “fatores macroeconômicos”. Mas fontes próximas à investigação apontam um histórico de práticas financeiras controversas e processos por omissões e supostas fraudes, alguns encerrados com acordos confidenciais.
A trajetória de Patrick James começou em 1995, com a criação da Janna Industries, que mais tarde deu origem à First Brands, dona de marcas como Fram (filtros), Trico (palhetas) e Raybestos (freios). O modelo de expansão por aquisições impulsionou o grupo por anos, mas acabou o deixando afogado em dívidas.
O império ruiu em 2025, quando investidores descobriram que a gestora Apollo, uma das financiadoras da companhia, havia feito apostas contra a empresa por meio de derivativos de crédito. As tentativas de venda fracassaram e a First Brands acabou nos tribunais. Agora, autoridades tentam determinar o tamanho real do rombo, estimado em pelo menos US$ 2 bilhões em dívidas sem lastro.