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Por que a gestão da ansiedade é o novo diferencial competitivo das organizações

Empresas que priorizam o bem-estar cognitivo constroem ambientes mais resilientes e inovadores

Ansiedade: sintomas silenciosos já afetam mais da metade dos trabalhadores brasileiros. (Jose Luis Pelaez Inc/Getty Images)

Ansiedade: sintomas silenciosos já afetam mais da metade dos trabalhadores brasileiros. (Jose Luis Pelaez Inc/Getty Images)

Publicado em 15 de maio de 2025 às 14h00.

Já sentiu aquela aceleração no peito quando uma mensagem do chefe chega fora do horário comercial? Ou a tensão antes de apresentações importantes, mesmo sendo um profissional experiente? E aquele aperto dominical que já anuncia a semana por vir? Esses sintomas não são exceção, mas cada vez mais comuns no panorama profissional atual: são manifestações cotidianas da economia da ansiedade, um fenômeno sistêmico que silenciosamente sufoca o potencial inovador de indivíduos e empresas globalmente.

Nossos ancestrais vivenciavam o medo de forma radicalmente diferente. Durante a maior parte da história humana, o medo era uma resposta adaptativa a ameaças imediatas e concretas – predadores, inimigos, desastres naturais. O sistema de "luta ou fuga" evoluiu para nos proteger de perigos reais e imediatos, não de e-mails com tom passivo-agressivo ou de relatórios de desempenho semanais. O antropólogo Joseph Campbell descreveu como, nas sociedades tradicionais, os rituais e mitos serviam como "contêineres" para os medos humanos, oferecendo estruturas de sentido que auxiliavam a processar e transcender o medo.

O filósofo Bertrand Russell, em seu livro A Conquista da Felicidade, já observava como a organização moderna do trabalho estava gerando uma forma crônica de cansaço e apreensão desconhecida em épocas anteriores. Com a chegada do século XXI e a revolução digital, vivemos uma transformação ainda mais intensa: a ansiedade tornou-se um estado constante, amplificada pela conectividade permanente, pelo fluxo incessante de informações e pela competição generalizada. O que antes era uma reação ocasional a perigos concretos virou um zumbido de fundo persistente, uma companhia indesejada em nosso cotidiano profissional.

Pesquisas recentes confirmam a dimensão dessa mudança. De acordo com um relatório de 2023 do People at Work, do ADP Research Institute, a ansiedade (51%) foi o transtorno que mais afastou pessoas do trabalho no Brasil, seguido por depressão (17%) e estresse (16%). De acordo com a Organização Mundial da Saúde, o custo global da ansiedade e depressão no ambiente de trabalho ultrapassa US$ 1 trilhão anualmente em produtividade perdida. No Brasil, estima-se que chegue a quase 4% do PIB, segundo a ISMA (International Stress Management Association).

Criar um ambiente menos estressante para os funcionários compensa, e não apenas por generosidade. Há inúmeras pesquisas que mostram os ganhos diretos dessa abordagem, como o  estudo publicado pela Harvard Business Review, que aponta um ROI de 6:1 para cada dólar investido em programas de bem-estar dos funcionários.

Fica evidente que, para navegar por este mundo cada vez mais tenso e preservar nosso potencial criativo, precisamos desenvolver métodos que reconheçam a realidade neurobiológica da ansiedade enquanto cultivamos culturas organizacionais mais saudáveis.

Veja cinco estratégias práticas baseadas tanto em pesquisas recentes quanto em sabedoria atemporal:

Adote a atenção plena estratégica

Reserve blocos de tempo específicos (15-30 minutos) para checar e-mails e mensagens, em vez de responder continuamente ao longo do dia. Implemente com sua equipe a "regra 5-2-1": cinco horas de trabalho focado, duas horas de colaboração e uma hora de reflexão e planejamento por dia.

Desenvolva "zonas de segurança psicológica"

Amy Edmondson, professora da Harvard Business School, demonstrou como a segurança psicológica é o preditor mais forte de desempenho em equipes de alto nível. Crie rituais em que falhas e experimentos malsucedidos são discutidos abertamente como oportunidades de aprendizado. Empresas como Google e Pixar incorporaram essa prática com resultados extraordinários, permitindo que seus talentos explorem ideias arriscadas sem medo.

Estabeleça limites na disponibilidade digital

Defina políticas claras sobre comunicação após o expediente. A Daimler implementou um sistema que exclui automaticamente e-mails enviados para funcionários em férias. Como líder, inspire esse comportamento: envie e-mails usando recursos de programação para que cheguem apenas no horário comercial, mesmo que você trabalhe à noite.

Implemente a "ansiedade produtiva"

Nem toda ansiedade é prejudicial. O neurocientista Andrew Huberman distingue entre "ansiedade debilitante" e "estresse produtivo". Transforme a energia ansiosa em preparação meticulosa e antecipação criativa. Antes de reuniões importantes, faça um exercício de "pré-mortem": imagine o projeto fracassando e identifique preventivamente os pontos fracos. Esta técnica redireciona a energia da ansiedade para soluções pragmáticas.

Crie ritmos de recuperação

Acapacidade de alternar entre estados de alta performance e recuperação completa é o que diferencia atletas de elite dos demais. O mesmo vale para o trabalho mental. Implemente microrituais de recuperação durante o dia (90 minutos de concentração seguidos por 15 minutos de desconexão) e macrorituais semanais (dias sem reuniões) e anuais (períodos de sabático curto para renovação criativa)

A economia da ansiedade não é um destino inevitável, mas uma construção social que podemos e devemos transformar. Na nova economia emergente, a vantagem competitiva pertencerá não às organizações que sugam o máximo de seus talentos à custa de seu bem-estar, mas àquelas que cultivam ecossistemas onde mentes brilhantes podem florescer sem o peso constante do medo. Em um mundo que cada vez mais valoriza o autenticamente humano, libertar nossos talentos da prisão da ansiedade pode ser o investimento mais estratégico ao nosso alcance.

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