Medicina: com faturamento de R$ 1,4 bilhão em 2017, o grupo São Francisco foi fundado há 70 anos em Ribeirão Preto, interior de São Paulo (Thinkstock/ktsimage/Thinkstock)
Publicado em 23 de setembro de 2025 às 06h00.
Última atualização em 23 de setembro de 2025 às 07h34.
Conseguir que o plano de saúde cubra um tratamento ou exame fora da lista de procedimentos obrigatórios da Agência Nacional de Saúde (ANS) vai ficar mais difícil. O Supremo Tribunal Federal (STF) determinou uma lista de cinco critérios que precisam ser seguidos para conseguir uma exceção — e eles são rigorosos. Os analistas do mercado financeiro tiveram uma impressão positiva da decisão, e preveem efeitos positivos para as operadoras dos convênios.
No meio jurídico, porém, há dúvidas se as regras vão de fato conseguir reduzir o volume de processos abertos na Justiça para se conseguir um atendimento fora do rol. E o que poderia ser algo bom para o bolso dos beneficiários, pode não fazer diferença alguma e até deixar o serviço mais oneroso, de acordo com especialistas que a EXAME consultou.
"As decisões judiciais que determinavam obrigações além do previsto no rol da ANS e nos contratos de plano de saúde vinham aumentando o custo final para os consumidores", afima Juliana Teixeira Barreto, especialista em direito médico e coordenadora do núcleo de saúde do escritório Fabio Kadi Advogados.
A precificação dos planos de saúde, explica a advogada, é "complexa e sujeita a múltiplos fatores regulatórios e atuarias". O reajuste de preço, em tese, garante o equilíbrio financeiro das operadoras frente aos seus gastos. Embute os gastos com a cobertura da assistência médica de seus beneficiários, mas também as despesas decorrentes dos processos judiciais na cobertura do que não consta na lista da ANS.
"Embora a negativa de cobertura fosse a regra pelas operadoras, o Judiciário possuía maior margem de interpretação para acolher pleitos dos beneficiários, admitindo exceções ao rol da ANS com base em critérios de razoabilidade [coerência] e necessidade médica", diz Juliana. "A falta de previsibilidade das operadoras com cobertura proveniente de imposições judiciais, com uma obrigação além da contratual, vinha aumentando o valor da contratação de um plano de saúde."
As alterações nas regras dos planos de saúde, complementa, vieram para dar mais previsibilidade ao setor e mitigar a judicialização.
"Com a decisão proferida no julgamento do STF, o processo tornou-se mais restritivo e burocrático, uma vez que passou a exigir do beneficiário a apresentação de provas técnicas mais robustas, reduzindo-se sensivelmente a discricionariedade judicial [liberdade de decisão do juíz]".
Contudo, isso não quer dizer que os percentuais de reajuste das mensalidades dos planos de saúde tendem a ser menores. E há certo ceticismo. "Na minha visão, a decisão do STF não irá influenciar nisso. Não irá aumentar e tampouco diminuir o valor", afirma Juliana.
Leo Rosenbaum, advogado especializado em direito da Saúde e sócio do Rosenbaum Advogados, acredita que, para as operadoras, as mudanças podem acabar sendo "um tiro no próprio pé".
"Os requisitos previstos pelo STF, como comprovação científica, ausência de tratamento alternativo no rol e prescrição médica detalhada, são todos subjetivos. [...] Isso pode gerar uma insegurança jurídica maior e um número ainda maior ainda de demandas judiciais, impactando negativamente o custo dos planos".
Na prática, pacientes que já estão em tratamento autorizado por decisão judicial transitada em julgado não devem ser afetados. Já solicitações em andamento ou futuras, dependem do cumprimento cumulativo das cinco condições definidas pelo STF.
Juliana, do Fabio Kadi Advogados, lembra que a possibilidade de recorrer à Justiça permanece, especialmente em casos de tratamentos inovadores ou de alto custo, desde que os requisitos cumulativos sejam comprovados. O que muda é que a Justiça exigirá cada vez mais a comprovação da fundamentação técnica do pedido.
Para Rosenbaum, ainda que critérios mais rigorosos possam ter efeitos indesejados e aumentar a judicialização, ao mesmo tempo tendem a reduzir êxito em casos infundados, "pois há muita fraude em curso também".
"Vamos ver como os planos de saúde vão receber as solicitações de tratamento a partir de agora e qual vai ser o direcionamento da jurisprudência dos tribunais", conclui.