Super Quarta: à esquerda, Gabriel Galípolo, presidente do Banco Central do Brasil. À direita, Jerome Powell, presidente do Federal Reserve (Fed, banco central americano) (Lula Marques/Agência Brasil e Al Drago/Getty Images/Reprodução)
Repórter de finanças
Publicado em 30 de julho de 2025 às 06h02.
A Super Quarta — dia em que Brasil e Estados Unidos anunciam simultaneamente suas decisões de política monetária — deve ser marcada pela estabilidade dos juros nos dois países. No caso do Brasil, tudo indica que o Comitê de Política Monetária (Copom) encerrará o ciclo de alta e manterá a Selic nos atuais 15%, como já projeta o Boletim Focus. O mercado espera decisão unânime.
Mas a estabilidade não significa alívio no curto prazo. Segundo Mário Mesquita, economista-chefe do Itaú BBA, cortes de juros não devem voltar para a mesa tão cedo. O Santander reforça essa leitura: não vê espaço para mudanças significativas no comunicado e mantém sua projeção de Selic em 15% em 2025 e 13% em 2026. A expectativa é que os cortes comecem apenas no primeiro trimestre do próximo ano.
"Considerando as incertezas inerentes a um ano eleitoral, achamos razoável antecipar uma postura mais conservadora por parte do Copom. Essa expectativa é ainda reforçada pelas lições aprendidas no ciclo de cortes anterior", diz Marco Antônio Caruso, economista-chefe do banco.
Nos EUA, a expectativa também é de manutenção. A taxa de juros americana deve permanecer entre 4,25% e 4,50%, marcando a quinta reunião consecutiva sem mudança. A plataforma FedWatch já aponta quase 100% de probabilidade de estabilidade, e a decisão também deve ser unânime, segundo William Castro, estrategista-chefe da Avenue.
O presidente do Fed, Jerome Powell, tem indicado que a economia americana segue resiliente, com crescimento moderado e desaceleração da inflação. A mensagem será mantida, mas o tom do comunicado será crucial para os mercados.
“Sinais mais hawkish — de que os juros podem ficar altos por mais tempo — podem afetar os ativos de risco”, afirma Paula Zogbi, estrategista-chefe da Nomad. Ainda assim, o mercado precifica cortes até o fim de 2025 e, possivelmente, já a partir de setembro deste ano.
“Cortes mais rápidos só aconteceriam se houvesse uma necessidade clara de estimular a atividade. Mas como a inflação segue longe da meta e o mercado de trabalho está saudável, não é esse o cenário hoje”, afirma Zogbi.
Além disso, investidores estarão atentos ao que o Fed dirá sobre as tarifas comerciais impostas pelos EUA, um novo fator de risco no radar global.
A leitura do Itaú BBA é de que a política monetária já está produzindo os efeitos esperados, mesmo com a inflação ainda acima da meta. Desde a última reunião do Copom, houve valorização do real, desaceleração na geração de empregos (Caged), queda na produção industrial e nas vendas do varejo, além de estabilidade nos serviços.
Tanto o IPCA de junho quanto o IPCA-15 de julho indicaram que a desinflação está em curso, mesmo partindo de um patamar elevado. Para André Muller, da AZ Quest, e para o próprio Itaú BBA, a inflação corrente mostrou sinais positivos, com recuo das expectativas implícitas e de 12 meses.
Mas os núcleos continuam pressionados, sobretudo em serviços. E as expectativas ainda estão acima da meta, o que justifica manter os juros em território contracionista, segundo Iana Ferrão, economista do BTG Pactual (do mesmo grupo de controle da EXAME).
Além disso, embora as tarifas americanas sejam uma fonte de preocupação, o Copom deve manter uma postura de observação até entender melhor seus impactos. “A comunicação deve reconhecer o choque tarifário como um vetor adicional de incerteza, com potenciais efeitos sobre preços, câmbio e confiança”, diz Ferrão.
Por outro lado, as próprias tarifas podem acelerar o esfriamento da economia, o que abriria espaço para cortes. Gustavo Sung, da Suno Research, lembra que diversos indicadores — como IBS, IBC-Br, vendas e serviços — mostram sinais de acomodação, em parte pela política monetária dura.
“O BC vê essa desaceleração com bons olhos, pois ela contribui para a desinflação. Esse processo deve ganhar intensidade no segundo semestre, com um hiato do produto negativo a partir do quarto trimestre”, afirma Sung.
Nos Estados Unidos, seria uma grande surpresa se o Fed decidisse mudar os juros nesta reunião. “Não houve mudança na comunicação. O Fed prima pela estabilidade e não desestabiliza o sistema com mudanças abruptas”, afirma Castro.
Assim como no Brasil, a inflação americana ainda está acima da meta. O último CPI veio em 2,7% nos 12 meses até junho, acima dos 2,4% de maio — e ainda distante da meta de 2%.
As tarifas comerciais também são vistas como um risco inflacionário adicional. “As tarifas podem alterar o cenário, mas o Fed vai esperar os dados de inflação antes de qualquer movimento”, diz Castro.
Bruno Corano, economista da Corano Capital, reforça que o foco do Fed continua sendo a inflação, apesar da resiliência do mercado de trabalho. “As tarifas devem ser citadas como fonte de incerteza futura”, afirma.
Tudo isso acontece em meio a uma nova rodada de críticas do presidente Donald Trump ao comando do banco central. Trump chegou a chamar Powell de “uma pessoa muito estúpida” por não cortar os juros e deixou no ar a possibilidade de demissão.
Ainda assim, o Fed deve evitar qualquer resposta direta às declarações de Trump. “Não deve haver posicionamento da instituição sobre isso. Não faz parte do mandato do Fed”, diz Corano.