Líderes Extraordinários

Todos sabiam, ninguém teve coragem: quem deveria ter feito?

Um conto popular, quatro personagens e uma lição sobre liderança, comunicação e responsabilidade nas organizações

Responsabilidade difusa: projeto fracassa quando ninguém assume a execução.

Responsabilidade difusa: projeto fracassa quando ninguém assume a execução.

Publicado em 12 de novembro de 2025 às 13h22.

A sala de reunião estava cheia. Quatro funcionários discutiam calorosamente. O ar era denso, os olhares se cruzavam com desconforto. Um trabalho importante precisava ser feito — todos sabiam disso. Todo mundo tinha um motivo. Alguém até prometeu. Qualquer um poderia ter resolvido. Mas ninguém teve coragem de executar. O silêncio que se seguiu pareceu ensurdecedor. O projeto fracassou. E, como em um bom suspense corporativo, começou o jogo de empurra: quem deveria ter feito?

Este conto corporativo moderno, embora simples, revela um dos dilemas mais profundos das organizações: quando a responsabilidade é difusa, a execução se torna um mistério. Muitas vezes, o culpado não é quem erra — é quem não age.

Os personagens deste conto corporativo:

  • Todo mundo: representa a crença na responsabilidade coletiva, mas sem ação concreta.
  • Alguém: sugere que há um responsável, mas não se sabe quem.
  • Qualquer um: indica que a tarefa é simples, mas sem dono.
  • Ninguém: é o resultado da ausência de liderança e clareza.

Esses personagens são arquétipos que habitam empresas de todos os setores. Eles revelam falhas de comunicação, cultura organizacional fragilizada  e liderança omissa.

A raiz invisível da inação: comunicação falha

A comunicação é o sistema nervoso de qualquer organização. Quando ela falha, mesmo equipes competentes e motivadas se tornam ineficazes. No conto dos quatro personagens, ninguém sabia exatamente quem deveria agir. A tarefa era importante, mas a mensagem não foi clara. E quando a comunicação é ambígua, a ação se dissolve.

“O maior problema na comunicação é a ilusão de que ela aconteceu.”

— George Bernard Shaw

Nas empresas, isso se manifesta de várias formas:

  • Instruções vagas: “Alguém precisa cuidar disso” não é uma delegação — é uma abdicação.
  • Falta de alinhamento: reuniões sem definição de responsáveis, prazos ou próximos passos geram confusão.
  • Ruído entre áreas: quando departamentos não compartilham informações de forma estruturada, surgem retrabalhos e conflitos.
  • Excesso de canais: e-mails, chats, reuniões, documentos — quando tudo é canal, nada é canal. A mensagem se perde.

A comunicação falha não é apenas um problema técnico — é um sintoma de liderança ausente ou mal estruturada. Líderes eficazes não apenas falam, mas garantem que foram compreendidos. Eles criam ambientes de clareza, onde cada pessoa sabe o que precisa fazer, por que precisa fazer e com quem pode contar.

“Clareza é gentileza.”

— Brené Brown, pesquisadora em liderança e vulnerabilidade

O equívoco do “senso de dono”

Nos últimos anos, tornou-se comum ouvir líderes exigindo que colaboradores tenham “senso de dono”. A intenção por trás da expressão é legítima: estimular responsabilidade, iniciativa e comprometimento. No entanto, seu uso indiscriminado revela um descompasso entre expectativa e realidade. Funcionários, em sua grande maioria, não são donos nem acionistas — não assumem os riscos financeiros, legais ou estratégicos da empresa. Tampouco recebem os benefícios proporcionais, como participação societária ou dividendos. Cobrar comportamentos típicos de acionistas sem oferecer autonomia real, transparência nas decisões ou mecanismos de recompensa equivalentes pode gerar frustração, cinismo e desengajamento. O que se espera, na verdade, é protagonismo profissional, ou seja, que cada pessoa compreenda seu papel, tome iniciativa dentro de seu escopo e contribua com responsabilidade. Confundir isso com “senso de dono” é não reconhecer as fronteiras legítimas entre liderança, cultura e contrato de trabalho.

Lições práticas para líderes

  1. Defina claramente quem é responsável

Use metodologias ou frameworks como a matriz RACI para evitar confusões. Responsável não é quem está por perto — é quem foi designado.

  1. Crie uma cultura de protagonismo profissional

Incentive que os colaboradores assumam responsabilidades, mesmo quando não são formalmente atribuídas. O protagonismo transforma equipes em motores de execução.

  1. Evite o ciclo da culpa

Em vez de buscar culpados, busque soluções. A liderança eficaz transforma erros em aprendizado coletivo.

  1. Comunique com precisão e intenção

A comunicação ambígua é o berço da inação. Líderes devem ser claros, objetivos e consistentes. Perguntar “o que você entendeu?” pode evitar semanas de retrabalho.

  1. Reconheça quem faz

Valorizar quem age é essencial para quebrar o ciclo da omissão. A cultura do reconhecimento fortalece o comprometimento com o resultado.

Qual dos personagens é você?

O conto dos quatro personagens revela, com simplicidade e precisão, os efeitos da responsabilidade difusa, da comunicação falha e da cultura organizacional mal estruturada. Vimos como a ausência de clareza sobre quem faz o quê pode paralisar equipes inteiras, gerar frustração e alimentar o ciclo da culpa.

Diante disso, fica a pergunta:

  • Você é aquele que promete?
  • É aquele que espera o outro fazer?
  • É aquele que culpa alguém por não fazer?
  • Ou é aquele que vai lá e faz?

Mais do que uma reflexão individual, essa pergunta é um convite à ação. Porque em qualquer organização, o sucesso não depende de todo mundo — depende de alguém que escolhe fazer.

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