Sem alarde, estabelecimentos de todo o país reduzem cardápios, ajustam porções e adotam estratégias alternativas para manter a operação viva frente à alta dos custos e à resistência do consumidor (Freepik)
Colunista
Publicado em 6 de abril de 2025 às 19h00.
A conta não fecha. O food cost segue subindo, os custos operacionais pressionam como nunca e o consumidor, do outro lado do balcão, resiste a aceitar novos reajustes no cardápio. A pandemia ensinou muita coisa, mas a principal lição talvez seja esta: o operador brasileiro aprendeu a apanhar — e a seguir em frente.
De forma quase invisível, estabelecimentos de todos os portes estão transformando suas rotinas. Cortam turnos, ajustam receitas, reduzem porções, improvisam com insumos alternativos, trocam marcas famosas por opções menos conhecidas, mas mais viáveis. Alguns investem em automação, outros reconfiguram o serviço com menos equipe. Tudo isso sem alarde. É uma dança diária de adaptação, feita com conhecimento empírico e muita sensibilidade de rua.
Essas mudanças, aparentemente pequenas, repetem-se em milhares de restaurantes, padarias e lanchonetes todos os dias. E, como bem nos lembra a dialética, o acúmulo quantitativo de pequenas transformações gera, cedo ou tarde, uma ruptura qualitativa. Estamos, talvez, diante dela.
Silenciosamente, o mercado está sendo puxado por uma base que ninguém quis olhar. Cardápios menores, flexíveis, que mudam conforme a feira da semana e produtos em promoção. Um novo protagonismo das sobremesas e sucos como salvadores da margem. Cozinhas mais enxutas, com menos fogões acesos e mais produtos semiprontos. O que era visto como gambiarra virou estratégia. E o que antes parecia improviso, hoje sustenta o negócio. É uma revolução de baixo para cima — silenciosa, sim, mas nada tímida em seus efeitos. Quem ignorar isso corre o risco de planejar o futuro com dados do passado e ser atropelado pelo presente.
O problema é que essa mudança não aparece nas apresentações das reuniões, distantes do malabarismo semanal dos operadores. Ela não brilha nos relatórios pasteurizados, muitas vezes apenas com dados das grandes redes de fast-food. Nem se revela nos slides de tendências que comparam um Brasil ideal com o Foodservice desenvolvido e profissionalizado norte-americano. Essa revolução do cotidiano segue fora do radar de boa parte da indústria — e isso tem cobrado um preço alto.
Muita pompa, muita pirotecnia e muitos coffee-breaks no ar-condicionado nas reuniões corporativas distanciam os executivos da realidade quente das cozinhas e das noites sem dormir dos operadores pressionados por food cost e custos operacionais. Operadores no sufoco não combinam com executivos perfumados tomando cafés especiais. Enquanto se discutem conceitos importados e tendências gourmetizadas, tem gente real reinventando a operação todo santo dia com uma calculadora na mão, um bloquinho de anotações e uma dose de desespero criativo.
Muitos executivos já foram surpreendidos com viradas inesperadas: quedas abruptas, crescimentos inusitados, movimentos de mercado que escaparam dos modelos preditivos que repetem rodadas da mesma coisa. Em alguns casos, a conta foi paga com o próprio crachá. Afinal, quem lê o mercado a partir de números gelados dificilmente entende o calor da chapa.
É nesse contexto que nasce a Foodservice Big Findings, uma pesquisa realizada com operadores de todo o Brasil, criada para captar o que não está nos mesmos gráficos de sempre. Para ouvir quem compra, quem equilibra a operação. Para iluminar os pontos cegos — aqueles que escapam às pesquisas pré-fabricadas, escravas de séries históricas.
Não é uma pesquisa para todos. Ela foi feita para os inquietos. Para os que saem da redoma e se permitem escutar o barulho do exaustor das cozinhas, sentir o cansaço das madrugadas, entender a complexidade do improviso como ferramenta de gestão. Ela é para os executivos insurgentes — e, talvez, apenas eles sobreviverão à próxima virada de ano fiscal.